imojis 400x

Por Fabian Chacur

Há algumas semanas, posts de influencers digitais da chamada geração Z, que de forma geral encampa os nascidos mais ou menos entre 1995 e 2010, resolveram apontar aquilo que acham constrangedor nos costumes da geração imediatamente anterior à sua, a denominada millenial ou Y, com os nascidos entre 1980 e 1994. Para rotular essa turma dos costumes “constrangedores”, buscaram um termo em inglês: cringe. Pronto. Surgia uma polêmica que certamente será uma das mais intensas deste ano de 2021. E que vale uns comentários genéricos por aqui.

Para os atuais adolescentes e jovens adultos, seus “irmãos mais velhos” causam vergonha alheia por curtir itens como calças skinny, sapatilhas, emojis de sorriso, rsrs para representar risadas, a série televisiva Friends, o rock grunge, falar boletos para se referir a contas, litrões de cerveja e até mesmo tomar café da manhã. Valendo-se de outro termo popularizado recentemente, podemos deduzir que eles acham que tais costumes deveriam ser “cancelados”.

Ora, o que um cara que está em vias de completar 60 anos de idade como eu tem a ver com isso, perguntaria você? E a resposta é essa: como é divertido ver a forma que os comportamentos humanos se repetem, em novos formatos, mas basicamente com as mesmas características, no decorrer das décadas.

O início dessa coisa do “conflito de gerações” de certa forma teve início na década de 1950, com o advento da TV e também da expansão de meios de comunicação como o cinema e o rádio. Os nascidos na década de 1940, apelidados de baby boomers, foram provavelmente os primeiros a buscar ídolos próprios e a desafiar de forma mais incisiva os costumes de seus pais e parentes. A geração do rock and roll inicial é o marco dessa conversa aqui.

Esse comportamento se reforçaria nos anos 1960 com o advento dos Beatles, Rolling Stones, geração paz e amor, psicodelia e por aí vai. Esse cenário, no aspecto musical, tomaria novos rumos a partir do momento em que os conflitos mudaram de setor. Do imbroglio entre pais e filhos, vamos para o de irmãos mais novos com os irmãos mais velhos. E isso ocorre nos idos de 1976.

Sim, você já adivinhou. O ponto de virada é o surgimento do punk rock, uma reação agressiva e despojada contra a fase que o rock vivia naqueles tempos, com o rock progressivo e o heavy metal sendo considerados por alguns como um afastamento das origens do rock and roll original, dando ao gênero uma conotação mais sofisticada e de certa forma elitista e distanciada do público sem dinheiro para pagar ingressos caros de shows. Nas brigas entre punks e progressivos-headbangers surgia a essência dessa coisa de cringe.

Nos anos 1980, como uma espécie de desenvolvimento lógico do punk, surgia a new wave, propondo roupas coloridas, cabelos mais curtos e com cortes espetados e no formato mullets como contraponto aos cabelos compridos e barbas da década anterior. Desde então, os conflitos entre as gerações que se alternam nos holofotes da mídia em geral geram novas trocas de posições entre o que é “in” e o que é “out”.

Esses duelos geracionais são essenciais para a manutenção das indústrias ligadas aos jovens, especialmente as da música e da moda. Aliás, aquela mudança iniciada na década de 1950 tinha muito a ver com o surgimento, pela primeira vez, de um setor de comércio dedicado especialmente à chamada juventude, que deixava de se vestir e de curtir as músicas dos adultos, buscando seus próprios objetos de consumo, ídolos e sonhos.

Como as ideias não são inesgotáveis, o que ocorre com uma certa frequência é o cancelamento e o, digamos, “descancelamento” dos costumes conforma a conveniência do dia. Os cabelos com estilo mullet dos anos 1980 popularizados por cantores como Bono (U2) foram totalmente ridicularizados a partir dos anos 1990, mas reapareceram recentemente no visual de cantoras como Miley Cyrus, por exemplo.

O punk já foi oposição e virou moda. O visual hippie foi tido como “visual bicho grilo” de forma pejorativa a partir dos anos 1980, mas voltou com tudo anos depois. A disco music foi execrada por muitos a partir do início dos anos 1980, mas teve sua reabilitação a partir de meados dos 1990. Admitir ser fã do grupo sueco Abba era atestado de suicídio para quem queria ser respeitado na cena musical durante a década de 1980, e hoje é sinal de bom gosto. E por aí vai.

Ser cringe é basicamente não estar nos holofotes da moda atual, seja ela qual for e em que setor for- música, roupas, cinema, TV etc. Algo obviamente intensificado ao máximo pela rapidez da era da internet. Ou seja, a garotada que hoje, no auge de sua juventude, cai na gargalhada kkkk para ironizar seus irmãos mais velhos não perde por esperar o dia de se tornarem eles próprios os cringes da próxima geração, obviamente com o surgimento de um novo termo pejorativo-preconceituoso para denominá-los. E assim a vida segue.

Agora é Moda– Rita Lee: