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Por Fabian Chacur

Em junho de 1982, Joe Jackson lançou o seu álbum mais ambicioso. Aos 27 anos de idade (completaria 28 em agosto daquele mesmo ano), o cantor, compositor e músico britânico havia surgido com força no cenário musical com uma sonoridade rotulada como new wave pela crítica, e conseguiu ótimos resultados comerciais. Mas Night And Day era um passo adiante dos mais arriscados, pois trazia uma sonoridade bem peculiar.

Ao invés do ótimo rock básico com elementos de reggae e pop presentes em hits como Is She Really Going Out With Him, I’m a Man e Fools In Love, Jackson parecia querer trazer para o seu universo próprio algo do surpreendente disco que lançou em 1981, Jumpin’ Jive, composto por releituras de clássicos da era do swing jazz dos anos 1930 e 1940.

Vale lembrar que ele era quase uma exceção em sua geração, pois tem o piano como o seu instrumento base, ao invés da guitarra. E, embora roqueiro de coração, Jackson traz uma formação composta também por música erudita e jazz, elementos que se incorporaram à sua formação quando estudou música formalmente. Portanto, era questão mesmo de tempo que isso aflorasse no seu trabalho.

Night And Day marcou a saída do artista da Inglaterra rumo aos EUA, mais precisamente a Nova York. Nos estúdios da Big Apple, ele teve a inspiração de usar como tema do novo álbum uma espécie de viagem de um dia por aquela cidade, iniciada à noite e encerrada de dia, como o título entrega. De cara, uma ousadia para aqueles dias: nada de guitarra. A formação básica do disco inclui teclados diversos, baixo, bateria e muita percussão.

Ele usou o seu piano como base para um som no qual a latinidade aflorou com força total, trazendo fortes elementos de salsa, mambo e até um bocadinho de bossa nova. O jazz dá o tom, com espaços para solos mas sem cair em uma proposta intrincada demais, sendo, portanto, bem acessível aos ouvidos médios. O tempero pop e elementos eletrônicos, além de pitadas de rock, arredondaram a coisa toda.

Completando tudo, Jackson nos oferece nove faixas, sendo cinco compondo o lado A do disco de vinil, a faceta “night”, e quatro no lado B, a parte “day”. As canções vão se entrelaçando, e funcionam como se fossem a trilha sonora que acompanha um novato na grande cidade, tentando descobrir suas nuances e superar suas dificuldades de contatos e assimilação com as pessoas.

A abertura com Another World é impactante, seguida pela percussiva e misteriosa Chinatown. T.V. Age, ironizando a forte influência da TV na vida das pessoas, é seguida pela salerosíssima Target, que abre alas para a incrível Steppin’ Out. Maior hit da carreira do artista (chegou ao 6º lugar nos EUA), tem uma batida rítmica mágica, que serve como uma transição da noite para o dia, representado pelas canções do lado B.

A parte day do álbum se inicia com a bela balada Breaking Us In Two, que traz em sua melodia, involuntariamente ou não, trechinhos de Steppin’ Out e da clássica Day After Day, hit do grupo britânico Badfinger. Cancer, com sua letra que lida de forma quase sarcástica com a gravidade dessa doença terrível, é outro orgasmo latino, no qual Jackson faz solos endiabrados de piano nos quais mostra um senso rítmico e melódico digno de um gênio dos teclados.

A introspectiva Real Man toca no sempre delicado tema da masculinidade, com um refrão onomatopaico cativante. O álbum é encerrado com uma balada arrebatadora, Slow Song, que desde então costuma encerrar seus shows, e na qual ele defende a necessidade das canções lentas em momentos decisivos da vida. Um encerramento classudo para um grande álbum.

Joe Jackson admite que temia pelo resultado comercial de Night And Day, pelo fato de ser muito diferente dos LPs que havia lançado anteriormente. O público, no entanto, não o decepcionou, pois o álbum atingiu o 3º lugar no Reino Unido e 4º nos EUA, sendo até hoje seu campeão de vendas. Um disco que soa moderno, delicioso e cativante, mesmo 35 anos após seu lançamento. Música boa é para sempre.

obs.: fiz o possível para escrever um bom texto sobre esse, que é um de meus discos favoritos, mas tenho consciência de que não cheguei nem aos pés da crítica que a minha ídala Ana Maria Bahiana escreveu na época, e que não só me levou a procurar esse álbum como, por tabela, acabou me tornando um fã entusiasmado de Joe Jackson. Valeu, Ana!

Night And Day– Joe Jackson: