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Por Fabian Chacur

Conheci Caetano Veloso pessoalmente em 1985, ao participar de uma entrevista coletiva concedida por ele à imprensa no hotel Maksoud Plaza. Entre as diversas perguntas feitas pelos jornalistas presentes, uma pedia a ele uma opinião sobre os grupos britânicos The Smiths e New Order, então extremamente badalados por aqui. E ele gastou alguns bons minutos para responder. Logo de cara, tive contato com uma das marcas registradas desse cantor, compositor e músico baiano, que completou 80 anos neste domingo (8).

Até os dias de hoje, a mídia parece sempre querer saber o que Caetano Veloso pensa sobre cada novidade musical que surge. Isso, para ficarmos na área abordada por Mondo Pop. Pois seus pitacos sobre política, moda, economia, cinema, TV etc (e tome etc) também são solicitados de forma constante. Isso, quando necessário, pois com frequência o próprio artista se antecipa e discorre sobre esses temas todos. Falar é com ele mesmo.

E é bom ressaltar que isso não ocorre por oportunismo dele. É de seu espírito ser assim, atento ao que acontece no Brasil e no mundo e afim de interagir e tentar entender o mundo em suas eternas mudanças. E isso se reflete nele próprio, um ser mutante por natureza, capaz de ir do voz e violão ao acompanhamento orquestral, passando por todas as possibilidades entre uma coisa e outra, sem medo de experimentar.

Cria da bossa nova de Tom Jobim, João Gilberto e Vinícius de Moraes, Caetano não demorou para mergulhar em outros mares sonoros. Sem preconceitos, flertou com os Beatles, Odair José, Smetak, Rogério Duprat, Talking Heads, Pixies, poesia concreta, axé music e o que mais pintasse. E sempre saiu inteiro de cada uma dessas experiências, mesmo quando não deu muito certo em termos qualitativos.

Minha primeira experiência com ele foi logo com um disco mais ousado, Caetano Veloso (1971), gravado durante o seu exílio em Londres provocado pela gloriosa ditadura militar. A música Maria Bethania sempre me encantou com a sua mistura de música regional e erudita e os seus vocais onomatopaicos com efeito de mastigação, como se deglutisse as palavras.

Uma coisa curiosa é perceber que o autor de Sampa nunca teve momentos de ostracismo ou de grandes sumiços da mídia. Em cada década, ele sempre esteve lançando novos trabalhos, fazendo shows pelo Brasil e o mundo e sendo citado por novos artistas como uma influência importante. Raros artistas tem esse poder, e ainda mais por tantas décadas. Paul McCartney, seu colega de ano de nascimento, é um deles, sendo Milton Nascimento, da mesma classe de 1942, outro bom exemplo a ser citado.

Caetano tem o dom de trafegar entre todas as classes sociais, capaz de emplacar hits muito populares e também encantar os fãs de experimentalismo. Um caso raro de unanimidade nacional? Bem, ele tem lá os seus detratores, mas como levá-los a sério, se observarmos a obra do artista em questão? Alguns se aproveitam de incursões menos felizes no cinema e em livros para tentar, mas são vaciladas tão pequenas que é melhor não levá-los a sério.

A qualidade da obra artística de Caetano Veloso é reverenciada em todo o planeta, e serve como uma boa amostra de como o Brasil consegue, mesmo com todas as suas contradições seculares, produzir artistas desse altíssimo gabarito. Uma obra que permanecerá perene e relevante daqui a 50, 100, 200, mil anos. De um cara tranquilo e infalível como Bruce Lee.

Maria Bethania– Caetano Veloso: