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“Com você eu tenho mesmo de me conformar
eu tenho mesmo de não me conformar
sexo heterodoxo, lapsos de desejo
quando eu vejo o céu desaba sobre nós”

Caetano Veloso, em Deusa Urbana

Há uma diferença enorme entre um grande artista e um grande show. Grandes artistas nem sempre fazem bons shows, enquanto artistas medíocres, com a ajuda da tecnologia, pirotecnia, e de recursos diversos fazem boas apresentações.

Caetano Veloso, 61 anos, precisa apenas de um power trio formado por garotos, e de sua voz, cada vez mais precisa, linda e afinada, para fazer uma apresentação memorável. Na estréia da turnê de seu último álbum, o indie Cê, em São Paulo, ele mostra que é mais do que um ícone de MPB mas sim um camaleão pop que tem a capacidade de se transformar, se adequar a cada tempo, e manter o alto padrão que um artista de seu gabarito exige.

Mesmo diante de uma platéia formada em boa parte por facistas travestidos de neo-liberais pouco familiarizados com o repertório de Cê e ao excesso de decibéis emitidos pela guitarra de Pedro Sá, ele não perdeu o pose em nenhum momento, mesmo tendo que dividir o interesse da platéia com copos de whisky nas mesas.

O show começou com Outro, que também abre “Cê” no CD. A fidelidade da banda à gravação original é exemplar, e Pedro Sá surge como um grande guitarrista ao levar com brilho e competência as canções de rock e também sambas clássicos como Desde que o samba é samba é assim e Sampa. Outro ponto alto do show são as músicas em inglês de Caetano, Nine out of ten, e You don’t know me, que parecem ter sido feitas sob medida para esta banda e turnê.

Nada disso seria tão especial se não tivessemos a voz de Caetano que faz com que as canções fiquem cheias de vida, carregadas de sentimento, raiva (uma marca do introspectivo Cê) no palco. Faltou algo? Não sei, mas poucas vezes tive tanta certeza que estava diante de um grande artista em uma ótima apresentação.