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Category: Grandes nomes esquecidos (page 4 of 17)

Jacques Morali e Henri Belolo, os criadores do Village People

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Por Fabian Chacur

Jacques Morali (1947-1991) e Henri Belolo (1936-2018) são a prova concreta de um mundo globalizado muitos anos antes de esse termo se popularizar. Dois marroquinos que se conheceram na França, criaram seus projetos de maior sucesso nos EUA e que ganharam fama mundial. Juntos, eles concretizaram projetos ligados à disco music de grande impacto comercial e artístico, entre os quais Village People, The Ritchie Family, Patrick Juvet, Dennis Parker e David London.

Nascido no dia 27 de novembro de 1936 em Casablanca, Marrocos, cidade eternizada por causa do filme homônimo estrelado em 1942 por Humphrey Bogart e Ingrid Bergman, Henri Belolo começou a se envolver com música ainda em seu país natal, importando e promovendo discos.

Em 1956, mudou-se para a França (Paris, para ser mais preciso), e lá conheceu o produtor e empresário Eddie Barclay, criador da gravadora Barclay, que deu uma força importante nesses seu início em um novo país.

Quatro anos após a sua chegada à França, foi contratado como produtor e diretor de a&r (artistas e repertório) da gravadora Polydor naquele país. Ele produziu discos para artistas como George Moustakis, Jeanne Moureau e Serge Renée. No final dos anos 1960, resolveu ser empreendedor, criando uma produtora e uma editora musicais, envolvendo-se com shows na França de artistas como os Bee Gees e James Brown.

Entre outras coisas, ele conseguia licenciar gravações americanas para o mercado francês, e isso lhe valeu alguns contatos valiosos, especialmente com a Philadelphia International Records, e mais especificamente com os estúdios Sigma Sound, situados na cidade americana da Filadélfia.

Comerciante astuto, Belolo notou o sucesso que alguns lançamentos de música dançante vindos da América estavam fazendo, especialmente os da gravadora TK Records, de Miami, cujos hits Rock Your Baby (George McRae) e That’s The Way (I Like It) (do KC & The Sunshine Band) foram licenciados para comercialização na França através dele.

Dessa forma, ele ficou bastante atento, e com a disposição de investir em algum projeto próprio na área do que logo a seguir receberia o rótulo de disco music. E é aí que entra nessa história um certo Jacques Morali, que Belolo conheceu em uma dessas negociações comerciais na área musical. Algumas afinidades logo se mostraram fortes entre eles.

Também oriundo de Casablanca, Marrocos, Jacques Morali nasceu em 4 de julho de 1947. Ao se mudar para Paris, começou uma carreira musical, inicialmente como cantor e compositor. Em 1967, lançou um compacto duplo com quatro de suas canções: Elle Aimé Elle N’Aimé Pas (ouça aqui), Sans Famille, Le Silence Et Le Bruit e J’Suis Mignone Hein?. Pop rock bem simpático.

Além de compor músicas para espetáculos da companhia Crazy Horse de Paris, ele também se envolveu com a parte burocrática do meio musical, e foi em uma ocasião dessas que conheceu Henri Belolo. Como sabia que ele estava em busca de novas ideias para um projeto musical próprio, propôs algumas. E uma em particular acabou interessando e muito a Belolo.

Em 1975, a disco music começava a surgir com força, e uma das formas que alguns produtores se valiam para entrar nessa área era investir em releituras de músicas de outros estilos musicais.

E Morali pensou em reciclar a sonoridade dos musicais americanos dos anos 1940, especialmente os que envolviam Carmen Miranda e o coreógrafo Busby Berkeley. Uma música em particular o fascinava: Brazil, versão em inglês de Bob Russell para a clássica Aquarela do Brasil, de Ary Barroso.

Sem pestanejar, Henri Belolo, que havia aberto dois escritórios de sua produtora, a Can’t Stop Productions, em Nova York e Filadélfia, foi para esta segunda cidade americana e contatou os amigos da Philadelphia International Records (PIR) e do Sigma Sounds Studios.

Como eles imaginavam ter vocais na linha das Andrew Sisters e outros grupos vocais femininos americanos do gênero, foram arregimentadas três cantoras de estúdio: Barbara Ingram e as primas Carla e Evette Benson, conhecidas por participar de gravações antológicas de artistas como Patty LaBelle, John Davis, Billy Paul, Lou Rawls e inúmeros outros.

Entre os músicos, alguns dos mais famosos da Filadélfia, entre eles o lendário baterista Earl Young, conhecido por ser o inventor da batida disco com a gravação The Love I Lost (1973), do grupo Harold Melvin & The Blue Notes e também como líder do seminal grupo The Trammps (de Disco Inferno e tantos outros hits marcantes da era disco).

Os arranjos ficaram a cargo de Ritchie Rome (1930-2020), conhecido por seus trabalhos com The Chi-Lites, The Three Degrees e Patty Labelle. E, curiosamente, foi em homenagem a ele que aquele projeto de estúdio foi batizado: The Ritchie Family. E o primeiro single foi precisamente Brazil (ouça aqui). Lançada no final de 1975, logo se tornou um hit nas pistas de dança, e chegou ao nº 11 na parada pop americana.

Empolgados, Morali e Belolo não perderam tempo e lançaram em 1976 o primeiro álbum da The Ritchie Family. Intitulado Brazil, o LP vendeu bem, atingindo o nº 53 nos EUA e mesclando músicas alheias com composições inéditas. Além da faixa-título, outro sucesso foi Life Is Fascination (ouça aqui), que no Brasil entrou na trilha da novela global Anjo Mau (1976).

As músicas inéditas de Brazil levavam a assinatura de Morali, que se incumbia das melodias, Belolo, que vinha com as ideias para as letras, e, neste caso específico, do letrista Beauris Whitehead (depois, outros letristas, como Peter Whitehead e Phil Hurtt, também contribuiriam).

Esses parceiros adicionais entravam pelo fato de Belolo e Morali não se sentirem à vontade o suficiente para escrever letras em inglês, e seus parceiros se incumbiam de traduzir os versos feitos originalmente em francês e formatar as frases de forma correta no idioma britânico.

Com o sucesso de seu primeiro projeto e recebendo convites para shows e apresentações em TV, The Ritchie Family teve de ter uma cara própria, e foram convidadas para gravar como integrantes oficiais do trio as cantoras Cheryl Mason Jacks, Cassandra Ann Wooten e Gwendolyn Oliver.

Foi com elas (há quem diga que só dublando as músicas, pois o trio Barbara-Carla-Evette teria continuado a gravar) e os músicos da Filadélfia que foi gravado o 2º álbum da The Ritchie Family. Arabian Nights, saiu ainda em 1976 e chegou ao nº 30 nos EUA, impulsionado pela faixa The Best Disco In Town (ouça aqui), que veio de uma boa sacada dos produtores.

Eles criaram um ótimo refrão que servia como mote para encaixar trechos de diversos hits dançantes, alguns bem recentes, por sinal, como Fly Robin Fly (do trio Silver Convention), Love To Love You Baby (Donna Summer) e Bad Luck (Harold Melvin and The Blue Notes). No formato single, fez o maior sucesso, atingindo o posto de nº 17 na parada pop ianque.

Em 1977, no entanto, o embalo da The Ritchie Family caiu consideravelmente, com o lançamento de dois álbuns que não foram muito bem das pernas em termos de sucesso comercial, Life Is Music (ouça a faixa-título aqui) e African Queens.

A partir daqui, as coisas se complicaram. As três vocalistas foram surpreendentemente demitidas, sendo substituídas por Ednah Holt, Jacqui Smith Lee e Dodie Draher. O primeiro álbum da nova fase, American Generation (1978), também fracassou, mesmo com a ótima faixa-título (ouça aqui) e músicos de Nova York sobre o qual falarei mais à frente.

O grupo lançaria mais dois álbuns com a produção de Henri Belolo e Jacques Morali, Bad Reputation (1979, com Put Your Feet To The Beat, que chegou a tocar em rádios no Brasil, ouça aqui) e Give Me a Break (1980), mas ambos foram ainda pior. E os criadores abandonaram suas criaturas.

Em 1982, as garotas remanescentes ainda lançaram I’ll Do My Best, com produção de Mauro Malavasi, do grupo Change, sem grande repercussão, e sairiam de cena com All Night All Right (1983), voltando em 2011 com duas das integrantes da fase áurea para shows nostálgicos e temáticos de disco music. E havia uma razão para elas terem sido, de certa forma, descartadas.

Voltemos para 1977. Jacquer Morali, que era gay (enquanto Belolo era heterossexual), frequentava as discotecas e boates de Nova York, e em particular as de Greenwich Village. Em uma delas, viu alguns frequentadores usando trajes que equivaliam a estereótipos dos machos. Ao levar um dia o amigo Belolo para ver isso, teve a ideia que mudou de vez a vida dos dois.

“O que você acha de criarmos um grupo com seis homens caracterizados como figuras marcantes da masculinidade cantando música disco e dançando coreografias contagiantes?”.

Belolo vacilou no início, mas logo percebeu o potencial da ideia do amigo, e topou investir nesse novo projeto, que vinha a calhar, levando-se em conta que a The Ritchie Family dava sinais de cansaço em termos comerciais.

O próximo passo era encontrar um cantor que fosse bom para ser o líder vocal do grupo. Ao ver a montagem do grupo teatral Negro Ensemble Company para The Wiz (O Mágico de Oz), Morali ficou encantado com o ator principal, Victor Willis, e o convidou para integrar o grupo.

Nascido em Dallas, Texas em 1º de julho de 1951, filho de um pastor batista, Willis se mudou para Nova York com o intuito de ingressar no meio artístico. Após gravar alguns singles solo sem grande repercussão, deu-se bem nos espetáculos teatrais, e The Wiz foi a sua vitrine para o estrelato.

Como a inspiração para a criação do novo grupo vinha de Nova York, Belolo e Morali acharam que faria mais sentido gravar o primeiro álbum deles na Big Apple, e com músicos locais. E escolheram o arranjador, compositor, pianista e produtor Horace Ott (1933) para se incumbir dos arranjos e também de arregimentar uma banda que pudesse criar um som diferente e original.

Coautor do clássico Don’t Let Me Be Misunderstood (hit com The Animals nos anos 1960 e relido com sucesso pelo Santa Esmeralda em versão disco), Horace Ott trazia no currículo trabalhos com artistas do porte de Nina Simone, Aretha Franklin, Doris Troy, The Stylistics e Marilyn McCoo & Billy Davis Jr. (o arranjo da belíssima You Don’t Have To Be a Star – ouça aqui)

O time foi escalado com músicos experientes e talentosos como Alfonso Carey (baixo), Russell Dabney (bateria),Jimmy Lee (guitarra solo), Rodger Lee (guitarra base), Nathaniel “Croker” Wilke (teclados), Richard Trifan (teclados) e vários percussionistas e naipes de metais.

O nome do grupo homenageava a fonte inspiradora: Village People. As quatro músicas (todas longas) foram escritas naquele esquema de Belolo e Morali com o apoio dos letristas Pete Whitehead e Phill Hurtt. Coube a Victor Willis gravar todos os vocais, pois a Can’t Stop Productions tinha pressa e não podia esperar o recrutamento de todos os integrantes.

Village People (o álbum) saiu em 18 de julho de 1977, e teve ótima repercussão graças à faixa San Francisco (You Got Me) (ouça aqui), que se tornou uma espécie de molde para os outros hits do grupo, baseado em aberturas com metais, Willis conduzindo a canção no melhor estilo cantor de r&b e refrões matadores. O álbum chegou ao nº 54 na parada pop.

Com o sucesso das músicas nas rádios e pistas de dança, logo surgiram convites para apresentações ao vivo. Era necessário ter o time escalado. Willis ficou como o policial. Felipe Rose, que Belolo e Morali conheceram nas boates, virou o índio. Após uma seleção, foram escolhidos para completar o line up Alex Briley (soldado), Glenn Hughes (motoqueiro), David Hodo (operário) e Randy Jones (cowboy).

Sem perder tempo, a Can’t Stop Productions pôs o grupo em estúdio, e em 2 de fevereiro de 1978 chegava às lojas o álbum Macho Man, que atingiu o nº 24 na parada pop impulsionado pela divertida faixa-título (ouça aqui), que no formato single chegou ao 25º lugar nos EUA.

Uma novidade interessante é o fato de Victor Willis ter virado parceiro das canções a partir deste álbum, sendo o letrista principal, ou sozinho ou com os outros nomes citados anteriormente. Mais uma curiosidade é a abertura de Macho Man, que seria reciclada em várias outras músicas do VP.

Com um clipe que aproveitava bem o apelo visual e as coreografias dos seus seis integrantes, Macho Man se tornou rapidamente um hit mundial, conquistando desde crianças até os adultos, mesmo com suas letra de duplo sentido e de conotação gay, algo que marcou toda a obra do Village People.

A era disco teve como marca a avidez de seus produtores em oferecer novos produtos aos fãs, e isso explica o fato de, em 25 de setembro de 1978, ou seja, apenas sete meses após o lançamento de Macho Man, chegar às lojas o 3º álbum do Village People.

E que álbum! Cruisin’ marca o momento em que a fórmula criada por Morali, Belolo, Horace Ott e pelos músicos participantes (que ficaram conhecidos como a Gipsy Lane band) atingiu a perfeição.

Sua faixa mais explosiva, YMCA (ouça aqui), com uma letra inacreditável exaltando a Associação Cristã de Moços, chegou ao nº 2 nos EUA, barrada de chegar ao topo por Do Ya Think I’m Sexy, guinada disco de Rod Stewart.

E o LP tinha mais duas pérolas matadoras, o pot-pourry The Women/I’m a Cruiser (ouça aqui), uma das faixas mais perfeitas da era disco, com direito a uma bela homenagem às mulheres. Desta forma, Cruisin’ foi o mais bem-sucedido álbum do Village People, atingindo o 3º lugar nos EUA.

O baile não podia parar, e dessa forma, saiu em 26 de março de 1979 Go West, quando o álbum anterior ainda repercutia bem. E deu certo, pois atingiu o 8º posto entre os álbuns, com hits como I Wanna Shake Your Hand (ouça aqui) e a faixa-título (ouça aqui), que nos anos 1990 seria regravada com sucesso pelo Pet Shop Boys.

A faixa mais marcante, no entanto, foi In The Navy (ouça aqui), com clipe valendo-se de navios da marinha norte-americana e que chegou a ser cogitada para uso em campanha para alistamento, o que acabou sendo vetado em cima da hora. Um hit delicioso com sua marcação de palmas que chegou ao nº 3 na parada de singles estadunidense.

A partir daqui, as coisas começaram a se complicar para o “Povo do Vilarejo”. De um lado, surgiu o abominável movimento Disco Sucks, capitaneado por DJs e roqueiros ressentidos com o sucesso da disco music, cujos astros eram frequentemente mulheres, gays e latinos. Puro preconceito.

Do outro, o desgaste provocado pelo excesso de exposição na mídia da disco music, e também do caráter derivativo de diversas gravações do gênero neste período, repletas de produtores e artistas oportunistas querendo faturar em cima do “som da moda”.

É em meio a esse clima de desgaste e hostilidade que Morali e Belolo tentam dar uma sacudida e inovada com o lançamento, em setembro de 1979, do álbum duplo Live And Sleazy. Um LP trazia a gravação de um caloroso show ao vivo do Village People, com versões quentes dos hits e marcando a inesperada despedida do vocalista Victor Willis.

Embalado pelo sucesso com o grupo, Willis queria sair fora do universo disco e brilhar sozinho. Ele gravou naquele mesmo 1979 o álbum Solo Man, com músicas de sua autoria investindo no funk e na soul music. Este trabalho, no entanto, só foi lançado em 2015.

O outro LP, gravado em estúdio, trazia a presença de Ray Simpson, substituto de Willis e irmão da consagrada cantora e compositora Valerie Simpson (do duo Ashford & Simpson). O repertório tentava dar uma inovada no estilo, especialmente no rock disco Sleasy (ouça aqui), com o operário David Hodo no vocal principal.

O álbum teve uma performance inferior aos anteriores, atingindo o nº 32 na parada pop. Seu único single de sucesso foi a curiosa e pouco profética Ready For The 80’s (ouça aqui), que com Simpson no vocal líder atingiu o nº 52 na parada pop. Seria o último hit deles nos EUA.

Naquele mesmo e agitado 1979, Morali e Belolo se associaram a Alan Carr, produtor do filme Grease (1978), para criar um filme estrelado pelo Village People e com os atores Steve Guttenberg (famoso depois com os Loucademias de Polícia) e Valerie Perrine (de Lenny e Superman 1 e 2).

Apropriadamente intitulado Can’t Stop The Music (alusão à produtora de Morali e Belolo e ao preconceito contra a disco), o longa-metragem foi lançado em maio de 1980, quando a disco music rolava ladeira abaixo, e fracassou miseravelmente nas bilheterias.

A trilha sonora, no entanto, até que não foi tão mal, atingindo o nº 47 nos EUA e um surpreendente nº 9 no Reino Unido. Das 10 faixas, 5 são com o Village People. Entre elas, Can’t Stop The Music (ouça aqui), sucesso no Reino Unido e no Brasil, o maior na voz de Ray Simpson, que na trilha também releu YMCA, em versão inferior à original (ouça aqui).

Temos duas curiosidade neste álbum. Uma é uma tentativa de trazer nova energia para a The Ritchie Family, que comparece com três faixas, entre elas Give Me a Break (ouça aqui), muito legal, mas que infelizmente não foi muito bem nas paradas de sucessos.

A outra fica por conta de um cantor de nome David London, que interpretou as músicas The Sound Of The City (que fez sucesso no Brasil ouça aqui) e Samantha. E ele tem uma história curiosa que vale contar rapidinho por aqui.

London, na verdade, era o pseudônimo que o cantor e compositor Dennis Frederiksen (1951-2014) usava nas gravações que fez de disco music, pois tinha vergonha do estilo pelo fato de na verdade ser um artista de rock, que compôs e participou de gravações de bandas como Survivor, Toto, Trillion e LeRoux, além de ter lançado trabalhos solo também.

Bem, o que fazer com o Village People após o fracasso de Can’t Stop The Music e a queda da disco music? Seus produtores apostaram em uma solução radical. Pra começo de conversa, os integrantes trocaram seus trajes habituais e passaram a se vestir inspirados nas então efervescentes new wave e new romantic, usando roupas coloridas e cabelos da moda de então.

Em termos musicais, então, a troca foi ainda mais brusca, deixando a batida disco de lado e mergulhando de cabeça na new wave e no soft rock. Na nova banda de apoio e também ajudando a compor algumas músicas, o baixista Howie Epstein (1955-2003), que em 1982 substituiu Ron Blair na seminal banda Tom Petty and The Hearbreakers.

O álbum resultante dessa verdadeira metamorfose, Renaissance, saiu em junho de 1981, e é desconcertante e paradoxal. As músicas são boas e os arranjos, excelentes, mas é totalmente diferente do Village People. Perdeu a alma, a célula mater do grupo. Se tivesse sido lançado por um grupo novo, quem sabe estourasse, mas com eles, não passou do nº 138 nos EUA.

Do You Wanna Spend The Night (ouça aqui), por exemplo, não teria feito feio em um disco dos Eagles ou da Little River Band, com sua levada soft rock animadona. Ótima! Por sua vez, Food Fight (ouça aqui) poderia ter integrado um disco da banda new wave americana Devo. E por aí vai.

O grupo se esforçou para divulgar a sua nova fase, e até marcou presença em janeiro de 1982 como uma das atrações do tradicional Festival de San Remo, na Itália, tocando em um intervalo das apresentações dos concorrentes (veja aqui). Mas nada foi capaz de tornar o Village People new wave/new romantic bem-sucedido em termos comerciais.

Após mais um fracasso, a tentativa seguinte foi um retorno de Victor Willis, que gravou com a banda o álbum Fox On The Box, lançado em julho de 1982 e que curiosamente não saiu na época nos EUA, França e Reino Unido. O fracasso do LP, uma aposta meio furada na sonoridade r&b de então, a la Prince e quetais, levou Willis a sair mais uma vez.

Em 1985, com Ray Stephens no vocal principal, o grupo nos ofereceu o peculiar Sex Over The Phone, cuja faixa-título (veja o clipe aqui) se inspirava de forma premonitória no sexo feito de forma remota, quando a Aids se tornava uma triste realidade. O clipe é hilariante e bizarro.

Com mais um fracasso nas costas, e por outras razões que abordarei mais à frente, Jacques Morali e Henri Belolo abriram mão do Village People em 1985. A banda voltou cerca de três anos depois, comandada por alguns de seus ex-integrantes (entre eles Ray Simpson), usando novamente os trajes de sua fase áurea e focando nos shows reverenciado a era da disco music.

Além de Village People e The Ritchie Family, a Can’t Stop Production investiu em mais dois artistas que valem ser enfocados. Um deles é o cantor e compositor suíço radicado na França Patrick Juvet (1950-2021), sobre o qual Mondo Pop fez um extenso texto quando de sua morte (leia aqui).

O outro é um caso mais curioso. Trata-se de Dennis Parker (1946-1985), nome usado no meio musical pelo ator americano Dennis Posa, também conhecido pela alcunha de Wade Nichols nos filmes pornôs de que participou. Como ator, ele viveu o papel do chefe policial Derek Mallory na série televisiva The Edge Of Night entre 1979 e 1984.

Posa/Nichols/Parker namorou com Jacques Morali, que resolveu apostar em uma carreira musical para ele. Valendo-se basicamente da mesma equipe que atuava nos discos do Village People e da fase final da The Ritchie Family, ele colocou o namorado em estúdio. No dia 1º de março de 1979, saía o fruto desse projeto, o álbum Like An Eagle, surpreendentemente bom.

Tudo bem, a voz de Parker é bem limitada e com pouca extensão, mas os produtores souberam encaixá-la de forma a não atrapalhar as músicas. Na espetacular faixa-título, por exemplo (ouça aqui), sua interpretação sussurrante e sensual se encaixa bem no clima disco midtempo, tornando-a um envolvente clássico cult das pistas de dança.

As faixas mais conhecidas são as excelentes Why Don’t You Boogie e I’m a Dancer, que no álbum aparecem em sequência sem interrupções (ouça aqui) e que poderiam ter figurado sem fazer feio nos melhores álbuns do Village People, pois tem aquele estilo contagiante.

O álbum teve sucesso bastante restrito ao público disco mais fiel, mas teve boa repercussão no Brasil, inclusive trazendo o cantor para cá com a missão de participar de alguns programas de TV e rádio. I’m a Dancer foi incluída na trilha sonora da novela global Marrom Glacê (1979).

A carreira de Dennis Parker como cantor se resumiu a este álbum, provavelmente pelo sucesso comercial reduzido e também pelo fim do seu namoro com Morali. Infelizmente uma das primeiras vítimas famosas do vírus HIV, eles nos deixou em 28 de janeiro de 1985 com apenas 34 anos.

E é exatamente aí que entra o porque a parceria que gerou tantos hits se encerrou. Em 1985, Jacques Morali também foi diagnosticado com o vírus HIV, e a partir daí saiu de cena, com Belolo voltando ao esquema antigo de licenciar músicas para o mercado francês, especialmente hits dançantes. Morali nos deixou em 15 de novembro de 1991.

Embora menos do que produtores contemporâneos, Morali e Belolo também colaboraram com outros artistas. A diva Cher, por exemplo, gravou em 1982 uma música deles, Rudy (ouça aqui), no álbum I Paralize (1982), canção anteriormente gravada em francês pela estrela franco-egípcia Dalida.

Belolo e Morali só atuaram em um único projeto fora do universo da disco music. Foi com o trio de rap/hip hop Break Machine, liderado pelo também compositor Keith Rogers. O álbum produzido por eles para o grupo passou batido nos EUA, mas o single Stree Dance (ouça aqui) chegou ao 3º lugar no Reino Unido em 1984 e é muito bom.

Morali também produziu e compôs músicas para o álbum I Love Men (1984), da célebre cantora e atriz americana Eartha Kitt (1927-2008), mais conhecida no Brasil por ter sido a Mulher Gato na série de TV Batman, nos anos 1960. A faixa-título é ótima, assim como o clipe (veja aqui).

Após o fim da parceria do Village People com Jacques Morali e Henri Belolo, seis de seus integrantes, entre eles Ray Simpson, criaram em 1987 a produtora Sixuvus. A partir daí, eles passaram a fazer shows pelos quatro cantos do mundo, com o visual da fase clássica.

Conseguiram, dessa forma, manter o nome do grupo ativo, participando de programas de TV e lançando eventuais singles, entre eles um, bizarro, com a seleção da Alemanha que disputou a Copa do Mundo de 1994 nos EUA, Far Away In America (veja o clipe aqui ).

Enquanto isso, seu antigo vocalista, Victor Willis, envolveu-se com drogas e chegou a ser preso e depois internado em uma clínica de reabilitação para se livrar do vício. As coisas começaram a melhorar para ele, curiosamente, a partir de 2012, quando ganhou o primeiro processo na justiça americana pelos direitos sobre as músicas que escreveu com o Village People.

Essa pendenga jurídica acabou em 2017, quando Willis não só conseguiu ficar com a parcela de direitos autorais antes destinados a Henri Belolo como de quebra passou a ser o dono dos direitos da utilização da marca Village People para shows, passando a perna na Sixuvus.

Desde então, o Village People passou a ter Victor Willis como seu vocalista principal novamente e cinco coadjuvantes escolhidos para dar apoio a ele nos shows. O grupo gravou em 2018 um álbum inédito, A Village People Christmas, com músicas natalinas assinadas por Willis.

YMCA (clipe oficial)- The Village People:

Thom Bell, 79 anos, autor e um arranjador de belas canções

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Por Fabian Chacur

Quando o meu saudoso irmão Victor chegou em casa há longínquos 50 anos com o compacto simples de I’ll Be Around, do grupo vocal americanos The Spinners (ouça aqui), eu não imaginava que ficaria simplesmente fascinado com aquela canção. E também não sabia que aquele era o meu primeiro contato com o seu autor, Thom Bell, que infelizmente nos deixou nesta quinta-feira (22) aos 79 anos. Um nome presente em vários clássicos da música pop, como você verá a seguir.

Nascido em Kingston, Jamaica, em 26 de janeiro de 1943, Thom Bell veio com a família para os EUA com apenas 4 anos de idade. Ainda criança, começou a tocar piano, e logo ficou claro que a música era o seu caminho em termos profissionais. E não demorou a mergulhar nos estudos.

Ele queria ser um músico erudito, e se preparou para tal, mas com o tempo percebeu que a música popular poderia ser mais promissora. No entanto, não deixou de lado as lições que assimilou no aprendizado formal, e isso lhe deu um bom diferencial em relação aos colegas.

Amigo de infância e adolescência de um certo Kenny Gamble na cidade de Filadélfia, ele começou a carreira como músico ao trabalhar na gravadora local Cameo-Parkway, e acompanhou em shows, como pianista e maestro, o então muito bem sucedido Chubby Checker, o rei do twist.

Seu primeiro grande momento na cena da soul music ocorreu no fim dos anos 1960 com seu envolvimento com o grupo The Delfonics, para o qual escreveu e arranjou hits marcantes La-La (Means I Love You) (ouça aqui), que em 1994 foi relida com maestria com o Swing Out Sister (ouça aqui).

É aqui que volta à sua vida o amigo Kenny Gamble, que também enveredou pela música e fez uma sólida parceria com o músico Leon Huff, com o qual criou a gravadora Philadelphia Internacional Records (PIR). Ele criou uma editora junto com os amigos, e também se tornou um arranjador e compositor do selo. Mas preferiu não se prender em um contrato, para ficar livre para trabalhar para outras empresas.

E embora tenha feito muitas coisas boas para a PIR, entre elas o arranjo da clássica Backstabbers, gravada pelos The O’Jays (ouça aqui), seus trabalhos de maior sucesso foram para outras gravadoras.

Para o selo AVCO, por exemplo, ele compôs e produziu canções em parceria com a letrista Linda Creed para o icônico grupo vocal The Stylistics, canções que até hoje entram nos set lists de bailes black, entre as quais You Make Me Feel Brand New (ouça aqui), You Are Everything (ouça aqui) e Stop Look Listen (To Your Heart) (ouça aqui).

Para a Atlantic Records, produziu e compôs para os Spinners hits como a já citada I’ll Be Around, Could It Be I’m Falling In Love (essa, “só” produziu e arranjou- ouça aqui) e Them Came You– dueto com Dionne Warwick com arranjos e produção a cargo dele (ouça aqui).

Em 1977, Thom Bell trabalhou com Elton John em gravações que inicialmente foram lançadas em 1979 no formato single com o título The Thom Bell Sessions, com três músicas, e em 1989, com seis faixas e o título The Complete Thom Bell Sessions, já em plena era do CD.

Os destaques são as maravilhosas faixas Are You Ready For Love (Thom Bell, Leroy Bell e Casey James), Mama Can’t Buy You Love (Leroy Bell e Casey James, ouça aqui) e Nice and Slow (Thom Bell- Elton John- Bernie Taupin- ouça aqui), com arranjos matadores e a produção de Thom perfeita.

Além dos artistas já citados, Thom Bell trabalho com nomes do porte de Dionne Warwick (em discos solo dela), Johnny Mathis, Dusty Springfield, Laura Nyro & Labelle e Phillys Hyman. A partir dos anos 1990, ele se tornou mais recluso, vez por outra aceitando trabalhos como um com a cantora britânica Joss Stone.

Sempre que era acusado por alguns colegas da área musical de usar elementos sonoros distantes da soul music, ele tinha a resposta perfeita na ponta dos lábios: “eu não faço soul music ou r&b, eu faço música”. Deixando, dessa forma, bem claro que música boa não tem fronteiras.

Saibam que este é apenas um resumo feito a toque de caixa da obra desse grande Thom Bell. Tem muito mais por aí. Faça um favor a você e mergulhe nessa linda obra de um compositor, produtor e arranjador que acima de tudo amava a música e a fazia em primeiro lugar por puro prazer.

Are You Ready For Love (clipe)- Elton John:

Christine McVie, 79 anos, uma integrante do Fleetwood Mac

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Por Fabian Chacur

Em junho deste ano, foi lançada a coletânea Songbird- A Solo Collection (leia sobre este álbum aqui), a primeira dedicada à carreira-solo de Christine McVie. Infelizmente, foi o último trabalho lançado pela também cantora e compositora da banda Fleetwood Mac, que nos deixou nesta quarta-feira (30/11) aos 79 anos.

A informação foi divulgada nas redes sociais através de seus familiares, dizendo que ela partiu em paz após um período de internação e vitima de uma curta doença não revelada aos seus fãs.

Nascida em 12 de julho de 1943 na Inglaterra. ela começou a se tornar conhecida na cena musical do Reino Unido ao integrar a banda Chicken Shack, com quem gravou dois álbuns entre 1967 e 1969. Ela saiu do grupo e começou um flerte com outra banda que vivia seus primeiros tempos de sucesso na mesma época. o Fleetwood Mac. A ligação foi musical e afetiva, pois ela se casou em 1968 com seu baixista, John McVie.

Antes de entrar efetivamente na banda, ela lançou o seu primeiro álbum solo, que levou o seu nome de solteira, Christine Perfect (1970), trabalho no qual regravou o clássico do blues I’d Rather Go Blind, hit de Etta James que ela já havia gravado com a sua banda anterior, sendo a vocalista principal.

Christine participou como convidada dos álbuns Mr. Wonderful (1968) e Kiln House (1970), sendo que neste último foi a autora da pintura que ilustra a sua capa. No trabalho seguinte, Future Games (19710, Christine McVie foi enfim efetivada como tecladista e vocalista do FM. Embora tenha base blueseira também, ela certamente ajudou e muito a banda na sua transição para uma sonoridade um pouco mais pop e melódica.

Ela topou, junto com os fundadores da banda, o marido John e o baterista Mick Fleetwood, a encarar a mudança em 1974 para os EUA. E foi lá que o grupo encontrou o guitarrista e vocalista Lindsey Buckingham e a cantora Stevie Nicks, que com os três britânicos integrou a formação mais bem-sucedida do grupo em termos comerciais e para muitos também artística (estou entre os que pensam assim).

Entre 1975 e 1987, o Fleetwood Mac se tornou uma das mais bem-sucedidas bandas de rock do mundo, graças a álbuns impactantes como Fleetwood Mac (1975), Rumours (1977). Tusk (1979) e Mirage (1982). Neles, Christine se destacou como cantora e compositora, em hits como Say You Love Me, You Make Loving Fun, Songbird, Hold Me e Everywhere, além de encaixar com categoria seus vocais e teclados nas canções dos colegas.

Além do trabalho com a banda, ela lançou mais dois discos solo, Christine McVie (1984), com o hit Got a Hold On Me, e In The Meantime (2004), este seu único lançamento em um longo período longe do Fleetwood Mac, entre 1998 e 2013. Ela também lançou um excelente álbum em parceria com o Lindsey Buckingham em 2017 (leia a resenha aqui).

Depois de se separar de John McVie em 1976, Christine ainda conseguiu trabalhar com o ex-marido, mesmo tendo alguns perrengues com ele, alguns inspiradores de canções do célebre álbum Rumours, o mais famoso da banda. Um dos pontos altos da recente coletânea é uma versão de Songbird, um de seus clássicos do Fleetwood Mac, acrescido de um belíssimo arranjo de cordas, que acaba soando como uma bela despedida dela de cena.

Songbird (nova versão)- Christine McVie:

Irene Cara, 63 anos, a cantora dos hits Fame e Flashdance

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Por Fabian Chacur

Com apenas 3 anos de idade, Irene Cara foi finalista do concurso Little Miss America. Era uma indicação do que viria pela frente em sua vida. Ela se tornou mundialmente conhecida como cantora e atriz, especialmente graças às músicas Fame e Flashdance…What a Feeling. Ela nos deixou aos 63 anos no dia 25, de causas não reveladas, sendo o fato divulgado no dia 26 pela sua assessora de imprensa, Judith Mosse.

Nascida no Bronx, Nova York, em 18 de março de 1963, filha de um imigrante porto riquenho e de uma imigrante cubana. Irene sempre dizia em entrevistas que nunca pensou em ser outra coisa que não fosse artista.

Ainda criança, participava de vários programas de TV e gravou seu primeiro álbum, Esta Es Irene (1967). Com dez aninhos, marcou presença em um show em homenagem ao grande jazzista Duke Ellington no icônico Madison Square Garden ao lado de Stevie Wonder, Sammy Davis Jr. e Roberta Flack.

Aos poucos, foi se fortalecendo enquanto atriz e cantora, atuando em espetáculo da Broadway, séries e filmes televisivos. Ou seja, estava bem preparada quando recebeu o convite para atuar no filme Fama, de Alan Parker. Ela viveu o papel de Coco Hernandez, uma aspirante a atriz que iniciava o seu treinamento em uma badalada escola em Nova York.

Em uma época em que Hollywood buscava um sucessor para Os Embalos de Sábado à Noite e Grease, Fama conseguiu atingir essa expectativa com louvor. É um filme delicioso, que mostra toda a trajetória de jovens aspirantes ao estrelato na escola, desde os momentos sonhadores do início até as dificuldades, os amores, as vitórias iniciais…

Se a atuação de Irene como atriz foi excelente, é como cantora que ela brilhou, pois os dois grandes sucessos da trilha sonora foram gravados por ela. Fame, a eletrizante música-título, e a canção romântica Out Here On My Own (ouça aqui), atingiram os primeiros postos nas paradas de sucesso do mundo todo. Esta última fez muito sucesso no Brasil em 1981 na voz da ainda criança Nikka Costa, filha do célebre maestro Don Costa, que trabalhou com Frank Sinatra e outros mestres da música.

Mesmo com esse embalo todo, Irene não fez muito sucesso com o seu primeiro álbum na fase adulta, Anyone Can See (1982), que não passou do número 39 na parada ianque. A coisa mudou em 1983, quando foi convidada a gravar a música-tema de outro filme, Flashdance, desta vez estrelado pela atriz Jennifer Beals e de certa forma uma derivação de Fama.

O público, no entanto, gostou e muito, e também curtiu muito as duas principais músicas da trilha. Uma é Maniac, rock eletrônico interpretado por Michael Sembello, músico que já havia tocado com Donna Summer, Stevie Wonder e outros luminares da música. A outra é exatamente Flashdance…What a Feeling, que Irene escreveu em parceria com o grande Giorgio Moroder e Keith Forsey.

Na verdade, a parceria entre Irene e Giorgio foi bem curiosa, pois desde o seu estouro com Fame a voz de Irene Cara era comparada com a da estrela maior daquela época, Donna Summer, e Moroder foi exatamente o descobridor da moça. Se teve receio das comparações, Cara acabou topando trabalhar com o genial músico e compositor italiano. E deu muito certo!

Flashdance… What a Feeling atingiu o primeiro lugar na parada americana, ficando nesse posto por seis longas semanas e ajudando a impulsionar a trilha sonora do filme para o mesmo posto. De quebra, a moça acabou abocanhando um Oscar como coautora desta canção, somando-se a prêmios Grammy, American Music e Globo De ouro. E isso tudo com apenas 24 anos!

A expectativa em torno de um novo álbum da moça era enorme, e esse álbum, intitulado What a Feelin’, saiu em 1983. Além da faixa-título, emplacou mais dois hits, Why Me? (ouça aqui), que chegou ao 13º lugar nos EUA e fez sucesso no Brasil, e Breakdance (ouça aqui ), que chegou ao nº8, ambas parcerias com Giorgio Moroder.

O álbum completo, no entanto, decepcionou, não indo além do 77º posto na parada americana. E aí começaram os problemas de Irene, que em 1985 resolveu processar o dono da gravadora que lançou este trabalho, a Network Records, o empresário Al Coury. Essa disputa judicial durou oito longos anos, e ela venceu, mas não levou, pois o selo alegou falência e não pagou os cerca de 1.5 milhão de dólares que devia. Ela acredita que isso atrapalhou e muito a sua carreira, pois afastou os empresários e gravadoras.

Seja como for, ela ainda teve uma boa oportunidade em 1987 para dar a volta por cima quando lançou o álbum Carasmatic, desta vez pela gravadora Elektra. Mas mesmo tendo contado com as participações de nomes do porte de George Duke, Carole King, George Johnson, Bonnie Raitt e Patrice Rushen, o álbum foi um fracasso de vendas e marcou o fim do seu auge.

Antes, ela participou do single beneficente Cantaré, Cantarás, em 1985, ao lado de Roberto Carlos, Gal Costa, Simone, Placido Domingo, Julio Iglesias, Jose Feliciano, Sergio Mendes e Lucho Gatica, entre outros, em prol de ações da Unicef na América Latina (veja o clipe aqui) e com o nome Hermanos.

Além disso, teve músicas incluídas em quase 20 trilhas sonoras de filmes, e participou de produções como City Heat (1984), este contracenando com os consagrados Clint Eastwood e Burt Reynolds.

Mesmo com muito menos repercussão, Irene Cara se manteve na ativa, fazendo turnês nos anos 1990 pela Europa e Ásia. Ela lançou alguns singles de dance music, compilados no hoje bastante raro álbum Precarious 90’s. Ela também gravou uma releitura de What a Feeling em 2001 com o cantor suíço Peter René Baumann, mais conhecido pelo nome artístico DJ Bobo.

Além de eventuais aparições em TV, Irene Cara lançou o seu último álbum em 2011, Irene Cara Presents Hot Caramel, CD duplo com o grupo que criou em 1999, o Hot Caramel. Você também a encontrará em discos de Lou Reed, George Duke, Evelyn Champagne King e Oleta Adams fazendo backing vocals. Bem, apesar dos altos e baixos, foi uma bela carreira.

Fame (clipe)- Irene Cara:

Bebeto Alves, 68 anos, o gaúcho das boas músicas sem fronteiras

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Por Fabian Chacur

No início de 2018, recebi uma mensagem através de uma rede social digital de um artista que se apresentou e disse que desejava me mandar o seu mais recente álbum. Era ninguém menos do que Bebeto Alves. Tomei um susto, pois achei uma postura muito humilde por parte dele, um artista com um gabarito tão alto e de tanta estrada. Pois infelizmente esse grande cantor, compositor e músico gaúcho nos deixou na madrugada desta segunda-feira (7), apenas 3 dias após completar 68 anos.

Em várias entrevistas, Bebeto afirmou que não se sentia local de parte alguma. Basicamente, isso significava que ele, enquanto artista, nunca respeitou limites ou fronteiras musicais, experimentando e criando novos horizontes sonoros e poéticos. Sua base era o rock and roll e a milonga, mas nunca se limitou a um único rumo. E, dessa forma, criou uma trajetória musical das melhores.

Ele lançou o seu álbum de estréia em 1981, após muitos anos de estrada. Tive a honra de escrever sobre esse trabalho no livro 100 Grandes Álbuns do Rock Gaúcho, criado e coordenado pelo jornalista e biógrafo gaúcho Cristiano Bastos, trabalho essencial que será lançado em breve. É um disco maravilhoso, e que dava pistas do que viria adiante.

Além de seus próprios trabalhos, Bebeto Alves também teve músicas de sua autoria gravadas por outros artistas, entre elas 433, que integra o álbum Kleiton & Kledir (1983), o mais bem-sucedido em termos comerciais da seminal dupla gaúcha e que inclui os hits Tô Que Tô e Nem Pensar.

Bebeto sempre foi muito gregário, e fez parcerias e gravações com diversos outros artistas, entre os quais Humberto Gessinger, Antonio Villeroy, Jimmi Joe e King Jim. Outro projeto incrível dele foi o grupo OhBlackBagual, cujo excelente álbum Canção Contaminada foi o que ele tão gentilmente me enviou. A partir da resenha desse trabalho, fiz vários textos sobre Bebeto em Mondo Pop (leia todos aqui).

Você– Bebeto Alves:

Jerry Lee Lewis, 87 anos, o último dos pioneiros do rock

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Por Fabian Chacur

Jerry Lee Lewis, o último grande astro da geração inicial do rock que ainda estava entre nós, nos deixou aos 87 aos. Sua morte foi confirmada nesta sexta-feira (28) por seu assessor de imprensa, Zack Farnun, que afirmou ter o lendário cantor e pianista americano nos deixado em Desoto County, Mississippi, ao lado de sua sétima esposa, Judith. Boatos sobre sua morte nos últimos dias haviam circulado, mas a confirmação só veio agora.

Nunca irei me esquecer da entrevista coletiva desse mitológico artista realizada em novembro de 1993 em São Paulo no hotel Maksoud Plaza, situado na região da Avenida Paulista. Olhos incrivelmente verdes, olhando para nós,jornalistas, como se estivesse escolhendo um para dar uns bons tiros, jeitão de pouca paciência e poucos amigos. Suas respostas foram lacônicas e volta e meia atravessadas.

Após aproximadamente 15 minutos, nos quais rejeitou o filme que havia sido feito há alguns anos sobre a sua carreira (falarei mais sobre isso depois), ele levantou e disse isso: “bem, pessoal, eu fiz uma longa viagem, estou cansado, até mais!” Levantou-se e saiu de cena rapidinho, andando no melhor estilo “dez pras duas”, com suas botas de couro. Bem, pelo menos saímos ilesos.

Meu grande amigo Marcelo Orozco viu um dos shows, que foram realizados em 30 de novembro e 1º de dezembro de 1993 em São Paulo no hoje extinto Palace, situado no bairro de Moema. Ele fez uma belíssima resenha (leia aqui ), com a sua categoria habitual.

Também fiz uma resenha em Mondo Pop, no ano de 2016, da sua excelente autobiografia, uma das mais francas e diretas que já tive a oportunidade de ler nesses anos todos (leia a resenha aqui).

Jerry Lee Lewis nasceu em 29 de setembro de 1935, e desde pequeno mostrava inclinação pela música, tanto que seus pais logo o apoiaram. As coisas engrenaram para ele em 1956, quando foi contratado pela Sun Records, de Sam Phillips, gravadora que lançou outros craques da geração inicial do rock and roll, como Elvis Presley, Johnny Cash e Carl Perkins.

Entre 1956 e 1958, lançou os seus maiores hits, clássicos do porte de Whole Lotta Shakin’ Goin’ On (nº 3 nos EUA e nº 8 no Reino Unido), Great Balls Of Fire (nº 2 nos EUA E nº 1 no Reino Unido), Breathless (nº 7 nos EUA e Reino Unido) e High School Confidential (curiosamente a única escrita por ele, nº 21 nos EUA e nº 12 no Reino Unido).

O grande mérito de Jerry Lee foi trazer o tempero country do seu piano e incorporá-lo ao pique do rock and roll, com direito a uma performance alucinada com direito a subir no piano e coisas assim, além de ter uma voz recheada de pique e jogo de cintura.

Seu temperamento errático, no entanto, logo cobrou um alto preço, quando ele, no final de 1957, separou-se de sua já segunda esposa para ficar com Myra Gayle, garota com apenas 13 anos de idade. Quando foi fazer uma turnê no Reino Unido, a levou junto com ele, e admitiu à imprensa local que se tratava de sua esposa. Tentem imaginar isso em plena década de 1950…

O artista teve de lidar com uma grande reação conservadora por parte da mídia, que ele só conseguiu superar com o decorrer dos anos. Ele voltou a emplacar um hit ao menos mediano apenas em 1964, com I’m On Fire. Em 1968, no entanto, atingiu o 1º lugar na parada country americana com Another Place Another Time, e emplacou mais outros 30 sucessos nessa área até o fim dos anos 1970.

O revival do rock original rendeu shows importantes como o The Rock And Roll Revival Concert em 1969, no Canadá, e o London Rock N’ Roll Festival em 1972, em Londres, nos quais ele brilhou ao lado de contemporâneos como Little Richard, Bo Diddley e Chuck Berry, entre outros. No primeiro, tivemos também a participação de John Lennon e a sua Plastic Ono Band, um dos raros shows que ele realizou sem os Beatles, vale registrar.

A partir da segunda metade da década de 1970, Lewis conviveu com vários problemas de saúde e também com diversas confusões geradas por seu alto consumo de bebidas e temperamento irascível. Em 1989, foi lançado o filme Great Balls Of Fire (A Fera do Rock, no Brasil), dirigido por Jim McBride e estrelado por Dennis Quaid e Wynonna Ryder.

Embora tenha feito uma ponta no filme e regravado alguns de seus hits para a trilha sonora (muito boa, por sinal), Jerry Lee Lewis o rejeitaria nos anos seguintes. Na célebre entrevista coletiva, ele afirmou que não havia gostado do resultado final, e que um dia faria o seu próprio filme sobre sua vida, o que, infelizmente, acabou não conseguindo concretizar.

Ele se manteve ativo nas últimas décadas, fazendo alguns shows, gravando álbuns como Youngblood (1995) e participando da trilha sonora do filme Dick Tracy (1990, estrelado por Warren Beatty e Madonna) com a música (muito boa, por sinal) It Was The Whiskey Talking (Not Me) (ouça aqui).

Great Balls Of Fire (clipe)- Jerry Lee Lewis:

Gregg Diamond (1949-1999), um dos grandes da disco music

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Por Fabian Chacur

Em março de 1999, a música Steal My Sunshine era lançada, e em pouco tempo se tornaria um dos maiores sucessos pop daquele ano. Gravada pelo grupo canadense Len, trazia como coautor um nome importante da era da disco music, o compositor, músico e produtor Gregg Diamond. Esse hit poderia ter ajudado o artista americano a sair de um ostracismo de quase duas décadas. No entanto, por uma dessas ironias do destino, ele se foi no dia 14 daquele mesmo março de 1999, sem nem ao menos desfrutar desse retorno triunfal.

Vítima de um sangramento gastrointestinal aos 49 anos de idade, Gregg nos deixou um belo legado que, infelizmente, não tem sido celebrado à altura. Procure um texto um pouco mais extenso e detalhado sobre ele e sinta o drama. É por isso que resolvi arregaçar as mangas e colher o máximo de informações possíveis para fazer este tributo. Sem mais delongas, eis a sua vida e obra, saudoso Gregg Diamond!

Gregory Oliver Diamond nasceu em 4 de maio de 1949 em Bryn Mawr, Pensilvania (EUA). Ele estudou percussão e teoria musical na Berklee School Of Music, e começou a carreira musical como baterista, tocando em bandas como a Five Dollar Shoes, que chegou a se apresentar no seminal clube CBGB’s, em Nova York.

O grupo lançou um álbum autointitulado em 1972 (Five Dollar Shoes) pela Neighborhood Records, e um single em 1973, sem grande repercussão. Em seus ensaios, uma figura constante era o irmão mais novo de Gregg, Godfrey Diamond, com seis anos a menos.

Como gostava muito de música, Godfrey não saía dos ensaios, e era convidado a dar opiniões sobre o que estava rolando. Dessa forma, ele começou a tomar gosto por esta área de trabalho, e aos 19 anos de idade, foi contratado pelo Media Sound Studios, em Nova York, inicialmente como auxiliar e aos poucos mergulhando na área técnica, participando de gravações e mixagens. Ele também tocava bateria.

Enquanto isso, Gregg continuava embrenhado no cenário do rock and roll, e passou a integrar a banda de apoio do cantor e compositor Jobriath (1946-1983), a The Creators, que nos idos de 1973 e 1974 era considerada uma das grandes apostas do glitter rock. Jobriath, inclusive, foi um dos primeiros astros de rock a assumir a homossexualidade, e também um dos primeiros nomes conhecidos da cena musical a ser vítima do vírus HIV.

Godfrey também era apaixonado por rock, mas trabalhava no estúdio com artistas de outros gêneros musicais, entre eles a banda de funk e soul Kool & The Gang, mais especificamente nos álbuns Light Of Worlds (1974) e Spirit Of The Boogie (1975), e do cantor de soul Ben E. King (o seminal álbum Supernatural, de 1975, do hit Supernatural Thing).

O mais novo dos Diamond tinha o costume de levar para casa cópias das mixagens que estava ajudando a fazer no Media Sound, e mostrava a Gregg, que aos poucos começou a curtir muito aquela sonoridade funk dançante e pra cima. Não demorou a surgir a ideia de fazer alguma coisa naquela linha, e ele (agora nos teclados) convidou Steve Love, guitarrista do The Creators, e também Jim Gregory (baixo, do Five Dollar Shoes) e o irmão para gravar uma base instrumental, em um estúdio naquela mesma Nova York.

Aí, o imponderável entrou em cena. Andrea True, uma atriz iniciante que atuava em filmes pornôs de segunda categoria, entre eles Deep Throat II (Garganta Profunda, no Brasil), pensava em investir em uma carreira como cantora. Ao ir à Jamaica para participar de uma campanha institucional, viu-se em uma situação inusitada. Por problemas ocorridos entre os governos dos EUA e o local naquele exato momento, ela não poderia levar para o seu país o pagamento que recebeu pelo seu trabalho.

Para não sair totalmente no prejuízo, ela teve a ideia de gastar a grana na própria Jamaica pagando horas de estúdio para gravar uma faixa como cantora. Amiga de Gregg, ela ligou pra ele e perguntou se o músico não tinha alguma gravação que eles pudessem completar na pátria do reggae. Os Diamonds toparam, e viajaram com precisamente aquela gravação que haviam feito pouco tempo antes.

Foi dessa forma que nasceu More, More More, pensada inicialmente como possível tema de um filme pornô. Os Diamonds tentaram emplacar a gravação nas gravadoras de maior porte, mas só ouviram o tão sonhado sim do pequeno selo Buddah Records. Creditado a Andrea True Connection, o single rapidamente se tornou um estouro, atingindo a 4ª posição na parada pop dos single nos EUA e o 5º lugar no Reino Unido.

More, More, More, o álbum, saiu logo a seguir, chegando ao 47º lugar na parada pop e emplacando mais dois hits medianos, Call Me (ouça aqui) e Party Line (ouça aqui). Neles, destaque para a voz pequena e sensual de Andrea, os timbres deliciosos de teclado de Gregg e, especificamente na faixa-título, a levada de bateria de Godfrey, que deu show na mixagem e produção.

Foi nesse momento que Gregg e Godfrey abriram a sua própria empresa de produção, a Diamond Touch, na qual dividiam funções. Basicamente, o mais velho assinava as composições, fazia os arranjos de base e tocava os teclados, cabendo ao mais novo a parte técnica das gravações. More, More, More virou uma espécie de molde para o que viria a seguir.

