Por Fabian Chacur

Há algumas semanas, a distribuidora ST2 lançou no Brasil o DVD Miles From Memphis Live At The Pantages Theatre, da cantora americana Sheryl Crow.Tomei um susto, pois se tratava do registro de um show de divulgação de um CD que eu desconhecia.

Acompanho a carreira dessa talentosa cantora, compositora e guitarrista desde que seu primeiro álbum, Tuesday Night Music Club saiu no Brasil, em 1994. Desde então, todos os seus discos de carreira saíram por aqui.

Fui conferir e 100 Miles From Memphis (2010) não teve edição brasileira. A gravadora Universal Music, que detém os direitos sobre a discografia completa da moça, por alguma razão desconhecida deixou esse trabalho de fora de seu catálogo de lançamentos.

Um fato estranho especialmente se levarmos em conta que todos os outros saíram, e que a estrela do rock sempre teve boas vendas em nosso país, onde se apresentou ao vivo em 1995 e 2001. E esse trabalho atingiu o terceiro posto na parada americana, prova de que não se trata de um álbum fracassado ou coisa que o valha.

Curioso, fui atrás da versão importada de 100 Miles From Memphis, em belíssima embalagem digipack no melhor estilo capa de LP duplo de antigamente. Já me ganhou antes mesmo de ouvi-lo.

Mas o melhor ainda estava por vir. O mais recente trabalho de Sheryl partiu do seguinte conceito: repertório predominantemente composto por canções inéditas, todas inspiradas na sonoridade da soul music dos anos 60/70.

Ou seja, com direito a sessão afiada de metais, o duo baixo/bateria extremamente swingado, guitarras rítmicas bem acentuadas, vocais de apoio poderosos e melodias emotivas, cativantes e ora doces, ora agressivas.

O resultado não poderia ter sido melhor. Ao contrário da opção mais óbvia, que seria escolher clássicos daquele período e regravá-los pela culionésima vez, a roqueira preferiu tentar incorporar o espírito daquela era de ouro da black music em novas criações. E acertou no alvo.

Apenas três faixas são releituras, e curiosamente só uma se encaixa no perfil “classic soul”, e ainda assim como faixa bônus. Trata-se de I Want You Back, primeiro sucesso do Jackson Five, homenagem feita por Sheryl a Michael Jackson, de quem foi backing vocalista na turnê Bad, nos anos 80. Ficou de arrepiar.

As outras duas são a introspectiva balada blues Sideways, de Clarence Copeland Greenwood, e a contundente Sign Your Name, hit em 1987 com o autor, o revivalista da soul music Terence Trent D’Arby. Ambas ficaram ótimas, sendo que a segunda conta com participação de Justin Timberlake.

E já que o assunto é participação especial, Keith Richards toca guitarra e participa dos vocais de apoio da quase reggae Eye To Eye.

O álbum flui com elegância, sensibilidade e um repertório impecável, no qual destaco a fantástica Summer Day, com sua levada cool e envolvente, a folk soul Long Road Home, a swingada Say What You Want, a baladona Stop e a estupenda faixa título.

100 Miles From Memphis atingiu tal grau de excelência graças também aos músicos que tocaram nele, incluindo o brilhante guitarrista, cantor e compositor Doyle Bramhall II, que toca há muito tempo com Sheryl e é o coautor de diversas faixas deste CD.

Este disco, além de ser um dos melhores da excelente discografia de Sheryl Crow, é a prova concreta de que é possível pegar um estilo fortemente ligado a uma era específica e atualizá-lo sem cair na caricatura.

E já aproveito para cumprimentar de forma antecipada Sheryl Crow, que no dia 11 deste mês entrará para o time das cinquentonas, aparentando uns 20 anos a menos e artisticamente mais relevante do que nunca.

Veja o clipe de Summer Day, com Sheryl Crow: