Por Fabian Chacur

Em 1976, dominavam os horizontes do mainstream musical o hard rock, o heavy metal, a disco music e o pop mais escancarado. O punk dava seus primeiros gritos e Bruce Springsteen começava a virar estrela.

Nesse cenário, surgiu um sujeito de 24 anos oriundo do estado da Flórida disposto a obter bom resultado a partir de uma equação nem sempre fácil: aproveitar influências anteriores a ele e imprimir nelas um tempero próprio.

Em seu caso, dar prosseguimento à linha evolutiva do rock americano, valendo-se de elementos sonoros de gente como Del Shannon, Chuck Berry e Buddy Holly, que deram início a tudo nos anos 50.

Mais ainda: mergulhando de cabeça em pelo menos três nomes fundamentais para o rock and roll dessa linguagem: Bob Dylan, The Byrds e os Rolling Stones. Estes últimos podem ser ingleses, mas sua sonoridade possui fortíssimo acento ianque, especialmente a partir do final dos anos 60.

Mas Petty não queria encarar isso como artista solo. Então, foi atrás de músicos com gabarito suficiente para encarar a missão. De cara, trouxe para o time o guitarrista Mike Campbell e o tecladista Bemmont Tench, que haviam tocado com ele na obscura banda Mudcrutch.

Os dois, por sua vez, indicaram o baixista Ron Blair e o baterista Stan Lynch. Em poucos ensaios, ficou claro que Petty, incumbido dos vocais e da guitarra, estava mais do que bem acompanhado.

Em 1976, eles conseguiram um contrato com a Shelter Records, do produtor e compositor brtitânico Denny Cordell, famoso por seus trabalhos com Joe Cocker, The Moody Blues e Leon Russell.

O primeiro álbum, Tom Petty & The Heartbreakers, saiu em outubro de 1976, e pode ser incluído entre os grandes trabalhos de estreia de um artista que posteriormente conseguiu se consolidar na carreira.

As letras das dez canções incluídas no álbum são na melhor tradição estradeira, falando sobre amores, viagens, tragédias cotidianas e a profissão de fé no velho e bom rock and roll.

A coisa já começa a mil com o acelerado rockabilly Rockin’ Around (With You). A faixa dois, o compassado e climático rock Breakdown, foi fazer sucesso apenas em 1978, quando entrou na trilha do filme FM, e é uma paulada, o primeiro hit desse álbum nos EUA.

Hometown Blues é desses roquinhos dançantes com forte tempero do rock americano. The Wild One, Forever é uma forte balada roqueira, na qual Petty solta a sua voz com força e comprometimento.

A faixa cinco, que encerrava o lado um no formato LP de vinil, é um rockão a la Rolling Stones, a excepcional Anything That’s Rock ‘N’ Roll, com passagens de guitarra absolutamente certeiras.

Compassada, com riff de guitarra hipnotizante e uma levada de bateria absolutamente brilhante, Strangered In The Night é aquele tipo de jóia que nunca entra em coletâneas, mas que é tão boa como as que entram.

Fooled Again (I Don’t Like It) é dessas baladas roqueiras furiosas, na qual Tom Petty liquida com quaisquer dúvidas que alguém eventualmente pudesse ter quanto a seu gogó. Visceral e brilhante.

Sabem aquelas country ballads típicas dos Rolling Stones? Temos uma boa derivação delas aqui, com Mr. Petty soando como Mick Jagger, mas não caindo na paródia, nesta belíssima Mystery Man.

Luna é a canção mais reflexiva do álbum, com direito a boas passagens de teclados e bela melodia. O disco de estreia da banda é encerrado pelo alucinado rock American Girl, um clássico do repertório do quinteto.

Quase todas as vertentes que aparecem até hoje nos discos de Tom Petty (com ou sem os Heartbreakers) estão neste disco inicial, um trabalho que consegue ser cru e sofisticado ao mesmo tempo.

E o mais legal: eles soam como uma banda de fato, e não como meros acompanhantes de Tom Petty. Músicos brilhantes, que depois tocariam em discos dos mais diversos astros da música. Que começo de carreira!

Como diz o ótimo texto que acompanha a reedição em CD deste disco, assinado pelo brilhante jornalista musical Bill Flanagan, Tom Petty gravou diversos discos depois deste, e vários melhores, mas nenhum é tão emblemático a respeito desse som que tanto amamos que é o rock and roll.