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Tag: cantoras de soul music

Tina Turner, 83 anos, uma diva poderosa rumo à eternidade

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Por Fabian Chacur

Existe um olimpo destinado às grandes divas da música, e poucas são as suas integrantes. Tina Turner certamente é uma delas. E, infelizmente, ela nos deixou em termos presenciais nesta quarta-feira (24) aos 83 anos, vítima de uma longa doença não detalhada por seus entes queridos. E nem importa mesmo saber. O duro é perder mais alguém desse porte, tão pouco tempo depois de Rita Lee. Ao completar 80 anos, fiz o texto abaixo em sua homenagem. Fica como meu tributo neste momento para alguém que quebrou cada barreira mesmo!

É infalível. Toda vez que ouço a bela introdução da música What’s Love Got To Do With It as lágrimas começam a brotar dos meus olhos. Tem a ver com a emotividade que herdei da minha saudosa mãe, mas também pode ser explicado pelo significado dessa incrível canção escrita por Terry Britten e Graham Lyle. Ela marca o momento em que Tina Turner, em 1984, atingiu o primeiro lugar na parada americana de singles e sacramentou uma das mais espetaculares voltas por cima da história da música.

Aos 45 anos de idade na época, essa verdadeira guerreira superava quase dez anos de uma luta intensa para recuperar sua relevância no cenário da música, após sair literalmente sem nada de um turbulento casamento musical e pessoal com o talentoso, mas detestável e truculento Ike Turner, com quem conviveu por quase duas décadas. O que essa mulher sofreu nas mãos desse sujeitinho ultrapassa os limites do humanamente suportável.

Mas Anna Mae Bullock, que nasceu em 26 de novembro de 1939, não só suportou como teve a coragem de dar um basta naquela situação. Além do lado pessoal, também tinha a ditadura musical, que o marido barra pesada lhe impunha. Tudo bem, ele foi muito importante para que aquela jovem e ingênua garota de Nutbush, Tennessee, conseguisse aparecer com sucesso no cenário da música, no finalzinho dos anos 1950.

Com shows eletrizantes e gravações valorizadas por sua voz potente, Ike & Tina Turner se tornaram uma das atrações mais empolgantes do circuito da soul music nos anos 1960. No entanto, a partir da segunda metade dos anos 1960, o formato de seus shows e gravações foi ficando mais padronizado, e só mesmo a incrível energia da cantora conseguia atrair o público.

Percebendo esse potencial imenso e mal utilizado, o genial produtor Phil Spector propôs trabalhar com Tina em um trabalho-solo, que Ike autorizou sem muita convicção. O resultado foi a incrível River Deep Mountain High (1966), uma das grandes gravações protagonizadas por ela. A repercussão abaixo do esperado no mercado americano deu uma arrefecida nessa promissora carreira-solo.

Até 1976, Ike & Tina Turner tiveram bons momentos em termos de shows e discos, mas não é de se estranhar que o maior sucesso desse período tenha sido uma impressionante releitura de Proud Mary, do Creedence Clearwater Revival. Tina queria ter a liberdade de cantar o que quisesse. E essa liberdade veio quando a violência de Ike tomou proporções tamanhas que só restou à artista sair fora, com a roupa do corpo e não muito mais.

Demorou um pouco para conseguir um rumo, mas contou com a ajuda de amigos famosos como os Rolling Stones e Rod Stewart, para quem abriu shows. A entrada em sua vida do empresário Roger Davies, no início de 1980, marcou o momento em que as coisas começaram a se encaminhar de forma positiva. E, em 1984, enfim aquele projeto de megadiva do rock se concretizou. E veio com tudo, para tirar o atraso com juros e correção monetária sonora.

A partir de então, todos sabem o que aconteceu. Novos hits, como Private Dancer, Typical Male, Paradise Is Here e dezenas de outros, milhões de discos vendidos, shows em estádios pelos quatro cantos do mundo (Brasil inclusive, com direito a Pacaembu e Maracanã lotados, em 1988) e as pernas mais elogiadas da cena pop como uma espécie de bônus em meio a tanto talento artístico e musical.

Tina Turner virou um dos exemplos mais fortes do poder da mulher, e de como a violência doméstica em relações afetivas é um câncer que precisa ser combatido de forma veemente. Ela sofreu, mas sobreviveu, e colheu os mais belos frutos. Nada mais merecido. Viva essa maravilhosa Acid Queen! E que venham novas lágrimas ao ouvir What’s Love Got To Do With It. São lágrimas de felicidade e admiração!

Paradise is Here (live)– Tina Turner:

Betty Wright, 66 anos, uma diva sensual e genial da black music

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Por Fabian Chacur

Se eu tiver de listar minhas 10 gravações favoritas de todos os tempos, acho difícil não incluir a versão ao vivo de Tonight’s The Night feita em 1978 por Betty Wright. Por isso, é muito dolorido ter mais uma vez de fazer um obituário sobre uma artista da qual eu gosto muito. A espetacular cantora, compositora e arranjadora vocal americana teve a sua morte anunciada neste domingo (10), de causa ainda não revelada. Com apenas 66 anos de idade, deixa uma obra repleta de clássicos.

Nascida em Miami, Flórida, em 21 de dezembro de 1953, Betty mergulhou no mundo da música ainda criança. Como boa parte dos artistas negros americanos, esse início foi na música gospel, cantando hinos religiosos e canções com essa temática. Em 1966, no entanto, resolveu entrar no cenário da música secular, como os evangélicos chamam a canção não religiosa. Em 1968, lançou seu primeiro álbum, My First Time Around, em um selo que seria a semente da futura T.K. Records, a gravadora mais influente de Miami.

O primeiro hit gravado por Miss Wright não foi qualquer um. Trata-se de Clean Up Woman (ouça aqui), explosiva canção dançante com cunho feminista de Clarence Reid e Willie Clarke que invadiu as paradas de sucesso, atingindo o topo da de r&b e ao 6º posto no chart pop dos EUA.

Era o início de um repertório dos melhores. Com a certeira Where Is The Love (ouça aqui), Betty ganharia um Grammy na categoria melhor canção r&b de 1975 e firmaria seu estilo, com uma voz potente e assertiva que, no entanto, também trazia muita melodia e sensualidade. A música foi escrita por ela em parceria com Willie Clarke e a dupla Harry Wayne Casey e Richard Finch, líderes do célebre grupo KC & The Sunshine Band.

Na mesma época, ela lançou a versão de estúdio de Tonight’s The Night, parceria dela com Willie Clarke. Mas a gravação definitiva desta canção surgiu em seu espetacular álbum Betty Wright Live (1978), na qual o groove da canção é realçado e ela inclui uma introdução na qual explica como se inspirou na sua primeira relação sexual para escrever a letra, e na reação da mãe quando a ouviu. São mais de oito minutos de puro êxtase auditivo. Enchia as pistas da Chic Show e outros bailes blacks aqui em Sampa City!

Sempre generosa, foi ela quem indiciou George McCrae (do hit Rock Your Baby) e sua esposa Gwen para a gravadora de Henry Stone. Ela repetiria a gentileza em 1977 ao ser a madrinha do cantor, compositor e músico Peter Brown na TK Records, além de participar com destaque do hit da disco music Dance With Me.

Naquele mesmo 1978, gravou um dueto com ninguém menos do que Alice Cooper. A faixa é excelente, No Tricks (ouça aqui), e curiosamente foi lançada originalmente apenas como lado B do single How You Gonna See Me Now, só chegando ao formato CD na caixa The Life And Crimes Of Alice Cooper (1999).A música é uma parceria de Cooper com Bernie Taupin (o maior parceiro de Elton John) e do guitarrista Dick Wagner.

Em 1979, outro momento bem bacana: ela fez os shows de abertura da turnê na qual o grande nome da história do reggae, Bob Marley, divulgou o seu então mais recente álbum, Survival. Belo item no currículo!

Com a falência da T.K. Records, Betty Wright resolveu montar o seu próprio selo, Miss B Records, que teve início em 1985. E em 1987 ela lançou um álbum marcante, Mother Wit, que trouxe como destaque um de seus maiores e melhores hits, a deliciosa No Pain (No Gain) (composição só dela, ouça aqui).

Esse álbum rendeu a ela um disco de ouro, e afirma-se que se trata da primeira artista negra a criar seu próprio selo e conseguir essa façanha, motivada pela vendagem de mais de 500 mil cópias naquela época. Em 1988, a cantora veio a São Paulo para um show patrocinado por uma equipe de bailes, com ótima repercussão e direito a entrevista na TV Globo.

Os anos 1990 trouxeram alguns momentos bacanas. Em 1991, por exemplo, Gloria Estefan a convidou para fazer o arranjo vocal da maravilhosa balada Coming Out Of The Dark, que chegou ao número 1 na parada americana e integra o álbum de muito sucesso comercial Into The Light.

Em 1992, o jovem grupo vocal Color Me Badd estourou mundialmente com a sensual I Wanna Sex You Up, da trilha do filme New Jack City e também integrante de seu primeiro álbum, C.M.B. . O problema é que eles fizeram a música totalmente em cima de Tonight’s The Night, de Betty Wright, e não a creditaram. A questão foi resolvida na Justiça, com a cantora ganhando, no fim das contas, uma boa bolada de direitos autorais.

Betty também atuou como vocalista de apoio (backing vocals) para uma incontável lista de artistas. Além dos já citados por aqui, vale elencar mais alguns: Bill Wyman (ex-Rolling Stones), Timmy Thomas, Johnny Nash, Jimmy Cliff, David Byrne, Jon Secada, Erikah Badu, Billie Myers, Gerald Alston, Phylis Hyman e Clarence Clemons (o eterno saxofonista de Bruce Springsteen).

O sucesso de seu trabalho de arranjadora para Gloria Estefan gerou mais convites, e artistas como Jennifer Lopez e Joss Stone se valeram de seus préstimos profissionais nessa área. Ela também participou de programas de TV e gravou em 2011 o álbum Betty Wright:The Movie, em parceria com o ótimo grupo The Roots. Seu álbum mais recente, Living…Love…Lies, saiu em 2014.

No dia 2 de maio, em sua conta no Twitter, a cantora Chaka Khan pediu preces para Betty Wright, sem dar detalhes do que estava ocorrendo com a cantora. E agora, esta notícia péssima. 2020 está pegando pesado com todos nós, especialmente os fãs de boa música. Descanse em paz, querida Betty! E sua Tonight’s The Night continuará sendo minha trilha sonora, até chegar a minha vez de dar adeus, que espero que demore…

Tonight’s The Night (live)– Betty Wright:

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