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Por Fabian Chacur

Neste domingo (3), um trágico acidente de avião completará 60 anos. Naquele doloroso 3 de fevereiro de 1959, perderam precocemente suas vidas três astros ascendentes do rock and roll, Buddy Holly, Ritchie Valens e The Big Bopper. Uma data tão trágica que foi rotulada como “O Dia Em Que a Música Morreu” em um trecho da música American Pie, do cantor e compositor americano Don McLean e grande hit em 1972. E esses três artistas nos deixaram uma bela e eterna herança musical.

Em 1959, o rock and roll vivia a sua primeira era de sucesso. Como forma de divulgar seus trabalhos, os artistas do gênero eram unidos em verdadeiras caravanas que saíam pelos EUA. Os shows equivaliam a uma coletânea dos grandes sucessos radiofônicos de então, com os músicos geralmente interpretando apenas algumas músicas cada um. E era exatamente o que o nosso trio fazia, em uma série de shows iniciada em 23 de janeiro daquele ano e intitulada The Winter Dance Tour. Estavam programadas 24 datas em pleno inverno de lá, com a última apresentação agendada para o dia 15 de fevereiro.

O transporte dos músicos era feito através de ônibus, e as condições de tempo adversas provocaram cancelamento de shows e também exigiram muito da saúde de seus integrantes. Após a 11ª apresentação, realizada na cidade de Salt Lake, no estado de Iowa, Buddy Holly demonstrava fortes sinais de gripe. Como era o músico de maior sucesso da trupe, resolveu fazer uma extravagância, como forma de chegar mais cedo à próxima cidade da programação e poder descansar um pouco mais: alugar um pequeno avião para levar ele e dois de seus músicos, livrando-os de mais uma viagem com o desconfortável ônibus.

O voo foi contratado na noite do dia 2 de fevereiro, e um piloto, Roger Peterson, foi arregimentado às pressas. Estavam escalados para a viagem no avião de quatro lugares (contando o piloto) Holly, o guitarrista Tommy Allsup (1931-2017) e o baixista Waylon Jennings (1937-2002). No entanto, quando soube da iniciativa do colega de turnê, o cantor, DJ e músico The Big Bopper negociou com Jennings a sua vaga, e foi bem-sucedido. O mesmo ocorreu com Ritchie Valens em relação a Allsup. Que trocas…

O avião saiu no início da madrugada do dia 3 de fevereiro de 1959, mas uma inesperada tempestade de neve os surpreendeu. Infelizmente, a aeronave caiu quatro minutos após levantar voo. Demoraram horas até que todos se dessem conta do ocorrido. Os colegas de turnê, ao chegarem à cidade de Moorhead, no estado de Minnesota, surpreenderam-se ao não encontrar os amigos. E, posteriormente, o acidente e suas vítimas virou notícia em termos mundiais. Uma das primeiras tragédias envolvendo o rock and roll, o acidente comoveu o mundo e marcou a história da música.

Se hoje artistas são esquecidos poucos meses após suas mortes, porque estamos lembrando de Buddy Holly, Ritchie Valens e The Big Bopper seis décadas após suas partidas? A resposta é óbvia: independente do choque devido a mortes em idades tão precoces, o legado musical que esses três artistas nos deixaram são grandes demais para serem esquecidos ou igorados. Vamos dar uma pequena mergulhada na trajetória deles, e justificar essa importância toda.

Buddy Holly: genial, criativo e muito influente

Em toda a lista dos artistas mais importantes e influentes da história do rock, Buddy Holly merece um lugar cativo. E não é por acaso. Este cantor, compositor e guitarrista nascido em 7 de setembro de 1936 em Lubbock, Texas, equivale a uma espécie de elo perdido entre o rock and roll inicial de Chuck Berry, Little Richard e Jerry Lee Lewis e o som dos Beatles. Ele soube como poucos mesclar elementos da música country e do hillbilly com o rhythm and blues, investindo em elementos melódicos mais intensos e flertes com o jazz, música erudita e os standards da música americana.

Pode-se dizer que o formato clássico das bandas de rock and roll, o célebre duas-guitarras-baixo-e-bateria, teve em Holly um de seus criadores. Ele partiu do rockabilly e do rhythm and blues para criar canções ora agitadas, ora puramente românticas, sempre ressaltando seu som cristalino de guitarra, sua belíssima voz e um carisma nerd no qual os óculos de aro preto eram uma assinatura própria que inspiraria artistas como Elvis Costello, só para citar um deles.

E ele fez tudo isso em um curtíssimo espaço de tempo. Holly começou a tocar aos 13 anos, e se embrenhou em estúdios de gravação entre 1954 e 1959. Sempre inquieto, buscava evoluir a cada nova experiência, e teve a ajuda em um período clássico de sua trajetória do produtor e parceiro em algumas canções Norman Petty, que em seu estúdio situado em Clóvis, Novo México, expandia sonoridades e ressaltava os sons das guitarras, vocais e percussão.

O songbook de Buddy Holly é simplesmente matador, incluindo entre outras maravilhas as fulminantes That’l Be The Day, Oh Boy, Not Fade Away, Everyday, We’ll All Right, True Love Ways, Peggy Sue, Think It Over, Rave On, Maybe Baby e Heartbeat, só para citar algumas. O cara também sabia reler composições alheias com maestria, entre as quais It Doesn’t Matter Anymore, Brown Eyed Handsome Man e Raining In My Heart. E isso tudo em apenas 22 anos de vida.

Ritchie Valens, o pioneiro do rock latino

Lógico que o tamanho de Buddy Holly em termos artístico se sobrepõe a boa parte de seus colegas de profissão, e isso não é diferente em relação aos parceiros da Winter Dance Party. O que, obviamente, não significa que esses caras não sejam muito importantes. Ritchie Valens, nascido em 13 de maio de 1941, pode ser considerado um dos pioneiros, se não for O pioneiro, da mistura da música latina com o rock and roll. Uma mistura que nos traria Triny Lopez, Carlos Santana e tantos outros.

O ainda adolescente emplacou hits como Come On, Let’s Go e Donna, esta última uma belíssima badalada em homenagem à sua namorada. Mas seu maior mérito foi aproveitar um tema da música folclórica mexicana, La Bamba, e tê-lo adaptado para o universo do rock and roll. Ele precisou superar restrições até de sua gravadora para registrá-la, mas provou estar certo, no fim das contas.

O arranjo roqueiro de La Bamba acabou fazendo ainda mais sucesso posteriormente nas gravações de artistas de origem latina como Trini Lopes e o grupo Los Lobos, este último relendo os hits de Ritchie em 1987 para a trilha sonora do filme de incrível sucesso sobre sua trajetória, o cativante La Bamba. Que adolescente do barulho esse aí!

The Big Bopper, o DJ que virou cantor de sucesso

Jiles Perry Richardson, nascido em 24 de outubro de 1930, foi provavelmente o primeiro DJ de rádio a também fazer sucesso como cantor e compositor. Carismático, ele conseguiu quebrar um recorde de permanência consecutiva no ar, durante incríveis cinco dias, duas horas e oito minutos. Em 1958, chegou ao sexto lugar na parada americana com a divertida Chantilly Lace, que tinha como bordão o inconfundível “hello, babe!!!”, sua marca registrada.

Difícil não se lembrar do inesquecível Kid Vinil, tal qual o Big Bopper um DJ de rádio que também estourou nas paradas de sucesso como cantor do grupo Magazine. JP Richard teria outro grande hit, mas como compositor. Trata-se da música Running Bear, que na voz de Johnny Preston chegou ao primeiro lugar na parada de singles americana em janeiro de 1960. Infelizmente, The Big Bopper (que participou da gravação) já havia partido quando isso ocorreu.

Pequenas curiosidades envolvendo esses três ícones do rock

***** O grupo americano Weezer fez sucesso nos anos 1990 com uma canção em homenagem ao autor de Peggy Sue intitulada Buddy Holly. Seu vocalista Rivers Cuomo, não por acaso tem visual nerd e usa os indefectíveis óculos de aro preto sempre ligados ao saudoso astro do rock dos anos 1950.

***** Jay P. Richard Jr. nasceu no dia 28 de abril de 1959, ou seja, menos de três meses após a morte do pai, The Big Booper. Se não teve a bênção de conhece-lo, ao menos ajudou a manter sua obra reconhecida ao se apresentar em shows e convenções temáticas sobre o rock and roll dos anos 1950. Jr. infelizmente nos deixou em agosto de 2013, aos 54 anos de idade.

***** Logo após a morte de Buddy Holly, foi lançado um primeiro single póstumo, com a musica It Doesn’t Matter Anymore. A ironia involuntária do título (cuja tradução aproximada é “não importa mais”) levou o seu autor, Paul Anka, então começando a se tornar uma lenda da música pop, a doar os direitos autorais da canção à viúva de Holly.

***** A interpretação do ator Lou Diamond Phillips para o papel de Ritchie Valens em La Bamba (1987) foi tão icônica que eclipsou tudo o que ele fez posteriormente. Difícil alguém não se referir a ele como “o ator de La Bamba“.

***** Se no rock The Big Bopper pode ser considerado pioneiro nessa de ser DJ e cantor de sucesso, no mundo do blues existe alguém muito mais famoso que também fez essa transição. Trata-se de ninguém menos do que o genial B.B. King, que inclusive ganhou o apelido nos tempos em que trabalhava em rádio.

****** Paul McCartney era tão fã de Buddy Holly que acabou unindo o útil ao agradável nos anos 1970, adquirindo os direitos autorais da maior parte das músicas do autor de Peggy Sue. Ele participou de eventos em homenagens ao artista e também gravou com remanescentes dos Crickets, o grupo que acompanhou o artista. Os Beatles gravaram um dos grandes hits de Buddy Holly, Words Of Love, em releitura que reproduz quase nota a nota a versão original.

***** Os Rolling Stones também eram fãs de Buddy Holly, e regravaram nos anos 1960 Not Fade Away com bastante sucesso. Eles chegaram a abrir shows deles no Brasil com essa música, nos anos 1990.

Veja uma reportam da revista Mojo sobre “o dia em que a música morreu” aqui

We’ll All Right– Buddy Holly: