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Documentário viaja pela relação literatura/música

Por Fabian Chacur

 

Uma das questões mais imbecis que existem é: letra de música é poesia ou não? A mesma questão, desdobrada: letrista de música é poeta ou não? Como se escrever poesia fosse algo maior do que “letrar” canções…… Bem exercidas, as duas atividades podem nos proporcionar obras superlativas, da mesma forma que maus profissionais nos dois ramos certamente arrancarão insatisfação de nossas sensibilidades. Felizmente, essa eterna dúvida não é a essência do documentário Palavra (En)cantada, da diretora Helena Solberg, atualmente em cartaz em São Paulo. Chico Buarque, um dos entrevistados, comenta de forma bem humorada o assunto, tendendo a considerar os poetas superiores, mas deixando claro a importante relação palavra/melodia que está incutida na essência das letras de canções. E um dos entrevistados toca no nervo da coisa: como não considerar Chico Buarque um poeta? Solberg, de forma inteligente, não pretendeu esgotar o vasto tema nos 83 minutos de sua obra, que acaba sendo uma espécie de grande bate-papo sobre literatura, música, poesia, cultura, os rumos da MPB e muito mais. Além do autor de Construção, marcam presença em Palavra (En)cantada gente do alto calibre de Paulo César Pinheiro, Lenine, Zélia Duncan, Tom Zé, Adriana Calcanhoto, Luis Tatit, José Miguel Wisnik, Ferréz, Martinho da Vila, Maria Bethânia e Antonio Cícero, que falam com desenvoltura. Não faltam momentos maravilhosos, como a explicação que Tatit dá para a origem tropicalista em letras de artistas como Djavan, fazendo uma provavelmente inconsciente colocação irônica sobre como o letrista alagoano escreve freqüentemente de um jeito sem pé nem cabeça. Ou Chico comentando sobre o fato de João Cabral de Mello Neto odiar música e, após alguns meses, descobrir que ele havia feito um musical inspirado em Morte e Vida Severina. Ou as intervenções sempre inesperadas e divertidas desse moleque de 70 e poucos anos que atende pelo nome de Tom Zé. Palavra (En)cantada é isso, um papo gostoso sobre essa coisa maravilhosa que é a MPB.

 

Confira o trailer de Palavra (En)cantada:

 

http://www.youtube.com/watch?v=Qh5DpDTI6K4

7 Comments

  1. Alexandre Damiano

    April 11, 2009 at 5:20 pm

    Acho que música e letras de música podem ser mais do que poesias.
    Podem ser manifestos, podem ser ensaios, podem ser lixos, podem ser poesia, podem ser cartas….

    Enfim, é música.

  2. Achei tão leve a forma que este documentário conduziu o tema.

    Lembro da época que estudava Letras, o professor entrava e já falava: “Letra de Música é poesia e se quiser provar outra coisa, vá para o bar “botecar” e não me encha o saco”.

    É que estas discussões eram tão comum que enchia a paciência de todo mundo, porque sempre havia um infeliz que “desenterrava este defunto ” e começava tudo de novo.Por isso, a Adriana Calcanhoto afirma que :”tem coisas mais importantes nesta vida”…he he he

    E foi por isso que gostei deste documentário: todos os envolvidos não queria nem saber em discutir se uma coisa é ou não é e sim mostrar a beleza da obra.

    Eu adorei a explicação das letras do Djavan (eu ri baixinho na hora…).
    Eu também acho que um “nada de nada” sem tamanho.

    Gostei muito que mostraram o Lirinha.Acho ele subestimado demais.Os shows do Cordel do Fogo Encantado são mágicos.Já tive a oportunidade de ver …emociona.

    A participação do ? Chico Buarque ? foi linda tamanha simplicidade, bom humor e humildade.

    A saber: Já deu um pulinho no site do Edu Lobo ?? Um luxo…como ele.

    Saudações, Chacur!!!!

  3. Obrigado pelos comentários pertinentes, Carla. Não fui no site do Edu Lobo, não, farei isso logo, obrigado pela ótima dica! E muitíssimo obrigado pela visita, Alexandre e Carla!

  4. Fabian , essa discussão é bem interessante . A palavra quando é cantada as vezes assume outro contexto , e varia pelo efeito que tem dentro da música e pelo resultado que produz quando se junta a ela . O que parece muito simples quando se escreve , muitas vezes pode ter um poder incrível quando cantado . Não há como não se considerar uma letra como poesia apenas pelo fato dela ser apoiada por uma música . Mesmo porque , muita gente já cantou poesias propriamente ditas , fazendo uma espécie de caminho inverso . Ou seria , caminho em verso ?

  5. Sensacional essa “caminho em verso”, Marcelo! E de fato essa discussão é das mais interessantes, ainda mais quando realizada com a leveza e as opiniões pertinentes contidas nesse documentário. Grande abraço, e obrigado pela visita qualificada!

  6. A discussão é valorativa. Letras de música são na sua maioria poesia popular como são o repente, a trova literária, etc. Mas tem letristas que estão acima disso, fazendo um meio termo entre o erudito e o popular. A estética musical de uma letra não anula seu valor literário. Se fosse esse o caso, a estética plástica de um poema concreto anularia seu valor literário também? Mas as análises do conteúdo literário das letras estão aí para quem quiser estudá-las. Observei nos textos da net em que os críticos estão afirmando que letra não é música uma análise tendenciosa, onde se passa sutilmente da teoria literária para a crítica literária, na qual se salienta a pobreza das letras e nada se fala sobre suas qualidades. Se “Construção” não tem decassílabos perfeitos o que dizer das suas imagens poéticas? E o rearranjo criativo das palavras em versos distintos? E os defeitos de métrica que Glauco Mattoso observou em versos da poesia erudita? São usados dois pesos e duas medidas quando qualquer leigo sabe que verso e rima estão numa letra com efeito estético similar ao de qualquer poema.
    Eu penso que nos melhores exemplares de letras de música e poemas já ficou demonstrada a possibilidade da plena expressão poética.

  7. admin

    December 7, 2011 at 4:40 pm

    Bela opinião, Carlos. Concordo contigo. O importante é saber aproveitar cada caminho artístico com criatividade e paixão. O resto é discutir sexo de anjo..rsrsrs Grande abraço, obrigado pela visita e volte sempre!!!!

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