Por Fabian Chacur

No dia 7 de fevereiro de 1964, teve início uma verdadeira invasão aos EUA, protagonizada por quatro jovens oriundos da cidade britânica de Liverpool. A recepção oferecida a eles no aeroporto de Nova York era uma pequena prévia do que ocorreria no dia 9 daquele mesmo mês, quando a banda formada por eles- The Beatles-tocou ao vivo no The Ed Sullivan Show, uma espécie de Silvio Santos local.

Cinquenta anos depois, fica evidente a importância dessa primeira visita dos Fab Four aos EUA. Durante duas semanas, o grupo conseguiu consolidar sua presença nas paradas de sucesso americanas, tornando-se o primeiro nome britânico a emplacar discos nos primeiros lugares dos charts de lá. Melhor ainda: tornaram-se um verdadeiro culto, abrindo as portas para outros conterrâneos.

No início, o empresário da banda, Brian Epstein, teve de superar o pouco interesse inicial da gravadora Capitol, subsidiária da EMI/Parlophone britânica no mercado ianque. Em 1963, o pequeno selo Vee Jay foi quem lançou alguns títulos do quarteto, sem grande sucesso. Mas no final daquele ano, a Capitol resolveu arriscar ao ouvir o espetacular single I Want To Hold Your Hand. Belo gesto, como ficaria claro pouco tempo depois.

Como forma de melhor divulgar os Beatles no mercado americano, Epstein viabilizou uma turnê promocional de duas semanas por lá, com direito a apresentações no Ed Sullivan Show. A expectativa era positiva, mas ninguém iria imaginar que mais de 70 milhões de pessoas iriam ver aquele primeiro programa, no dia 9 de fevereiro de 1964, quando I Want To Hold Your Hand já ocupava o primeiro posto entre os singles mais vendidos por lá.

Aquela primeira transmissão que teve como sede Nova York seria seguida por outras em Miami, por um show em Washington e também por diversas entrevistas para emissoras de rádio e TV. Na rádio, o grande embaixador da beatlemania seria o badalado DJ Murray The K, que se tornou amigo deles e também teve sua audiência alavancada por participações exclusivas dos roqueiros em seus programas.

Pautados em cima da hora pela britânica TV Granada, os irmãos americanos Albert e David Maysles seguiram a banda desde a sua chegada aos EUA. O que inicialmente era para ser apenas um registro para a televisão acabou virando um documentário pilotado pelos Maysles, nos quais é possível mergulhar na intimidade dos quatro jovens músicos naquele seu momento decisivo em termos de popularidade.

A entrevista coletiva concedida pelos Beatles no aeroporto em Nova York é um claro flagrante de como os jornalistas de então não tinham a menor ideia do que estava acontecendo, ao fazer perguntas imbecis do tipo “vocês usam perucas?” ou “vocês são carecas?”. A sorte é que o refinado humor britânico dos quatro sempre oferecia respostas muito melhores do que se poderia esperar em função das questões idiotas que lhes eram oferecidas.

Ver cenas do único show feito por eles para o público em geral nessa visita, em Washington, é no mínimo curioso. Em um ginásio preparado para lutas de boxe e competições do gênero, os Beatles tinham de mudar sua disposição no palco a cada nova música, para que cada setor do público pudesse vê-los de frente por algum tempo. Três amplificadores e dois microfones eram o seu “arsenal” técnico para serem ouvidos em meio a uma gritaria ensurdecedora dos fãs.

Ao voltarem para a Inglaterra no dia 21 de fevereiro, John, Paul, George e Ringo estavam cientes de que uma importantíssima batalha estava ganha por eles. O sucesso avassalador no mercado americano ecoou pelo resto do mundo, que rapidamente vestiu a camisa dos garotos de Liverpool e os transformou em um dos maiores fenômenos de popularidade de todos os tempos. Provavelmente o maior.

Disponível em DVD com direito a quase uma hora de extras, o documentário The First U.S. Visit é a melhor forma de se ver como foi essa impressionante invasão em uma era na qual os recursos de divulgação eram infinitamente menores do que nos dias que se sucederam, sem internet, celulares, redes de TV poderosas e departamentos de marketing repletos de ferramentas promocionais a seu dispor.

Lógico que nada disso seria possível se não fosse o incrível talento e capacidade de trabalho dos Fab Four, que embora muito jovens já estavam na estrada há uns bons anos naquele momento. Quando essa chance de conquistar o mercado ianque chegou, eles estavam muito bem preparados para isso, além de contarem com um repertório repleto de músicas capazes de mantê-los no topo.

Última nota: o selo brasileiro Jam Records lançou em 2013 o CD The Beatles Live In Washington 1964, com belíssima apresentação visual e nove faixas que teriam sido gravadas ao vivo naquele show histórico em Washington.

As músicas são: Roll Over Beethoven, From Me To You, I Saw Her Standing There, I Wanna Be Your Man, Please Please Me, ‘Til There Was You, She Loves You e uma última, intitulada Beatle Beat, que é instrumental e não tem nada a ver com Beatles, certamente gravada por algum grupo de estúdio anônimo. A qualidade de áudio não é lá uma maravilha, mas pelos R$ 10 que paguei nas Lojas Americanas, está de bom tamanho e vai para a minha coleção.

Veja o making of de The U.S. First Visit: