geraldo vandre uma cancao interrompida

Por Fabian Chacur

Geraldo Vandré é uma das figuras mais fascinantes e enigmáticas da história da música brasileira. Inúmeros pontos de interrogação sempre pairaram sobre o seu trabalho como cantor, compositor e músico, especialmente seus problemas com a Ditadura Militar. Para quem quiser mergulhar de cabeça no tema, vale ler Geraldo Vandré- Uma Canção Interrompida, livro que nos permite conhecer a vida e obra do autor de Pra Que Não Dizer Que Não Falei das Flores (Caminhando).

Fruto de aproximadamente dez anos de minuciosas pesquisas por parte de seu autor, o experiente jornalista Vitor Nuzzi, o livro foi inicialmente lançado por conta própria em pequena tiragem. Com a regulamentação da lei sobre as biografias, a gravadora e editora Kuarup agora lança o livro em tiragem comercial, permitindo ao grande público ter acesso a um trabalho de fôlego digno do personagem enfocado no mesmo.

Sem conseguir entrevistas com o personagem de sua obra, Nuzzi superou essa dificuldade inicial fazendo inúmeras e significativas entrevistas com pessoas que trabalharam ou tiveram contato direto com Vandré, além de literalmente comer poeira nos arquivos de revistas, jornais, internet etc (e tome etc) para buscar o máximo possível de informações confiáveis, incluindo aí depoimentos do artista concedidos em entrevistas para outros repórteres.

Geraldo Vandré- Uma Canção Interrompida equivale a uma extensa reportagem, das boas, por sinal, na qual o autor se exime de dar opiniões ou analisar, deixando isso para suas fontes e sempre procurando dar ao leitor várias visões sobre cada questão, para que cada um possa tirar as suas próprias conclusões. Foi opção do autor fugir do clima romanceado de outras obras do gênero, e o resultado é elogiável.

O relato engloba toda a trajetória do paraibano Geraldo Pedrosa de Araújo Dias, desde sua infância em João Pessoa até a participação, em 2014, em dois shows de Joan Baez em São Paulo, passando por tudo. O início nas rádios cariocas, a adesão à bossa nova, o desenvolvimento de uma obra calcada nas raízes da música nordestina, os festivais, os parceiros, os amigos, está tudo lá, sempre com minuciosos detalhes sobre cada personagem.

A incrível história que envolve suas músicas mais famosas, Disparada e Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores (Caminhando), os problemas com o Regime Militar que o levaram a ficar fora do Brasil entre 1969 e 1973, seu estranho retorno ao país, o afastamento da carreira musical e as raras incursões públicas pela música são apresentadas de um jeito detalhado e acessível ao público médio.

Embora enfatize nos momentos corretos as ocorrências de cunho pessoal, o livro dá amplos espaços para aquilo que tornou o artista conhecido e digno de nota, que é a sua obra artística. Todos os seus poucos discos são esmiuçados, assim como canções que não foram gravadas, obras inéditas e muito mais, com direito a uma discografia no fim do livro (que também inclui uma bibliografia bacana).

“Causos” pitorescos e bem documentados ajudam a mostrar a singularidade de Geraldo Vandré, que aos 80 anos de idade continua sendo cultuado por muitos e odiado por outros tantos. O livro de Vitor Nuzzi é essencial para quem deseja não só conhecer a trajetória desse grande artista, mas também para se ter uma ideia do tamanho das mudanças ocorridas na indústria cultura nos últimos 60 anos.

Obs.: a capa, com uma imagem em preto e branco granulada do artista no palco ladeado por um banquinho e com o violão em mãos é simplesmente genial, uma obra prima, pois dá bem a dimensão de como esse artista que chegou a ser tão popular saiu de cena, pelas razões que podem ser descobertas em suas 350 páginas.

Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores (Caminhando)– Geraldo Vandré:

Na Terra Como No Céu- Geraldo Vandré:

Canção Nordestina- Geraldo Vandré: