florian schneider 2-400x

Por Fabian Chacur

Qualquer lista básica dos grupos mais influentes da história da música pop precisa incluir o Kraftwerk. Não dá para escapar. A banda alemã criada há 50 anos nos proporcionou uma discografia concisa e repleta de grandes momentos. Um de seus fundadores e figura chave para seu desenvolvimento, Florian Schneider, teve sua morte anunciada oficialmente nesta quarta-feira (6), embora o falecimento tenha de fato ocorrido poucos dias após ele completar 73 anos de idade (no dia 7 de abril). Ele foi vítima de um câncer aparentemente agressivo.

Tudo aconteceu quando Florian conheceu em 1968, em uma Academia de Artes alemã, seu parceiro de banda, Ralf Hutter. Dois anos depois, com algumas experiências musicais no currículo, criaram na cidade de Dusseldorf o Kraftwerk (usina de força, em alemão). Em seus três primeiros discos, fizeram experiências em busca de uma sonoridade própria, misturando instrumentos tradicionais com sintetizadores e efeitos eletrônicos.

A fórmula se materializou em seu quarto álbum, Autobahn (1974), que se tornou seu maior sucesso comercial nos EUA, onde chegou ao 5º posto. A faixa-título serviu como um bom cartão de apresentações do que pretendiam: uma sonoridade essencialmente eletrônica, repleta de timbres novos e efeitos construídos de forma sistemática e criativa, soando totalmente à parte do chamado krautrock alemão de então.

Em 1977, lançaram uma verdadeira obra-prima, o álbum Trans-Europe Express, cuja faixa-título equivale a uma trilha sonora para um hipotética e sensorial viagem de trem. Lançado em plena era da disco music, era um som que podia ser dançado ou ouvido no silêncio de sua casa, mas não sem causar uma total estranheza por parte dos apreciadores dos maiores hits da época.

The Man-Machine (1978) veio a seguir e provou que o novo universo sonoro proposto por Florian e Ralf tinha possibilidades ilimitadas, alimentadas pela criatividade do grupo e em especial pelo perfeccionismo de Florian, muito elogiado por seu parceiro nesse quesito.

Computer World (1981), outro trabalho incrível da banda, chegou às lojas quando já era público e notório o teor influencial de seu som. Ainda em 1977, David Bowie (que tentou em algumas ocasiões fazer parcerias com o grupo, sem conseguir) lançou em seu álbum Heroes, a faixa V-2 Schneider, evidente homenagem à banda e a Florian em particular.

Praticamente todos (para não dizer todos!) os grupos do chamado tecnopop tiveram o Kraftwerk como sua biblioteca sonora inicial. Depeche Mode, Human League, OMD, Ultravox, Human League, Erasure, Yazoo, a lista é longa, e ultrapassa aquele período específico, vide o Daft Punk, surgido nos anos 1990 e um evidente filhotinho de muito talento dos geniais músicos alemães.

Em uma associação para muitos improvável, Afrika Bambaataa And The Soul Sonic Force, pioneiros do rap e hip-hop, usaram em sua marcante Planet Rock (1982) trechos de Trans Europe Express e Numbers, sendo seguido por outros artistas desse universo e do r&b dos anos 1980.

Electric Cafe (1986) marcou o momento em que o grupo alemão veio para o mainstream, mesmo sem vender milhões de discos. A imprensa os colocava nas manchetes, embora Hutter e Schneider sempre tenham preferido ser lacônicos em entrevistas e se dedicar ao seu estúdio, o Kling Klang, que passou a ser levado para a estrada em seus shows, totalmente diferente dos da concorrência.

A partir daqui, a banda passou a gravar de forma extremamente esparsa, embora, curiosamente, tenha em alguns momentos intensificado seus shows pelo mundo, incluindo uma passagem marcante pelo Brasil em 1998 com direito a uma lacônica e hilariante (nesse sentido) entrevista para o canal a cabo Multishow de Florian (veja aqui).

Em novembro de 2006, Florian Schneider fez sua última aparição em um show do Kraftwerk. Sua saída do grupo que fundou só foi anunciada no final de 2008, e a partir dali, só Ralf Hutter permaneceu no time, ladeado por outros integrantes e basicamente só fazendo shows.

É óbvio que não foi o Kraftwerk quem inventou a música eletrônica, que já existia de forma experimental ao menos desde os anos 1950. Mas certamente foram eles, ao lado de nomes como o de Giorgio Moroder, que ajudaram a trazer aqueles novos recursos sonoros ao mundo da música pop, conseguindo ao mesmo tempo criar um trabalho consistente e criativo e também capaz de atingir as grandes massas. E o perfeccionismo de Florian se mostrou decisivo.

Outro aspecto interessante do trabalho do Kraftwerk é o fato de suas músicas terem sido utilizadas para a sonoplastia de inúmeros programas de rádio e TV no Brasil e no mundo. Por aqui, a música The Hall Of Mirrors, por exemplo, foi trilha sonora do comercial dos calçados Starsax, só para citar um exemplo bacana.

Trans Europe Express- Kraftwerk (ouça em streaming na íntegra):