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Por Fabian Chacur

Já vão longe os tempos em que me preocupava em resenhar um CD, DVD, Blu-ray ou coisa que o valha de forma rápida, tentando ser o primeiro crítico a publicar algo sobre determinado lançamento. Pouco me importa. O que realmente vale a pena é tentar fazer isso bem, seja quando for. E esse é precisamente o caso deste Concerto Para Pixinguinha, de Vânia Bastos e Marcos Paiva, que já ganhou inúmeros elogios na imprensa, e só chega a Mondo Pop agora.

Antes tarde do que nunca? Eu preferiria dizer “antes bem-feito do que nunca”. E chega de metalinguagem. Vamos ao que interessa, que é este CD, o primeiro lançamento de um novo selo, o Conexão Musical, criado pelo experiente produtor musical Fran Carlo, um cara que só mete a mão onde existe talento. A escolha para a abertura desse novo espaço para a nossa música não poderia ter sido mais feliz, e lógica, vide o envolvimento dele com Vânia nesses anos todos.

Desde que iniciou a sua carreira solo, na década de 1980, Vânia Bastos tem se pautado por uma trajetória na qual não abre mão de seus princípios em prol de eventuais resultados comerciais mais significativos. Nunca foi uma grande vendedora de discos, mas consolidou uma carreira brilhante em torno de belas escolhas de repertório, bom gosto ao escolher os músicos com os quais faz shows e grava e a utilização sempre cirúrgica de sua bela e suave voz.

Em sua discografia, temos alguns trabalhos dedicados a temas específicos como as obras de Tom Jobim e Caetano Veloso e da turma do Clube da Esquina. Desta vez, ela resolveu se debruçar sobre o songbook de um dos grandes ícones da música brasileira, o compositor, orquestrador, arranjador, flautista e saxofonista Pixinguinha (1897-1973), que se só tivesse assinado a maravilhosa Carinhoso já mereceria ser lembrado para sempre.

Ele, no entanto, nos deixou uma herança repleta de maravilhas do porte de Rosa, Isso é que é Viver, Lamentos e tantas outras, escritas com parceiros como Braguinha e Vinícius de Moraes. Integrou o lendário grupo Oito Batutas, o primeiro combo regional brasileiro a excursionar pela Europa, isso nos anos 1920. Ele também trabalhou com música para cinema e teatro e assinou arranjos para Carmen Miranda, por exemplo.

Para realizar essa homenagem, a cantora se uniu ao baixista, compositor e arranjador Marcos Paiva, que desenvolve um trabalho próprio na música instrumental e também já atuou com feras do porte de Bibi Ferreira, Zizi Possi, Teresa Salgueiro e Fernando Ferrer. Ele lidera o Marcos Paiva Quarteto, composto por César Roversi (sax, clarinete e flauta), Jônatas Sansão (bateria), Nelton Essi (vibrafone) e ele próprio no contrabaixo acústico, arranjos e direção musical.

A sonoridade apresentada em Concerto Para Pixinguinha é quase camerística, esbanjando delicadeza, bom gosto e o inteligente aproveitamento de cada integrante do time, Vânia obviamente incluída. Aliás, os diálogos entre voz e os instrumentos podem ser citados como alguns dos pontos altos do álbum, assim como o entrosamento da equipe, desenvolvido durante os inúmeros shows que fizeram previamente com este material, antes da ida ao estúdio para registra-lo.

A sequência das faixas flui de forma deliciosa, não comportando uma audição incidental, do tipo pano de fundo. É preciso sentar e se concentrar, pois se trata de música feita para envolver o ouvinte, de forma classuda e sem arestas. Uma boa sacada foi a inclusão de quatro temas instrumentais (Seu Lourenço no Vinho, Cochichando, Displicente e Recordações) intercalados entre nove faixas com vocais, representando o lado instrumental da criação de Pixinguinha. Prova da generosidade de Vânia, abrindo espaços para seus colegas brilharem. E ela brilha muito, também, em Rosa, Carinhoso, Isso é que é Viver e especialmente em Urubu Malandro, que encerra o disco com força total.

Concerto Para Pixinguinha é aquele tipo de lançamento feito para durar, e que serve como boa prova de que o formato álbum nunca irá se extinguir. Pelo menos, não enquanto existirem artistas como Vânia Bastos e Marcos Paiva, dispostos a oferecer ao público um produto de altíssima qualidade como este aqui, e a selos como o Conexão Musical, viabilizando essa tarefa e caprichando em embalagem e produção.

Carinhoso (ao vivo)- Vânia Bastos e Marcos Paiva: