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Kenny Rogers, embaixador da country music e um astro pop

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Por Fabian Chacur

Um verdadeiro embaixador mundial da country music. Eis uma definição possível para o cantor, músico e eventual compositor Kenny Rogers, que nos deixou na noite desta sexta-feira (20) por causas naturais, conforme comunicado de sua família. Em uma carreira que teve início na segunda metade dos anos 1950 e se manteve até 2018, o astro americano nos deixou uma obra repleta de hits e na qual sempre demonstrou uma inquietude, acrescentando elementos sonoros diversos à música country.

Kenneth Ray Rogers nasceu em Houston, Texas, no dia 21 de agosto de 1938, e demonstrou interesse pela música logo aos quatro anos de idade, quando cantava em troca de moedas. Seu primeiro single solo, That Crazy Feeling, saiu em 1958, mas foi como integrante do grupo de jazz Bobby Doyle Three, no qual cantava e tocava baixo, que ele se destacou inicialmente. Em 1966, entrou no grupo folk New Christy Minstrels, também como baixista e vocalista, e não demorou para ver que, ali, não conseguiria dar vasão à sua criatividade.

Junto com outros integrantes do NCM, ele em 1967 lançou sua própria banda, The First Edition (depois renomeada como Kenny Rogers & The First Edition). E o primeiro hit veio em 1968 com o contundente single Just Dropped In (To See What Condition My Condition Is), um belo rock com pitadas psicodélicas que atingiu o posto de nº 5 na parada americana. Outro rock na mesma linha, Something’s Burning, ajudou a impulsioná-los.

Embora o grupo fizesse boas vocalizações e tivesse muita competência, era Rogers quem ficava com os holofotes, tocando baixo e cantando os principais hits, que também incluem canções de acento country como Ruby (Don’t Take Your Love To Town) e Reuben James. Nessa época, o cantor foi generoso a ponto de ter sido o mentor de um certo cantor, compositor e baterista de nome Don Henley, então um jovem desconhecido em busca de reconhecimento, que viria a partir de 1972 como integrante dos Eagles.

No final de 1975, para tristeza de Kenny, o The First Edition decidiu encerrar sua trajetória, tornando inevitável para ele encarar de uma vez por todas o desafio de uma carreira-solo. Desta vez mais próximo da música country, estourou em 1977 nesse mercado com a canção Lucille, e até o fim daquela década emplacou diversos outros hits, entre os quais The Gambler (que inspirou uma série de filmes de TV estrelados por ele) e Coward Of The County.

Foram as baladas românticas que o levaram a conquistar o público do mainstream, como She Believes In Me e You Decorated My Life. Em 1980, ele se sentiu repetitivo, e resolveu tentar uma nova experiência. “Nos anos 1960, Ray Charles gravou álbuns nos quais releu canções country com um acento soul; pensei, então, que seria uma boa ideia fazer o contrário, e convidei Lionel Richie para compor algo para mim”, relembrou o astro em entrevista contida no documentário The Journey, de 2006.

A parceria rendeu Lady, canção que atingiu o número 1 da parada americana no formato single e impulsionou o álbum na qual foi incluída, Greatest Hits (1980), a conseguir a mesma façanha. O ex-líder dos Commodores também produziria um álbum completo para o cantor americano, Share Your Love (1981), que atingiu o sexto posto na parada ianque.

Outra parceria bacana fora do universo country ocorreu com os Bee Gees. Barry Gibb foi o produtor de seu álbum Eyes That Seen In The Dark (1983), com direito à participação da banda. O disco gerou hits bacanas como You And I, This Woman e Islands Is The Stream, e atingiu o sexto posto nos EUA. Esta última, dueto com Dolly Parton, o levou de novo ao número 1 em sua terra natal.

Aliás, vale destacar a capacidade dele em gravar belos duetos com cantoras. A escocesa Sheena Easton, por exemplo, marca presença em We’ve Got Tonight (1983), matadora releitura de balada do roqueiro Bob Seger que atingiu o 6º posto nos EUA. Kim Carnes, que como ele também integrou os New Christ Minstrels, gravou com ele Don’t Fall In Love With a Dreamer (1980) e What About Me (1984, também inclui o cantor de r&b James Ingram).

Com a cantora country Dottie West a coisa foi ainda além, pois eles gravaram dois álbuns juntos, Every Time Two Fools Collide (1978) e Classics (1979). Ele repetiria a dose com Dolly Parton em Love Is Strange (1990, hit original de Mickey & Sylvia e regravado por Wings e muitos outros) e You Can’t Make Old Friends (2013). E ele gravou com a maravilhosa Gladys Knight em 1990 a música If I Knew Then What I Know Now.

Sempre inquieto, Kenny tem outros encontros bacanas em seu currículo. Seu álbum The Heart Of The Matter (1985), o último que emplacou no topo da parada country americana, teve produção do lendário George Martin, que produziu uma certa banda de Liverpool. Timepiece (1984) traz a releitura de standards da música americana e acompanhamento orquestral, com produção a cargo do consagrado David Foster.

Kenny Rogers se apresentou no Brasil em janeiro de 1991, no mesmo período em que estava sendo realizado o Rock in Rio, e por estar cobrindo o festival eu não tive a oportunidade de entrevistá-lo, nem de ver seu show em São Paulo.

Em 2006, ele lançou o álbum Waters & Bridges, que o colocou novamente nos primeiros postos da parada americana com hits como The Last Ten Years, I Can’t Unlove You e Calling Me, esta última um dueto com o discípulo Don Henley.

E já que falamos em Brasil há pouco, vale lembrar que I Can’t Unlove You (que o trouxe de volta ao top 20 americano) teve versão em português, Eu Não Sei Dizer Que Eu Não Te Amo, na qual a dupla Edson & Hudson conta com a participação (cantando em inglês) do próprio Kenny.

Os dois últimos álbuns de estúdio de Kenny foram You Can’t Make Old Friends (2013, de material inédito) e Once Again It’s Christmas (2015, álbum natalino, um dos vários que gravou em sua carreira). Em 2016, ele deu início à sua última turnê, intitulada The Gambler’s Last Deal, cujas última datas foram canceladas em abril de 2018 devido a problemas com sua saúde.

O último show dele em Nashville ocorreu em 25 de outubro de 2017, e não poderia ter sido melhor, pois contou com inúmeras participações especiais, incluindo as de Lionel Richie, Travis Tritt, The Judds, Kris Kristofferson, Alison Krauss, Lady Antebelum, Crystal Gayle, Reba McEntire e Dolly Parton.

A voz de Kenny Rogers é uma das mais facilmente reconhecíveis no universo da música pop, e a forma como ele interpretou as músicas que gravou sempre foi de forma muito personalizada e emotiva.

De quebra, seu carisma nos palcos explica o porque ele conseguiu se tornar um astro de proporções mundiais, vendendo milhões de discos e lotando ginásios e casas de shows pelos quatro cantos do planeta.

No já citado documentário The Journey (que saiu em DVD no Brasil via Coqueiro Verde Records), Kenny fez uma espécie de definição de como encarou sua incrível e bem-sucedida trajetória artística:

“Minha mãe me deixou como herança vários pensamentos simples, mas muito interessantes. Um deles fala sobre como é importante você curtir cada momento que vive, mas sem nunca se conformar ou se acomodar. Seria a receita da felicidade, para ela. E posso dizer que, durante a minha carreira, curti cada momento que vivi, mas nunca me conformei ou me acomodei, sempre buscando novos rumos”.

We’ve Got Tonight (live)- Kenny Rogers & Sheena Easton (uma das musicas favoritas da minha saudosa mãe Victoria, a quem dedico este post):

Nat King Cole, doçura e talento que conquistaram o mundo

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Por Fabian Chacur

Minha saudosa mãe Victoria amava a música, e tinha um gosto bem diversificado. Entre os artistas que mais curtia, figurava o saudoso compositor e músico americano Nat King Cole. Não foram poucas as vezes em que o LP Cole Español (1958) virava a trilha sonora daquela casa situada na Vila Mariana, nos anos 1960 e 1970. Uma das músicas, particularmente, conquistou-me para a vida, a deliciosa Cachito. Com o decorrer dos anos, vi que aquilo era apenas a ponta de um iceberg musical daquele artista, que se estivesse entre nós estaria completando 100 anos de idade neste domingo (17). Um sujeito realmente unforgettable.

Como forma de celebrar essa data, peguei na minha videoteca e revi o excelente documentário The World Of Nat King Cole, lançado em DVD em 2005 e altamente recomendável. Nathaniel Adams Coles nasceu em Montgomery, Alabama, no dia 17 de março de 1919. Quando o garoto completou quatro anos, sua família resolveu se mudar para Chicago, com a esperança de buscar dias melhores, além de fugir do forte racismo daquele estado americano. Uma atitude que se mostrou certeira para o futuro dele.

Com apenas 16 anos, Nat já era um elogiado pianista, em no fim dos anos 1930 já liderar seu grupo. Aliás, a formação de seu King Cole Trio se mostrou revolucionária, pois trazia ele no piano e voz, um baixista e um guitarrista. Ou seja, sem bateria. Quando a música americana vivia o auge das big bands, em plena Segunda Guerra Mundial, ele teve seu primeiro hit, Straighten Up And Fly Right, mesma época em que iniciou sua parceria com a Capitol Records.

O repertório de Cole no início investia no jazz, com bons espaços para a parte instrumental. Com o tempo, no entanto, sua bela voz e o estouro de baladas românticas como Nature Boy (1947), Monalisa (1950), Unforgettable (1951) e Too Young (1951) o levaram a priorizar o canto, o que levou ao fim do trio. Ele vendeu tantos discos que a gravadora Capitol construiu um novo prédio, imenso, em Los Angeles, para abrigar sua nova sede. O prédio recebeu o apelido de “The House That Nat Build” (a casa que Nat construiu). E não há exageros aqui, foi exatamente isso o que ocorreu.

Com seus ternos elegantes e estilosos, sua simpatia e uma voz de timbre doce e envolvente, acompanhada por caprichados arranjos orquestrais, Nat King Cole atravessou a década de 1950 como um dos maiores astros da música. Isso, mesmo tendo de enfrentar o racismo no seu país natal em várias ocasiões, como a rejeição que sofreu dos seus vizinhos endinheirados e racistas em um bairro nobre nos arredores de Los Angeles, ou quando foi atacado no palco durante um show em Birmingham, Alabama, em 1956.

Entre 1956 e 1957, tornou-se o primeiro apresentador negro de um programa na TV americana. Apesar dos ótimos índices de audiência e dos convidados bacanas que recebia, não conseguiu ficar no ar por mais de um ano. A razão: falta de patrocinadores que tivessem a coragem de superar as reações racistas que a atração atraiu em alguns estados americanos, especialmente os do sul, que não admitiam um negro em posto tão nobre. Algo absolutamente lamentável. Mas ele, mesmo magoado, levantou a cabeça e seguiu adiante.

Com suas canções começando a perder a disputa nas paradas de sucesso para o então emergente rock and roll, Nat diversificou sua área de atuação, e começou a fazer shows no exterior, além de gravar em outras línguas. Tal estratégia deu super certo, e lhe valeu muitos discos vendidos e turnês pela Europa, América Latina e Central, Ásia etc. Fumante inveterado (fumava em torno de três maços por dia), Cole foi vítima de câncer e nos deixou em 15 de fevereiro de 1965, com apenas 45 anos. Mas deixou uma obra deliciosa, que permanece cativando ouvidos e corações de diversas gerações e inspirando novos músicos e cantores.

Nat King Cole em curiosidades diversas

*** Os discos que Nat gravou em outras línguas, especialmente espanhol, não são provas de um sujeito multilíngue. Na verdade, ele fazia uma leitura fonética para gravar as músicas, o que gerava um sotaque particularmente curioso. Sua voz, no entanto, era tão boa que mesmo dessa forma levemente caricata ele conseguiu cativar os fãs, especialmente pelo fato de dar uma demonstração de carinho para seus admiradores de fora dos EUA ao cantar em seus idiomas, incluindo japonês!

*** Embora amável, educado e polido, Nat era tido como mulherengo. Foi casado por 12 anos com Nadine Robinson, e ainda estava legalmente comprometido com ela quando começou a sair com Maria Hawkins (que cantou nas orquestras de Duke Ellington e Count Basie), em 1948, mesmo ano em que contraíram matrimônio. Maria resistiu a algumas “puladas de cerca” do marido, incluindo algumas com a cantora e atriz Eartha Kitt, mas foi em seus braços que Nat passou suas última semanas. Eles tiveram cinco filhos.

*** Natalie Cole (1950-2015) seguiu os passos do pai e fez muito sucesso em sua carreira como cantora a partir dos anos 1970, vendendo milhões de discos e faturando um total de nove troféus Grammy, incluindo o de artista revelação. Em 1991, ela trouxe a obra de Nat de volta às paradas de sucesso com força total, graças ao álbum Unforgettable…With Love, que vendeu milhões de cópias e trouxe como destaque um dueto entre pai e filha viabilizado pela tecnologia. Nem é preciso dizer que minha mãe AMOU esse disco, que gravei para ela em fita cassete.

*** Nat esteve no Brasil em abril de 1959, quando fez um total de oito shows, nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, além de participar de programas de TV, entrevistas e até de um almoço com o presidente Juscelino Kubitscheck. Ele também aproveitou a viagem para gravar por aqui faixas que entrariam no álbum A Mis Amigos, lançado naquele mesmo ano e incluindo gravações em espanhol e português, entre as quais Não Tenho Lágrimas e Suas Mãos.

*** Mais duas curiosidades envolvendo Cole e o Brasil. Em seu último álbum, L-O-V-E (1965), lançado pouco antes de sua morte, ele releu The Girl From Ipanema, de Tom Jobim, em versão bem elegante. Não seria de se estranhar um álbum totalmente de bossa nova, se ele continuasse entre nós. E no documentário The World Of Nat King Cole, temos cenas de sua chegada ao Brasil, provavelmente no Rio, quando podem ser vistos diversos cartazes com os dizeres “Biscoitos Aymoré (uma marca bem popular por aqui na época e uma das patrocinadores da turnê) welcomes Nat King Cole”.

*** O intérprete de When I Fall In Love nunca se mostrou um fã muito grande de rock and roll, de certa forma o ritmo que ajudou a tirá-lo do topo das paradas de sucesso. Mas algumas de suas gravações dos anos 1940 com o King Cole Trio são consideradas inspiração para o rock, especialmente (Get Your Kicks On) Route 66, composição de Bobby Troup lançada pelo trio em 1946. Muita gente a regravou posteriormente, incluindo uma releitura fantástica dos Rolling Stones em seu álbum de estreia (ouça aqui).

*** Alguns jazzistas mais puristas repudiam as gravações mais românticas de Nat King Cole, preferindo suas performances com o trio nos anos 1940. O mesmo ocorreria com George Benson, fã incondicional de Cole que iniciou sua carreira no jazz e depois também investiria fortemente em canções com vocais e pegada pop. A primeira conexão entre eles ocorreu quando Benson regravou em 1977 um grande sucesso de Cole, Nature Boy, e se cristalizaria em 2013 com o álbum Inspiration- A Tribute To Nat King Cole.

Cachito– Nat King Cole:

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