laura nyro walk the dog-400x

Por Fabian Chacur

Em 1993, Laura Nyro completou 26 anos de carreira discográfica. Durante esse período, tornou-se mais conhecida como compositora, embora fosse uma excelente intérprete, dona de uma discografia instigante. Naquele ano, a também cantora e pianista americana lançou o trabalho que tinha tudo para enfim elevá-la aos primeiros lugares das paradas de sucesso, o envolvente Walk The Dog And Light, lançado pela Columbia (hoje parte do conglomerado Sony Music). Só que não…

Laura teve um início precoce no mundo da música, e com apenas 18 anos já lançava seu álbum de estreia, More Than a New Discovery (1967), pelo pequeno selo Verve Folkways (seria relançado em 1973 com o título First Songs e outra sequência das músicas contidas nele). Desde o início, mostrava uma original mistura de soul, jazz, pop music tradicional e doo-wop, com um leve tempero de rock.

Ela participou do Monterey Pop Festival em 1967, e depois lançaria uma trilogia de álbuns que a tornou uma verdadeira unanimidade entre os colegas músicos, Eli And The Thirteenth Confession (1968), New York Tendaberry (1969) e Christmas And The Beads Of Sweat (1970), nos quais aliou introspecção, apelo pop, belas melodias, vocalizações atraentes e letras profundas e inteligentes.

Se esses trabalhos não conseguiram grandes números em termos de vendagens, atraíram outros artistas, que regravaram composições de sua autoria como Wedding Bell Blues, Stoned Soul Picnic, And When I Die, Save The Country e outras e, aí, sim, conquistaram os primeiros lugares das paradas de sucesso. Artistas como Barbra Streisand, The Fifth Dimension, Three Dog Night e Blood, Sweat & Tears foram alguns dos que se deram bem com suas canções.

Curiosamente, seu single de maior sucesso, Up On The Roof, é um cover, releitura de canção escrita por Carole King e Gerry Goffin e incluída no álbum Christmas And The Beads Of Sweat (1970). Em 1971, incentivada por tal êxito, gravou um álbum inteiro só de covers de soul e r&b ao lado do trio negro feminino Labelle, o delicioso Gonna Take a Miracle. Aí, com apenas 24 anos, ela resolveu sair de cena.

A partir do seu retorno ao mundo musical, ocorrido em 1976 com o álbum Smile, Laura passou a ter uma carreira marcada por alguns hiatos e ainda menos repercussão. Quando Walk The Dog And Light The Light chegou às lojas, em agosto de 1993, ela completava nove anos sem lançar um álbum de estúdio, período durante o qual só tivemos um LP ao vivo com algumas inéditas (Live At The Bottom Line, 1989).

Walk The Dog… equivale a uma consolidação da fase pós-retorno de Laura, na qual suas canções foram aos poucos ganhando um clima mais solto e relaxado, embora sem perder a consistência de seus anos de maior popularidade. A coprodução do experiente Gary Katz, conhecido por seus trabalhos ao lado do grupo Steely Dan, deu ao trabalho uma sonoridade concisa e consistente, o que a presença de músicos experientes ajudou a concretizar.

O álbum é aberto e encerrado com canções de outros autores. A deliciosamente delicada Oh Yeah Maybe Baby (The Heebie Jeebies), de Phil Spector, fez sucesso com o grupo vocal The Crystal em 1963. Um delicioso pot-porry une I’m So Proud, de Curtis Mayfield e hit com seu grupo The Impressions em 1964, e a célebre Dedicated To The One I Love, lançada em 1957 pelo grupo The 5 Royales e eternizada em regravações de The Shirelles e The Mamas And The Papas.

Lite a Flame (The Animal Rights Song) e Broken Rainbow são novas versões de musicas que ela havia gravado nos anos 1980. Combinadas com outras seis composições de Laura, temos aqui um álbum absolutamente perfeito, no qual tudo se encaixa feito luva. As letras, profundas, tem como temas o feminismo sem recalques, respeito aos animais e à natureza, a solidão da vida na estrada e até mesmo, de forma divertida, um ode à menstruação (a swingada The Descent Of Luna Rosé).

A performance vocal de Laura é provavelmente uma das melhores de sua carreira, efeito positivo de ela ter abandonado o vício do cigarro uns anos antes. Seu piano elegante e estiloso conduz tudo, ladeada por músicos do porte de Bernard Purdie (bateria), os irmãos Michael e Randy Brecker (metais), Michael Landau (guitarra) e outros do mesmo porte. E vale elogiar as harmonias vocais, com todas as vozes a cargo da própria artista. Simplesmente de arrepiar.

Embora sofisticadas, as canções não são complicadas a ponto de impedirem o público mais acostumado a música pop comercial de ouvi-las e assimilá-las. No entanto, o disco sequer passou perto dos charts americanos, e por tabela, dos de outros países. As rádios simplesmente ignoraram suas dez ótimas faixas.

Devem ter ajudado para tal resultado negativo o fato de a artista ter se recusado a participar de programas de TV para divulgar o disco (até mesmo o de David Letterman, fã confesso da artista), ou mesmo a falta de um empenho um pouco maior por parte da Columbia no intuito de impulsionar as vendas de seu produto discográfico.

Infelizmente, Walk The Dog And Light And Light The Light foi o último trabalho de inéditas lançado por Laura Nyro em vida. Ela nos deixou precocemente em abril de 1997, sendo que em 2001 seria lançado o álbum Angels In The Dark, com as gravações feitas por ela em 1994 e 1995 visando criar na verdade dois álbuns, um de inéditas e um de covers. Um verdadeiro crime contra a boa música esse CD ser tão pouco conhecido. Ouça e tente duvidar dessa afirmação!

Walk The Dog And Light The Light– Laura Nyro: