Mondo Pop

O pop de ontem, hoje, e amanhã...

Tag: peter tork

Peter Tork, dos Monkees, o gente boa que tocava baixo, banjo etc

Peter Tork 2-400x

Por Fabian Chacur

Em 1966, Stephen Stills era um músico folk buscando um rumo para a sua carreira. No sufoco em termos financeiros, encarou uma audição para o papel de integrante de um grupo fictício de rock para uma série de TV. A produção gostou dele, mas cismou com seus dentes, e o vetou. De forma quase cruel, perguntaram a Stills se ele não conhecia alguém com suas mesmas características físicas, mas com dentes melhores. Generoso, o futuro integrante do Buffalo Springfield e Crosby, Stills. Nash & Young lembrou-se imediatamente de um amigo que fez no circuito folk de bares. Um certo Peter Tork, que infelizmente nos deixou nesta quinta-feira (21) aos 77 anos, possivelmente vitimado por um raro tipo de câncer.

Tork no início pensou em ignorar a indicação de Stills, mas como também não estava exatamente nadando em dinheiro, resolveu tentar a sorte. Bingo! Foi aprovado, ao lado de Michael Nesmith, Micky Dolenz e Davy Jones, para ser um dos Monkees. O seriado estreou no final de 1966 e logo se transformou em um fenômeno de audiência. De quebra, as músicas cantadas por eles na atração geraram discos que venderam milhões de cópias e invadiram as paradas de sucesso do planeta. Só que o responsável pela produção musical, Don Kirshner, não queria saber de contribuições dos quatro que não fossem os vocais.

Foi exatamente Peter Tork, que começou a tocar piano aos 9 anos e logo investiu em vários outros instrumentos, a quebrar a regra, tocando na faixa Papa Gene’s Blues (de autoria de Mike Nesmith), do 1º LP. Com a saída de Kirshner (considerado no meio musical “o homem dos ouvidos de ouro”), após o lançamento do segundo álbum do grupo, os rapazes passaram a compor e tocar, também. E nesse quesito o nosso herói se mostrou fera, incumbindo-se de baixo, banjo, violão, guitarra, teclados, harpsichord e o que mais pintasse em suas mãos.

Na banda, Tork encarnava o papel do boa praça desencanado. Detonados pela crítica musical, que os rotulava de forma venenosa como os “Prefab Four”, eles no entanto tinham como fãs até os próprios Beatles, cuja fase 1964-1965, especialmente da era Help!, eram sua óbvia inspiração visual e musical.

Eles até trocaram figurinhas com os colegas em Londres, e Peter tocou banjo para a trilha do filme Wonderwall, lançado em 1968 e escrita e gravada por George Harrison. Sua contribuição musical aparece na tela, mas não no álbum, lançado pela Apple Records naquele mesmo ano.

No final de 1968, cansado pelo grande volume de trabalho e pela pressão gerada pelo sucesso, Tork resolveu sair dos Monkees, mesmo sendo obrigado a pagar uma multa pela quebra do seu contrato. A partir daí, teria início uma fase bem difícil e obscura em sua carreira. Ele tentava montar um novo grupo, mas a coisa não fluía. Em 1972, veio o fundo do poço, com uma prisão por posse de maconha que o manteve atrás das grades em torno de três meses.

Para dar a volta por cima, trabalhou como professor de várias matérias, como música, francês, estudos sociais e até basquete, e participou de shows dos ex-colegas de grupo. Em 1980, chegou a iniciar um projeto solo com o apoio da gravadora Sire Records (que lançou Ramones, Talking Heads e outros), mas não deu certo. Seu melhor momento nessa fase foi participar do programa do então iniciante David Letterman, no qual o velho charme se mostrou firme e forte.

Graças à reexibição da série The Monkees na MTV americana, o grupo voltou a ser badalado, o que gerou um retorno do qual participaram Tork, Micky Dolenz e Davy Jones. Além de shows, o projeto gerou a gravação de três músicas inéditas para serem incluídas na coletânea Then & Now…The Best Of The Monkees (1986) e um álbum de inéditas, Pool It! (1987). A partir daí, Peter Tork voltou a ser um músico em tempo integral.

Com os Monkees, lançaria os álbuns Justus (1996, o primeiro a reunir os quatro desde 1968, e também o primeiro com eles tocando todos os instrumentos musicais), Good Times! (2016, que os trouxe de volta ao Top 20 americano após décadas, saiba mais aqui) e o natalino Christmas Party (2018, saiba mais aqui).

Paralelamente ao trabalho com os Monkees (que abandonou novamente entre 2001 e 2011), Tork lançou em 1994 seu primeiro e único álbum solo, o elogiado Stranger Things Have Happened. A seguir, ele montou uma dupla com um músico folk que participou desse CD, o cantor, compositor e ator James Lee Stanley (que atuou na série de TV Star Trek: Deep Space Nine). Juntos, fizeram shows e gravaram os CDs Two Man Band (1996), Once Again (2001) e Live Backstage At The Coffee Gallery (2006).

No mesmo período, integrou a Shoe Suede Blues, banda blueseira que gravou os álbuns Saved By The Blues (2003), Cambria Hotel (2007), Step By Step (2013) e Relax Your Mind (2018). Ele trabalhou bastante, mesmo lutando a partir de 2009 contra um câncer que em determinado momento ele pensou ter superado. Peter Tork é o segundo membro dos Monkees a nos deixar, tendo sido o britânico Davy Jones o primeiro, em 2012.

Obs.: informação do meu mestre Ayrton Mugnaini Jr. aponta que Peter Tork foi o único integrante dos Monkees a se apresentar em show no Brasil, o que ocorreu em fevereiro de 2003 no Bourbon Street e no Venâncio’s Bar, ambos em São Paulo (SP). Ele infelizmente não teve como ir. E eu só soube agora…

Veja Peter Tork e James Lee Stanley ao vivo em um programa de TV em 2006:

50 anos do melhor álbum pré-fabricado da história do rock

the-monkees-fist-lp-400x

Por Fabian Chacur

Nos anos 80, meu grande amigo e mestre Ayrton Mugnaini Jr. me disse uma frase bastante significativa: o mundo da música pop não aceita o vácuo. Trocando em miúdos: quando um determinado artista deixa de fazer um tipo de música que lhe atraía muitos fãs e segue rumo a outras sonoridades, normalmente alguém irá se dar bem ao retomar esse estilo sonoro. Eis um dos segredos dos Monkees, cujo primeiro álbum saiu em 10 de outubro de 1966.

Em 1966, os Beatles viviam um momento de mutação sonora total. Com o lançamento do álbum Revolver e do single Paperback Writer/Rain, os Fab Four davam uma forte guinada rumo ao psicodelismo. Eles ampliavam seus horizontes musicais, e deixavam para trás os incríveis anos de A Hard Day’s Night (1964) e Help! (1965). Além disso, começaram a lançar novos trabalhos em doses homeopáticas, em relação ao que ocorreu entre 1963 e 1965. Isso deixava uma forte demanda reprimida no mercado musical.

É neste cenário que os produtores de TV Bob Rafelson (1933) e Bert Schneider (1933-2011) enfim conseguem emplacar um projeto que havia surgido de forma tímida em 1962: fazer uma série de TV baseada na carreira de uma banda fictícia de rock. Reza a lenda que até o grupo The Lovin’ Spoonful chegou a ser cotado para estrelar essa atração, mas foram postos de lado ao assinar com uma gravadora e entrarem no mercado musical de verdade.

Com o estouro dos Beatles e logo em seguida do seu primeiro filme, A Hard Day’s Night (Os Reis do Iê-iê-Iê),em 1964, Rafelson e Schneider viram que estavam no caminho certo, fato que o estouro de outra atração cinematográfica beatle, Help!, só tornou mais óbvio. E o contrato com a Screem Gems viabilizou o projeto. Agora, era só escolher os quatro caras para estrelar a atração. Um deles foi definido a priori.

O inglês Davy Jones (1945-2012) era famoso por atuar em atrações teatrais, além de também cantar. Curiosamente, ele se apresentou com o elenco de uma dessas peças no programa de Ed Sullivan no mesmo dia 9 de fevereiro de 1964 em que os Beatles apareceram pela primeira vez na TV americana, causando um verdadeiro pandemônio. A vez de Jones chegaria não muito tempo depois.

Como forma de atrair pessoas para uma seleção, os produtores colocaram anúncios nas publicações Daily Variety e The Hollywood Reporter procurando músicos/atores. Foram 437 os interessados. Curiosamente, apenas um deles entrou no time tendo atendido ao chamado, Michael Nesmith. Micky Dolenz já tinha um currículo como ator infantil e cantor e furou a fila, e Peter Tork veio indicado pelo amigo Stephen Stills, reprovado por causa de seus dentes.

Como forma de dar força ao programa, o produtor musical televisivo Don Kirshner ficou com a missão de buscar canções adequadas. Ele apostou em uma jovem dupla de músicos e compositores, Tommy Boyce (1939-1994) e Bobby Hart (1939), que acabou se incumbindo de boa parte das canções e também da produção do álbum. Também contribuíram o então desconhecido David Gates (que depois estouraria como líder da banda Bread), Carole King e Gerry Goffin.

