Por Fabian Chacur

Nos últimos três segundos de Bom Selvagem, CD que gravou com a banda Pandemonium e lançado pelo selo independente Blues Time, Serguei solta uma frase básica e direta: o rock and roll não nasceu para ser perfeito. Mas, ironicamente, este é o trabalho mais próximo disso que o lendário cantor e compositor já conseguiu lançar em seus quase 50 anos de carreira.

Essa figura folclórica do rock brasileiro nasceu em 1933, ou seja, dois anos antes do que Elvis Presley e 22 anos antes do início do rock and roll enquanto fenômeno de massas com o estouro de Rock Around The Clock, com Bill Haley & His Comets. Ele viu a criança nascer, e ajudou a embalá-la no Brasil.

Sempre lembrado como o cara que namorou Janis Joplin, Serguei é o roqueiro em estado puro. Seu canto é rouco, frequentemente desafinado, gritado, mesmo. Mas com uma personalidade que supera toda e qualquer deficiência. Uma assinatura própria e forte.

Ironicamente, durante esses anos todos ele gravou muito pouco. Apenas alguns compactos (compilados em seminal coletânea lançada pelo genial Luis Carlos Calanca e sua Baratos Afins) e um pela BMG, com produção abaixo do que ele mereceria.

Bom Selvagem registra a reunião entre o Iggy Pop brasileiro e a banda carioca Pandemonium, há 18 anos na estrada e um sólido grupo de rock básico, com forte tempero de hard rock, punk e até eventuais elementos de ritmos brasileiros.

O time é integrado por André (vocal), Nilson Jr. (baixo e vocais), Alex Anjo (bateria e vocais) e Diego (guitarra). André assume o vocal principal de algumas canções, como as boas Marginal, Poder Paralelo e Eu Não Volto Mais, e mostra voz potente e muita personalidade.

Alpha Centauro, dueto de André e Serguei, tem levada misturando samba e hard rock a la Planet Hemp, enquanto Burro Cor de Rosa mostra Serguei encarando um balanço funk-hard a la Hendrix.

Rolava Bethânia é releitura da inacreditável versão feita por Tavinho Paes para o clássico de Chuck Berry Roll Over Beethoven e é para dançar e morrer de rir, assim como as hilariantes Rock do Pai, Ouriço e Tô Na Lona.

E tem também uma releitura bem básica de Sweet Home Chicago, de Robert Johnson, com direito a solo de gaita e tudo, prova de que Serguei sempre soube beber da fonte do pai do rock, jazz, soul etc (e tome etc!).

No geral, Bom Selvagem é a prova de que, sim, Serguei é muito mais do que apenas uma curiosidade do passado, com muito pique, raça e imperfeição da melhor qualidade. Não é para quem curte elaboração, rock progressivo e coisas assim. Mas se o seu negócio é diversão e sujeira sonora, vale a aposta.