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Guilherme Arantes chega aos 70 anos pleno e muito intenso

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Por Fabian Chacur

O meu amigo Guilherme Arantes completa 70 anos de idade nesta sexta-feira (28). Sete décadas! Sendo que desde 1976, quando Meu Mundo e Nada Mais estourou nacionalmente, ele se mantém firme e forte nos corações dos brasileiros de bom gosto musical. O que falar para esse grande cantor, compositor e tecladista paulistano? Pra começo de conversa, votos de muita saúde, paz e tudo de bom, hoje e sempre, pois ele merece e muito!

Bem, vamos divagar um pouco sobre ele. Já fiz isso várias vezes aqui no blog e também em outros espaços, mas nunca é demais ressaltar algumas coisas acerca desse artista incrível. Que é romântico, mas não é o Fábio Jr., é roqueiro mas não é o Cazuza, é pop mas não é o Elton John, e é sofisticado, mas não é o Tom Jobim. Ele é uma soma de muitas coisas, resultando dessa forma em um artista único e inconfundível.

Mr. Arantes consegue ser popular sem cair no rasteiro, e sofisticado sem dar uma de metido a besta. Mergulha com categoria em todos os aspectos do amor, desde a descoberta até o fim e à sua permanência, sempre com aquela intensidade típica de quem certamente amou, ama e amará demais, com o peito aberto e sem medo de ser feliz e de fazer feliz.

Uma das vertentes da música deste grande criador vai por um lado visionário e de fé extrema, do qual a maravilhosa Amanhã é provavelmente seu fruto mais belo e delicioso. Não é por acaso que esta canção sempre volta à tona em situações em que precisamos de uma forte dose de esperança e força para seguirmos adiante, em quaisquer circunstâncias.

A generosidade e a simplicidade de Guilherme são marcas registradas de sua personalidade. Ele também é cara que não tem medo de expor os seus pontos de vista, independentemente de agradar ou não. E conversar com esse cidadão é uma delícia, um verdadeiro privilégio que ele não restringe, mostrando-se sempre acessível quando devidamente solicitado.

Se nos últimos tempos perdemos muitas pessoas incríveis no cenário musical brasileiro e mundial, temos a obrigação de valorizar cada vez mais quem permanece entre nós, pois se há algo lindo de se fazer é dar as flores em vida a quem as merece. E o autor de Êxtase, Cheia de Charme, Lindo Balão Azul, Cuide-se Bem (a minha favorita), Uma Espécie de Irmão e tantas músicas encantadoras merece um jardim inteiro delas.

A obra de Guilherme Arantes é ampla e recheada de bons momentos. Recomendo com entusiasmo a todos um mergulho nela, pois você certamente sairá melhor e muito energizado dessa experiência. Que este artista incrível e ser humano adorável conviva conosco por muitos e muitos anos, sempre com saúde, paz e se mantendo ativo e disposto a brincar de viver. Que ele sabe fazer como poucos.

Amanhã– Guilherme Arantes:

Zé Renato mostra novo álbum com três shows em São Paulo

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Por Fabian Chacur

Zé Renato é aquele tipo de artista que equivale a uma garantia eterna de qualidade, seja qual for o projeto no qual se envolve. Seja carreira-solo, Boca Livre, Banda Zil ou o quer que seja, o jogo é sempre ganho quando este grande cantor, compositor e violonista está em cena. E seu novo álbum solo, Quando a Noite Vem (Biscoito Fino), mantém este alto padrão. Ele mostra o repertório deste trabalho com shows em São Paulo no Teatro Anchieta do Sesc Consolação (rua Doutor Vila Nova, nº 245- Vila Buarque), com ingressos de R$ 12,00 a R$ 40,00 (saiba mais aqui).

Os shows serão realizados nesta sexta (2) e sábado (3) às 20h e domingo às 18h. Além do protagonista se incumbindo de voz e violão, teremos o acompanhamento de Tiago Costa (piano e acordeon), Luque Barros (contrabaixo, violão 7 cordas e violão de aço) e Caio Lopes (bateria).

Quando a Noite Vem teve direção artística a cargo da consagrada atriz Patrícia Pillar, que também ajudou na escolha do repertório, composto por composições alheias de autores como Adoniran Barbosa, Vinícius de Moraes, Eden Ahbez e outros. O romantismo e seus vários ângulos e estados anímicos são um tema recorrente nas canções, entre elas Suave é a Noite, Bom Dia Tristeza e Seu Olhar Não Mente.

Bom Dia Tristeza– Zé Renato:

Fábio Jorge esbanja classe e muita poesia no álbum O Tempo

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Por Fabian Chacur

No início de 2020, o cantor Fábio Jorge (leia mais sobre ele aqui) celebrou 50 anos de vida sem nem ao menos imaginar o que estava se aproximando ali na esquina. Sim, veio a terrível pandemia do novo coronavírus, capaz de chacoalhar e apavorar o mundo. Uma das 1ª vítimas dessa terrível doença em nosso país, uma das mais de 600 mil que nos deixaram precocemente, foi a sua querida mãe. Em meio a essa dor insuportável, ele viu como forma de externar seus sentimentos mais profundos gravar um novo álbum. Eis a semente que gerou O Tempo, disponível nas plataformas digitais e com belíssima tiragem limitada em CD físico.

O 5º álbum do intérprete marca o fato de ter, pela primeira vez, quase todo o seu conteúdo em português, ele que até então se concentrava em canções escritas no idioma pátrio de sua mãe, o francês. Desta vez, a única música nesta língua é La Mamma, clássico sessentista do repertório do ícone da canção francesa Charles Aznavour. As outras nove canções foram selecionadas com precisão cirúrgica e muito bom gosto por Fábio, que fugiu de opções mais óbvias.

Ouvidas como um todo, as canções equivalem a um bom bate-papo com o ouvinte, envolvendo temas como a passagem do tempo, as idas e vindas do amor, as tristezas, as perdas e também a esperança de uma volta por cima e de seguir em frente com muita felicidade e fé, apesar dos pesares. Tudo com arranjos sucintos, de muito bom gosto e executados por músicos extremamente capacitados e sensíveis como Alexandre Vianna (piano), Joan Barros (violão), Thadeu Romano (bandoneon) e Rovilson Pascoal (também responsável por gravação, mixagem e masterização).

Do sempre inspirado Guilherme Arantes, temos a clássica Cuide-se Bem (1976), recado cada vez mais atual, e uma joia não tão conhecida, a intensa Nosso Fim Nosso Começo (1989), profunda análise de um relacionamento que fica em suspenso devido aos problemas de percepção típicos dos seres humanos. Ah, como seria bom dar um pé na porta dessas concepções medrosas e encarar a paixão de peito aberto! Eis o que essa música nos incentiva a fazer, nas suas maravilhosas entrelinhas, que Fábio nos oferece com finesse.

Do grande Gonzaguinha, que o intérprete já homenageou em show só com suas canções, temos a maravilhosa Pra Fazer o Sol Adormecer, que Maria Bethânia gravou em 1983 em seu álbum Ciclo. Outra canção do tipo dor-amor e centrada em contradições que se encaixam com rara felicidade é a absurdamente inspirada A Paz, parceria dos geniais Gilberto Gil e João Donato lançada nos anos 1980 e que tinha uma versão definitiva na voz de Zizi Possi. Tinha. Agora, a minha favorita é esta aqui. Ouçam e tentem não se emocionar, não ver as lágrimas vertendo de seus olhos sem que você as controle. Apenas tentem…

A melancólica e linda O Tempo foi defendida por seu autor, Reginaldo Bessa, no festival global Abertura, aquele vencido por Como Um Ladrão, na voz de Carlinhos Vergueiro, e não é de se estranhar que tenha sido escrita em plena ditadura militar que nos assolou naqueles anos de chumbo. Outras canções que vem daquele período são as ótimas Porta Estandarte (Geraldo Vandré, 1966) e Canção do Medo (Gianfrascesco Guarnieri-Toquinho, de 1972). A primeira virou um belo dueto de Fábio com Consuelo de Paula.

As escolhas mais recentes do repertório, que teve como consultor artístico o grande mestre Thiago Marques Luiz, são Tempestade (Zélia Duncan, 1994), com um arranjo surpreendente que ressalta sua letra densa, e Tá Escrito (2009), sucesso do grupo Revelação e de autoria do talentosíssimo Xande de Pilares (hoje em carreira-solo) que também surge aqui bem longe de seu clima de samba original, e belíssima.

Eis o momento de ressaltar o valor do dono da festa. A forma como Fábio Jorge resolveu botar pra fora suas dores, inseguranças e esperanças não poderia ter sido mais bem realizada. Com interpretações maravilhosas nas quais usa sua voz de veludo sempre na medida exata, sem excessos nem faltas, ele parece acariciar cada melodia, cada verso, nos fazendo entender todo o contexto da coisa. É coisa de craque, de talento absoluta.

Espero que esse trabalho possa ter dado a Fábio Jorge o alívio de que ele tanto necessita. Perder um ente querido é uma dor que nunca passa, nunca cicatriza, mas com a qual a gente aprende a conviver. E, na verdade, esses entes queridos permanecem vivos nas boas lembranças que nos deixaram, e que nos ajudam a suportar suas ausências. Dona Renée, onde estiver, deve estar sorrindo, orgulhosa do filho. E nós, ouvintes, somos gratos por tanta generosidade do filho dela de dividir esse processo artisticamente maravilhoso conosco.

Em tempo: que capa maravilhosa!

Ouça O Tempo, de Fábio Jorge, em streaming:

Paulinho, 68 anos, grande cantor e membro de um grupo seminal

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Por Fabian Chacur

Os Três Mosqueteiros, de Alexandre Dumas, eram, na verdade, quatro. E os equivalentes brasileiros do mundo na música eram seis. Sim, infelizmente sou obrigado a colocar o verbo no passado, pois um deles se foi nesta segunda-feira (14) aos 68 anos. Estou me referindo ao Roupa Nova, e seu mosqueteiro que infelizmente se retira de cena é Paulo Cesar Santos, o Paulinho, vocalista e percussionista que nos deixa aos 68 anos, vítima de covid-19, ele que há três meses havia feito um transplante de medula óssea.

E porque a comparação com os personagens da literatura baseados de certa forma na vida real? Simples: em seus exatos 40 anos de carreira, sempre com a mesma formação, Paulinho e seus fiéis parceiros, Cleberson Horst, Ricardo Feghali, Kiko, Serginho Herval e Nando sempre foram adeptos da máxima “um por todos, todos por um”. Não é de se estranhar que essa formação única só se quebre agora por causa de um problema de saúde.

Tudo começou nos anos 1970, quando o grupo Famks foi criando fama na cena dos bailes cariocas. Eles chegaram a gravar discos, mas faltava alguma coisa. Até que Paulinho, Nando, Kiko e Cleberson convidaram para entrar no time dois novos mosqueteiros, Feghali e Serginho. Com a nova escalação, faltava um nome mais bacana, que veio de uma música composta por Milton Nascimento e Fernando Brant de encomenda pra eles. Roupa Nova!

O disco de estreia saiu há exatos 40 anos, e nos mostrou logo de cara que não se tratava de qualquer grupo. Ou você encontra todo dia uma formação em que todos cantem e toquem muito bem, além de serem versáteis e criativos? Logo naquele álbum, intitulado Roupa Nova, emplacaram seus primeiros hits, maravilhas do naipe de Sapato Velho, Bem Simples, Canção de Verão e o presentão de Milton, padrinho da banda.

Apesar da cara amarrada de boa parte da crítica especializada (sempre eles…), o Roupa Nova logo se mostrou não só um grupo com luz própria, emplacando hit em cima de hit, como também se tornaram reis dos estúdios, gravando com artistas como Roberto Carlos, Gal Costa, Tim Maia e quem você imaginar, sempre dando seu auxílio luxuoso a artistas dos mais diferentes estilos. Até a música-tema do Rock in Rio em 1985 eles fizeram!

Em 1986, em uma das primeira entrevistas coletivas de que participei como jornalista, tive a honra de ter meu primeiro contato com o sexteto, e foi paixão à primeira vista, tal a simpatia deles. Embora todos participassem das vocalizações, os cantores que se incumbiam dos solos vocais eram Paulinho, que também se virava bem na percussão, e Serginho Herval, um de nossos melhores bateristas. Aliás, todos nessa banda são cobras criadas.

Um dos grandes méritos do Roupa Nova reside em seus incríveis arranjos vocais, ao mesmo tempo elaborados e extremamente bons de se ouvir. Quem ouviu o que eles fizeram com Yesterday, dos Beatles, sabe bem do que estou falando. Populares, sim, mas bem longe de popularescos, mesmo nas canções mais escancaradamente românticas que gravaram nesses anos todos.

Serginho era o cara das baladas mais doces, como Anjo e Bem Simples, enquanto Paulinho sempre esbanjou potência vocal e agito na hora dos rocks mais dançantes, do tipo Whisky a Go-go e Show de Rock And Roll, ou nas power balladas do tipo Volta Pra Mim e Linda Demais.

Com todos esses atributos, aliados a uma união invejável, o Roupa Nova conseguiu atravessar quatro décadas lotando os shows, frequentando as programações de rádios e mantendo um fã-clube fiel, sempre com um trabalho consistente e capaz de cativas os mais diferentes tipos de público. E bem-humorados, como em uma entrevista para mim nos anos 1990, na qual se autodenominaram os “dinossauros do brega”. Brega? Tá bom…

Linda Demais– Roupa Nova:

Sapato Velho (clipe)- Roupa Nova:

Zé Guilherme faz show em SP com clássicos de Orlando Silva

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Por Fabian Chacur

Em 2015, quando celebramos o centenário do nascimento do icônico cantor carioca Orlando Silva (1915-1978), o cantor e compositor cearense radicado em São Paulo Zé Guilherme lançou o excelente Abre a Janela- Zé Guilherme Canta Orlando Silva. Como seria de se esperar, este CD se tornou clássico, e, quatro anos depois, ele não se furta a fazer shows com este repertório delicioso. Um deles ocorrerá nesta quinta-feira (27) às 21h no Bar do Nelson (rua Canuto do Val, nº 83- Santa Cecília- fone 0xx11-3224-0586), com ingressos a R$ 30,00.

O legal deste álbum delicioso é que Zé Guilherme não tentou imitar o vozeirão de Orlando Silva, e releu as canções de forma brejeira e personalizada. O resultado não poderia ter sido melhor, com 18 canções da considerada melhor fase do Cantor das Multidões, entre 1935 e 1942. Temos grandes sucessos e também canções não tão conhecidas, mas tão boas quanto os hits. Abre a Janela, A Jardineira, Dama do Cabaré, Lábios Que Beijei e Curare estão no elenco.

Zé Guilherme será acompanhado por Cezinha Oliveira (direção musical, violão e vocais, o mesmo do CD), Adriano Busko (percussão), Maik Oliveira (cavaquinho) e Pratinha Saraiva (flautas). Recentemente, o artista lançou um novo e excelente álbum, Alumia, o quarto de sua discografia, desta vez dedicado a repertório autoral (leia mais sobre esse trabalho aqui).

Ouça Abre a Janela- Zé Guilherme Canta Orlando Silva em streaming:

Toni Tornado (1971) é relançado em LP de vinil de 180 gramas

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Por Fabian Chacur

Tony Tornado beirava os 40 anos de idade em 1970, quando foi convidado a defender, no V Festival Internacional da Canção, a música BR-3 (de Antonio Adolfo e Tiberio Gaspar). Ele já havia encarado inúmeros desafios na vida até então, incluindo morar durante cinco anos em Nova York, imitar cantores como Chubby Checker e Little Richard em programas da TV brasileira e o que mais pintasse. Ali, achou finalmente o seu rumo, sendo o vencedor da fase nacional daquele evento promovido pela TV Globo e cativando com uma performance espetacular.

Um ano depois, lançou o seu disco de estreia, Toni Tornado (a grafia de seu nome artístico usava o i, ao invés do y atual). Esse disco clássico acaba de ser relançado em vinil de 180 gramas, em parceria da Polydisc com a Universal Music.

BR-3 é a faixa mais conhecida daquele trabalho, uma balada intensa que ajudou a introduzir a soul music no Brasil, com direito a vigorosos e perfeitos vocais de apoio por conta do Trio Ternura. Experiente, Tony incorporou esse estilo musical com muita propriedade, e esse álbum de estreia segue tal linha com categoria, trazendo 12 faixas, entre as quais o seu maior hit e também Me Libertei (Frankie e Tony Bizarro) e O Jornaleiro (Major e Toni Tornado).

Após mais um hit, Podes Crer, Amizade, faixa de seu segundo e também autointitulado álbum, de 1972, Tony mergulhou na carreira de ator, que lhe proporcionou muito sucesso em filmes, novelas, séries etc. Dessa forma, a música ficou em segundo plano, na sua vida, tanto que ele nunca mais gravou um disco solo. Uma pena, pois o cara era do ramo. Nesse disco agora relançado, temos produção de Milton Miranda e orquestrações, arranjos e participações de Paulo Moura e Walter Branco, todos brilhantes.

BR-3– Toni Tornado:

Ayrton Montarroyos esbanja sua elegância em CD gravado ao vivo

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Por Fabian Chacur

Se fosse necessário definir o segundo CD de Ayrton Montarroyos, Um Mergulho no Nada (lançado pela gravadora Kuarup) com apenas uma palavra, eu escolheria esta aqui: elegante. O intérprete pernambucano de 23 anos esbanja tal qualidade durante os aproximadamente 35 minutos de duração deste belo álbum, gravado ao vivo ironicamente no dia 1º de abril de 2018 no Teatro Itália, em São Paulo. Pois se há uma coisa que a performance do moço não emana, é mentira. A verdade marca presença por aqui de ponta a ponta.

Ayrton ficou conhecido nacionalmente ao ser um dos finalistas em 2015 do reality show musical The Voice Brasil. Em 2017, lançou o primeiro álbum, gravado em estúdio e autointitulado. Desta vez, ele nos oferece sua alma desnuda. Afinal de contas, trata-se de um trabalho ao vivo e no qual ele conta com o apoio de apenas um instrumento, no caso o violão de 7 cordas tocado magistralmente por Edmilson Capelupi, literalmente professor nessa área e conhecido por participar das trilhas dos filmes Dois Córregos (1999) e Cidade de Deus (2002) e gravar com gente do gabarito de Jane Duboc, Zizi Possi, Patricia Marx, Eliete Negreiros e muitos outros.

Nesse formato, a interação entre cantor e músico precisa ser absurda. Afinal, qualquer eventual falha fica exposta de forma constrangedora. Neste caso, a dobradinha Montarroyos-Capelupi envolve o ouvinte de forma poderosa, pois temos um vibrante diálogo entre os acordes, baixos e dedilhados do violão com a voz ao mesmo tempo doce e mais próxima das regiões graves do cantor. Os vazios são sempre aproveitados de forma estilística, não ocasional, e são poucos, pois o preenchimento de espaços feito por eles é cirúrgico.

As dez faixas selecionadas por Ayrton para Um Mergulho no Nada vão desde obras de compositores jovens até pérolas obscuras pinçadas de eras distantes e nobres da nossa música, passando por alguns clássicos, também. Na verdade, temos a impressão de que o principal critério seguido por ele deve ter sido o mais simples, e ao mesmo tempo mais coerente: aquelas canções que melhor se encaixam em sua musicalidade, que falam mais para ele, e que ele sente mais prazer em interpretar. E como deu certo!

Com um timbre belíssimo de voz, Ayrton Montarroyos procura trabalhá-lo de forma precisa, sem se permitir arroubos operísticos ou exagerados. As sutilezas são esmiuçadas no melhor estilo bossa nova, com inspiração provavelmente de gente do gabarito de Caetano Veloso e João Gilberto. Cada palavra é dita com conhecimento de causa de quem entende seu significado e procurando transmitir o sentido de cada poesia ao ouvinte, como que o convidando a sonhar, sofrer, amar e imaginar cada contexto criativo proposto por seus autores.

Alguns poderiam contestar as releituras de músicas com versões originais tão marcantes como Açaí (Djavan) e Cálice (Chico Buarque-Gilberto Gil), mas vale lembrar a justificativa que os integrantes do grupo Roupa Nova deram em 1999 às releituras que fizeram de seus sucessos no álbum meio eletrônico Agora Sim!: essas regravações não invalidam as anteriores e podem conviver pacificamente. E neste caso específico, Ayrton soube se apropriar das duas e dar a elas uma cara nova e própria. Não supera as originais, mas quem disse que isso seria necessário? O legal é que dá prazer ouvir as duas com ele, e isso basta.

Um Mergulho No Nada (título extraído de versos da canção Sem Pressa de Chegar, de Capiba e Delcio Carvalho e um dos pontos altos do CD) alterna samba, bossa-nova, latinidades, samba-canção e até pop com uma fluência que vai ligando de forma natural uma faixa à outra. Como a duração do álbum equivale a um daqueles discos de vinil de antigamente, dá vontade de ouvir novamente. E aí você ouve, e ouve, e ouve, descobrindo novas sutilezas, novos encadeamentos, novas surpresas. E a paixão se concretiza! Se a ideia era mergulhar no nada, Ayrton na verdade nos fez mergulhar no tudo. Tudo de bom!

Cálice– Ayrton Montarroyos:

Luiz Melodia tem LP clássico e genial reeditado em vinil 180g

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Por Fabian Chacur

Mais um item bem bacana é adicionado ao catálogo da série Clássicos em Vinil, editada pela Polysom. Trata-se de Maravilhas Contemporâneas, do completamente genial cantor, compositor e músico carioca Luiz Melodia, que infelizmente saiu de cena em 2017 aos 66 anos, deixando como inestimável legado trabalhos desse altíssimo gabarito.

Maravilhas Contemporâneas saiu originalmente em 1976, lançado pela gravadora Som Livre. Trata-se do segundo álbum de Melodia, e certamente aquele que o encaminhou rumo ao estrelato. A faixa que impulsionou a divulgação e a vendagem desse trabalho é a seminal Juventude Transviada, parte integrante da trilha sonora da novela global Pecado Capital e tocada com destaque naquela atração televisiva.

Outra faixa de bastante destaque é Congênito, daquelas que nunca saía do repertório de seus shows, com ritmo gostoso e letra filosófica e profunda, além de direta. O álbum, com 11 faixas, também inclui pérolas do porte de Baby Rose, Memórias Modestas, Paquistão e Quando o Carnaval Chegou, todas com aquela mistura de rock, soul, samba, jazz, reggae e o que mais pintasse de bom. Genialidade em estado puro.

Maravilhas Contemporâneas- ouça o álbum em streaming:

Luiz Melodia: o adeus a esse mestre inclassificável da MPB

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Por Fabian Chacur

Que tipo de música fazia Luiz Melodia? MPB? Samba? Blues? Jazz? Soul? Rock? Ou na verdade uma mistura inclassificável desses e de outros gêneros musicais? Boa pergunta. Mas em um ponto todos concordamos: o cara era dono de um swing genial. Esse grande talento infelizmente nos deixou na madrugada desta sexta(4), aos 66 anos, após lutar contra um câncer na medula óssea. E eu tive a honra de presenciar seu último show, realizado na cidade de Jaú (SP). Leia a resenha aqui .

Nascido no Rio de Janeiro em 7 de janeiro de 1951, Luiz Carlos dos Santos (seu nome de batismo) é cria do Morro do Estácio. Desde o começo, seu samba se mostrava diferente, embora sempre baseado nos grandes nomes da história desse gênero musical. Ele se tornou conhecido inicialmente como compositor, ao ter sua Pérola Negra gravada por Gal Costa. Em 1973, gravou o primeiro álbum, intitulado também Pérola Negra e muito elogiado pela crítica especializada

O sucesso de fato veio em 1975, quando sua música Ébano foi finalista e teve destaque no Festival Abertura, promovido pela Rede Globo. Logo a seguir, Juventude Transviada, faixa de seu segundo álbum, o genial Maravilhas Contemporâneas (1976), foi incluída com destaque na trilha da novela global Pecado Capital, e a repercussão lhe valeu um estouro de proporções nacionais.

Sem se deixar contaminar pelo vírus negativo que às vezes o sucesso incute nos artistas, Melodia desenvolveu uma obra consistente e sólida, na qual unia ótimas composições próprias a releituras personalizadas de músicas alheias, entre as quais Negro Gato (Getúlio Cortes), hit de Roberto Carlos nos tempos da Jovem Guarda que o swingado carioca tomou para si com uma personalidade tal que muitos pensam que essa canção é de autoria dele.

Após uma década de 1980 na qual ficou mais distante da mídia, embora lançando bons trabalhos, ele voltou às paradas de sucesso em 1991 ao regravar com personalidade Codinome Beija-Flor, de Cazuza, outra canção que entrou em trilha de novela global,O Dono do Mundo. A partir daí, atraiu as atenções das novas gerações e gravou até CD/DVD em parceria com a MTV. E seus shows continuaram irresistíveis.

Após fazer o show em Jaú (SP) em julho, que ele encarou mesmo já demonstrando não estar tão bem, Luiz Melodia passou por exames e descobriu o câncer de medula óssea que o afastou de cena. Em março, ele fez um transplante de medula, que infelizmente não atingiu o objetivo esperado. Se ele sai de cena em termos físicos, a herança musical que nos deixa é de valor incalculável e será cultuada enquanto houver gente com bom gosto musical na face da terra.

Juventude Transviada– Luiz Melodia:

Marcos Lessa faz show no Rio em tributo a Emilio Santiago

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Por Fabian Chacur

A voz de Emilio Santiago (1946-2013) infelizmente se calou, mas não o seu legado como um dos grandes intérpretes da história da nossa música brasileira. Pouca gente tem talento suficiente para se arriscar a fazer um tributo a esse saudoso astro, e entre eles está Marcos Lessa. O jovem cantor fará no Rio neste domingo (28) um show com canções imediatamente associadas a Emilio. Será às 20h na Sala Baden Powelll (avenida Nossa Senhora de Copacabana, nº 360- fone 0xx21-2255-1067), com ingressos a R$ 40,00.

Lessa não é fraco, não. Ele terá a seu lado neste show, que já foi exibido com sucesso no Rio em agosto de 2016 no Beco das Garrafas, nada menos do que a banda que acompanhou Emílio Santiago durante dez anos. Os músicos, todos do primeiríssimo escalão, são Rafael Barata (bateria), Alex Rocha (baixo), Fernando Merlino (piano) e José Arimateia. No repertório, maravilhas como Saigon, Verdade Chinesa, Cadê Juízo e Flamboyant, entre outras. Vai ser de arrepiar!

Nascido em Fortaleza (CE) em fevereiro de 1991, Marcos Lessa ficou conhecido nacionalmente ao ser semifinalista do reality show musical televisivo The Voice Brasil em 2013. Não ganhou, mas provou ter uma voz excepcionalmente bela e bem treinada, como tivemos a oportunidade de conferir no excelente álbum Entre o Mar e o Sertão (leia a resenha de Mondo Pop aqui ). Um talento lapidado e intenso que ainda irá nos oferecer muitas coisas boas.

Lindo Lago do Amor (ao vivo)- Marcos Lessa:

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