No dia 16 de agosto de 1966, chega às lojas o single Last Train To Clarksville/Take a Giant Step, primeira gravação atribuída aos Monkees. Vale o registro: o programa de TV só estreou no dia 12 de setembro daquele ano, e quando isso ocorreu, esse compacto simples já estava ponteando as paradas de sucesso. E no dia 10 de outubro, chegava às lojas o primeiro álbum daquele verdadeiro fenômeno instantâneo.

Como os quatro integrantes dos Monkees não eram propriamente músicos treinados para tocar em grupo, ao menos não naquele momento, Kirshner preferiu apostar no talento de Boyce & Hart e de músicos de estúdio para as gravações. Nesmith conseguiu ficar com a produção das duas faixas de sua autoria, e encaixou nas duas a guitarra de Peter Tork, naquele momento o músico mais competente entre os quatro. E foi o único deles a tocar no disco.

Na verdade, nenhuma das 12 faixas de The Monkees conta com a participação dos quatro monkees juntos. Aliás, 8 delas só trazem um dos caras por vez. Micky Dolenz, o melhor cantor, ficou com o vocal principal de seis faixas, e em uma divide o microfone com Davy Jones, que por sua vez se incumbe dos lead vocals em três canções. As outras duas foram interpretadas por Mike Nesmith.

Por causa disso, e também pelo fato de a contracapa do álbum não listar o nome dos músicos de estúdio que participaram do trabalho, ficava no ar um clima de farsa, como se fossem eles os responsáveis por todos os sons incluídos no disco. Rapidamente, todos ficaram sabendo de como as coisas ocorreram de fato, e não demorou para que os Monkees recebessem o apelido de Prefab Four (os quatro pré-fabricados), um contraponto avacalhado aos Fab Four originais.

O público não ligou para isso, pois a série de TV era simplesmente hilariante, desenvolvendo com muita inteligência os rumos apresentados nos filmes dos Beatles, e a qualidade das músicas apresentadas em cada episódio ajudou a solidificar esse estouro. Resultado: grandes índices de audiência televisiva, e a chegada no dia 12 de novembro de 1966 do LP The Monkees ao primeiro lugar na parada americana, onde permaneceu durante 13 longas semanas.

O que dizer de um disco que traz clássicos maravilhosos do porte de Last Train To Clarksville, Take a Giant Step, Tomorrow’s Gonna Be Another Day, I Wanna Be Free e (Theme From) The Monkees? As canções conseguiram de forma brilhante emular o estilão beatle 1964/65 sem cair na mera cópia ou paródia. E o melhor de tudo, para eles: naquele período, John, Paul, George e Ringo estavam imersos no estúdio, longe dos palcos e preparando novo LP. O caminho estava livre para os Monkees reinarem.

Logo a seguir, os Prefab Four realizaram a façanha de substituir seu primeiro álbum no topo pelo segundo, More Of The Monkees, que a partir de fevereiro de 1967 se manteve liderando os charts ianques durante longas 18 semanas. Era a Monkee mania total! Aí, em maio de 1967, Headquarters, o terceiro álbum do grupo, marcou o início do maior envolvimento de seus integrantes, compondo, tocando e cantando, sem o apoio de Don Kirshner.

Headquarters ficou durante apenas uma semana na liderança dos charts americanos. Na semana seguinte, a ironia das ironias ocorreu. Eles foram apeados da ponta pelo Sgt Pepper’s Lonely Hearts Club Band, o tão esperado novo álbum dos Beatles, que permaneceu por lá por 15 longas semanas. Os Monkees ainda conseguiriam grande sucesso com seu quarto álbum Pisces, Aquarius, Capricorn & Jones Ltda, que ficou cinco semanas no número 1, mas coube ao Magical Mystery Tour acabar com a festa de uma vez por todas.

Muitas outras coisas ocorreriam na história dos Monkees, que se tornaram uma espécie de boneco Pinnochio do sr. Gepetto ou do monstro do doutor Victor Frankestein, ganhando vida própria e virando uma banda de verdade. Mas nada supera o impacto desse seu disco de estreia, e de seus maravilhosos singles. Até mesmo um grupo pré-fabricado dos anos 60 merece estatura de mito… Anos incríveis mesmo!

The Monkees- The Monkees (ouça em streaming):

© 2024 Mondo Pop

Theme by Anders NorenUp ↑