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Por Fabian Chacur

O excelente repórter e crítico especializado em samba João Mateus Filho deu a Martinho da Vila o apelido de “O Pelé do Samba”. Nada mais justo. Em seus 50 anos de carreira, o cantor e compositor nascido na cidade de Duas Barras (RJ) mostrou tanto talento em sua seara quanto o lendário craque de futebol (MG). Pois nesta segunda (12) esse mestre completa 80 anos de vida, e Mondo Pop não poderia deixar a data passar batida.

Oriundo de família humilde, Martinho José Ferreira demorou para se dedicar exclusivamente à carreira musical. Antes, desempenhou várias atividades para prover seu sustento, incluindo a de sargento do exército, ocupação esta que só abandonou em 1970, quando completou 32 anos de idade. Naquele momento, ficava claro que a carreira musical poderia mantê-lo sem grandes problemas. E não deu outra!

Cria musical da escola de samba Vila Isabel, para a qual compôs vários sambas-enredo bem-sucedidos, Martinho tornou-se conhecido nacionalmente no finalzinho dos anos 1960. Na minha vida, ele entrou com força graças ao incrível álbum Memórias de Um Sargento de Milícias (1971), aquisição certeira (só para variar) do meu irmão Victor. Disco bom de ponta a ponta, trazendo como destaques as contagiantes Segure Tudo e Seleção de Partido Alto.

Quem sabe pelo fato de ter assumido a música como profissão de fato após os 30 anos de idade, Martinho sempre teve como marca o rigor em relação à qualidade do que fazia e ainda faz. Seus discos não abriam espaço para faixas do tipo “tapa-buracos”. Da mesma forma, ele encarava de frente os diretores artísticos de gravadoras e só incluía em seus trabalhos canções que lhe agradassem, sem se render a modismos ou interesses escusos diversos.

Essa preocupação se estendia às capas de seus álbuns, sempre feitas no capricho e se valendo de artes de nomes do porte de Elifas Andreato. Ele é um dos grandes responsáveis por um maior respeito ao samba por parte de crítica especializada e indústria musical. Aquele gênero sempre tratado como “coisa do povão” e colocado em segundo plano passou a ser olhado de uma outra forma graças à batalha de gente como Martinho, Paulinho da Viola e João Nogueira.

Ao contrário de outros sambistas que se perderam no caminho, após alguns anos de bom posicionamento nas paradas de sucesso, Martinho da Vila nunca saiu de cena, gravando de forma constante, sempre em grandes gravadoras e com a devida atenção por parte da imprensa. Lógico que ele conquistou isso com sua postura sempre profissional, com suas entrevistas inteligentes e com o conteúdo artístico de alto quilate em seus discos e shows.

Tive a honra de entrevistar o Pelé do Samba em várias oportunidades, e em todas elas senti de perto sua simpatia, articulação e respeito pelos interlocutores. Em uma dessas oportunidades, lá pelos idos de 1988, tive a meu lado o meu mestre e então editor de Cultura do Diário Popular, o jornalista Oswaldo Faustino. Aí chegou a ser ignorância, pois na prática fiquei ali, babando na frente de dois caras do mais alto gabarito cultural e de vida. Show!

Um dos méritos supremos de Martinho é o fato de ter conseguido aliar qualidade artística a apelo comercial em seus trabalhos. Seu repertório de hits, dele e de autores sempre escolhidos a dedo, traz maravilhas do porte de Canta Canta Minha Gente, Segure Tudo, Batuque na Cozinha, Você Não Passa de Uma Mulher, Mulheres, Aquarela Brasileira, Disritmia, Casa de Bamba, O Pequeno Burguês e dezenas de outras. Além de valorizar o samba-raiz, ele soube mesclar o ritmo com outras sonoridades, sempre com inspiração e categoria. Parabéns, mestre!

Seleção de Partido Alto– Martinho da Vila: