kleiton_kledirPor Fabian Chacur

Desde 1986 Kleiton & Kledir não gravavam um disco só com músicas inéditas. A escrita acaba de ser quebrada, com Autorretrato. Muita coisa aconteceu nesses 23 anos. Primeiro, uma separação de dez anos. Depois, três discos. Dois (1997) trazia cinco (boas) inéditas e sete releituras discutíveis de sucessos. Clássicos do Sul (1999) reuniu 14 releituras de belos standards da música gaúcha de todos os tempos. Ao Vivo (2006, também saiu em DVD), foi gravado ao vivo em Porto Alegre, trouxe 12 hits da dupla, 2 dos tempos do seminal grupo que os lançou nos anos 70 (Almôndegas) e duas inéditas.

E aí, valeu esperar tanto? Sim! Felizmente! Autorretrato não apresenta grande ruptura em relação ao estilo de Kleiton & Kledir e sua original fusão de folk, rock, pop, MPB e música regional gaúcha (esta última, cada vez mais como uma espécie de tempero). É a reafirmação de tudo o que já fizeram, mas sem cair na autoindulgência, no “como é lindo o meu umbigo”. Soa como um trabalho feito de forma prazerosa, com tesão ilimitado. Tem delicadeza, romantismo, otimismo, saudade, profissão de fé na vida, e também uma pitada de insatisfação. A produção do britânico Paul Ralphes (tocou no grupo Bliss, e produziu Kid Abelha e Engenheiros do Hawaii, entre outros), é extremamente cuidadosa, reforçando os timbres de cada instrumento e valorizando os pontos altos dos irmãos Ramil no aspecto sonoro, que são suas belas vocalizações, solos vocais também impecáveis e o violino de Kleiton. Das canções, curiosamente as mais diferentes do estilo habitual deles foram escolhidas para abrir e fechar o CD. A Dança do Sol e da Lua é bem dançante e com jeitão de mantra indiano como bem definiu Kleiton, e começa a festa com alto astral. Por sua vez, a balada rock agressiva Tudo Eu equivale ao desabafo de Kledir referente a uma hipotética relação amorosa na qual ele só carrega o piano, embora também queira tocá-lo. A balada folk Estrela Cadente lembra positivamente Almôndegas, enquanto a faixa que dá nome ao disco é uma deliciosa profissão de fé na amizade que lembra a estrutura de Maria Fumaça, embora bem diferente em termos musicais.  Eva lembra as experiências latino-africanas de Paul Simon, com ritmo quebrado e irresistível e letra exaltando essas mulheres maravilhosas, como diria o finado apresentador Jota Silvestre. Disco lindo, para se ouvir muitas e muitas vezes, como, aliás, tenho feito.

Videoclipe de Autorretrato:

http://www.youtube.com/watch?v=osL7qe0vBPc