Curiosamente, mesmo com tanto sucesso, os irmãos Diamond só participaram de uma faixa do segundo álbum de Andrea True Connection, White Witch (1977). Coincidência ou não, foi justo a música mais marcante do LP, N.Y. You Got Me Dancing (ouça aqui), que como single atingiu o nº 27 na parada pop e integrou a trilha da novela global Loco-Motivas.

Vale registrar que as outras faixas de White Witch foram produzidas por Michael Zager, outro produtor e compositor importante da era disco, que estourou com os hits Let’s All Chant e Life’s a Party, esta última a 1ª gravação de Whitney Houston, na época ainda uma adolescente. A única das músicas produzidas por ele neste álbum a estourar foi What’s Your Name What’s Your Number (de Roger Cook e Bobby Woods), nº 56 nos EUA.

Lógico que o sucesso de More More More atraiu a atenção de outros artistas para o trabalho dos irmãos Diamond. O 1º foi George McCrae, que em 1975 estourou mundialmente com Rock Your Baby, um dos primeiros hits massivos da disco music, com autoria e produção a cargo dos líderes do KC & The Sunshine Band, Harry Wayne Casey e Richard Finch.

Curiosamente intitulado Diamond Touch (1976), o álbum inclui quatro músicas de autoria de Gregg Diamond, incluindo o excelente single Love In Motion (ouça aqui). O álbum saiu pela TK Records, a mesma dos trabalhos do KC & The Sunshine Band, e não fez o sucesso que se esperava, mas rendeu um contato bacana que valeria um bom fruto não muito tempo depois.

Em 1977, foi a vez de Gloria Gaynor, a 1ª rainha da disco music graças ao estouro de Never Can Say Goodbye em 1975, valer-se dos serviços de Gregg e Godfrey. O álbum Glorious inclui quatro músicas de Gregg, entre elas a sensual Most Of All (ouça aqui). E, mais uma vez, o trabalho não teve a boa repercussão que merecia. E os Diamond devem ter parado pra pensar.

Nos LPs de George McCrae e Gloria Gaynor, Gregg e Godfrey não tiveram o controle total sobre a produção, compartilhando o trabalho com outros músicos, compositores e produtores. Ele certamente sentiram que uma chance de dar mais certo seria montar um projeto próprio no qual pudessem se incumbir de todas as etapas, desde a seleção de músicas até a mixagem.

Nascia, dessa forma, a Bionic Boogie, também conhecida como Gregg Diamond Bionic Boogie. Era uma banda de estúdio, que trazia como pilares Gregg como produtor, compositor e se desdobrando em teclados como o Yamaha Electric Grand Piano, Fender Rhodes, D-6 Clavinet, Steinway Acústico, Harpsichord e Hammond B-3, Steve Love (guitarra), Jim Gregory (baixo) e Richard Crooks (bateria).

Além desses músicos, outros eram acrescentados de acordo com as necessidades de cada álbum, assim como os vocalistas. No 1º álbum (Bionic Boogie, 1977), temos os vocais a cargo de Yolanda, Zach Sanders e a consagrada cantora e compositora Gwen Guthrie, além de Alan Schwartsburg (bateria) e Lance Quinn (guitarra).

Lançado pela gravadora Polydor, Bionic Boogie não emplacou na parada pop americana, mas cravou dois hits em outros charts. A sensacional Dance Little Dreamer (ouça aqui), com seus vocais em uníssono e levada contagiante de teclados, chegou ao 1º lugar na parada de dance music nos EUA, e ao 77º lugar no Reino Unido.

Por sua vez, Risky Changes (ouça aqui), outro petardo disco, marcou presença na parada americana de r&b, onde chegou ao posto de número 79. Melhor ainda: o disco teve alta rotação nas pistas das discotecas, especialmente da mais badalada da época, o Studio 54.

Como aquela incensada casa noturna ficava a poucos quarteirões do estúdio onde os Diamond gravavam seus discos, era um costume eles levarem versões prévias do que gravavam e pedir para os DJs as testarem nas pistas de dança, sentindo o que dava certo e o que não rolava, aperfeiçoando até chegar ao resultado desejado. E, dessa forma, se tornaram queridinhos de lá.

O bom desempenho do álbum de estreia fez com que a Polydor se entusiasmasse, e logo surgiu o seu sucessor, Hot Butterfly (1978), creditado a Gregg Diamond Bionic Boogie. A grande novidade ficou a cargo da entrada no time do vocalista e compositor Luther Vandross, que participou com destaque do álbum Young Americans (1975), de David Bowie, e dos dois primeiros álbuns do Chic, Chic (1977) e C’Est Chic (1978).

Com sua voz maravilhosa, personalizada e de timbre inconfundível, Vandross marca presença em todos os vocais de apoio e ainda assume o vocal principal em Hot Butterfly (ouça aqui), canção mezzo r&b mezzo disco de andamento midtempo que atingiu o nº 8 na parada dance dos EUA e o nº 77 na parada britânica. Essa deliciosa canção foi relida com muita categoria em 1980 por Chaka Khan, rebatizada como Papillon (ouça aqui).

Excelente, o álbum traz outro petardo, Fess Up To The Boogie (ouça aqui), uma fantástica mistura de rock ardido e disco que sempre agitava as pistas de dança no momento em que entrava em cena, com direito a belos riffs de guitarra e vocais vigorosos. Curiosidade: tem um trecho que lembra muito o de It Don’t Come Easy, de Ringo Starr (ouça aqui).

Além de Luther Vandross, marcam presença nos vocais no álbum Hot Butterfly a cantora Cissy Houston, mãe de Whitney Houston e na época estourada nas paradas disco com Think It Over (de Michael Zager, com quem ela trabalhava) e David Lasley (1947-2021- que atuou com Chic, Sister Sledge e James Taylor, entre outros). Cream (Always Rises To The Top) (ouça aqui), com levada hipnótica, chegou ao nº 61 na parada do Reino Unido.

Em função do trabalho que haviam feito anteriormente na T.K. Records, Gregg e Godfrey receberam o convite para gravar um álbum por aquela gravadora. Como eles eram contratados da Polydor como Bionic Boogie, eles aceitaram a proposta com um novo nome, embora com uma escalação de integrantes bem próxima, Nascia o Gregg Diamond’s Star Cruiser, que no final de 1978 lançaria o LP Gregg Diamond’s Star Cruiser.

As principais novidades estavam no elenco de vocalistas. Gordon Grody (que atuou com Phillys Hyman, Gene Simmons e Vicki Sue Robinson) ficou com o vocal principal de Island Boogie. Por sua vez, Diva Gray (que participou de álbuns do Chic e Change, entre outros) comandou os vocais em This Side Of Midnight. Outra presença importante é a de Jocelyn Brown, que em 1984 estouraria com o hit Somebody Else’s Guy.

Com um repertório particularmente inspirado, Gregg Diamond’s Star Cruiser teve dois hits marcantes nas pistas de dança. Starcruisin’, com belo arranjo de metais e balanço com pitada roqueira (ouça aqui), chegou ao nº 7 na parada dance e o nº 57 na parada de r&b americanas.

Por sua vez, This Side Of Midnight, com um arranjo grandioso e envolvente e o vocal sedutor de Diva Gray, pode ser considerada um dos grandes clássicos da disco music (ouça aqui).

Infelizmente, esse álbum marcou o fim da parceria dos irmãos Diamond. Em entrevista concedida em 2014 para Abby Garnett para o site redbullmusicacademy.com, Godfrey deu a seguinte declaração:

“Ele era uma pessoa muito criativa e brilhante, o meu irmão, eu o amava. Mas ele também tinha um lado muito destrutivo. Eu trabalhava quase 18 horas por dia, não aguentava mais aquilo”.

Desta forma, Godfrey resolveu sair da Diamond Touch. Ele, que em 1976 produziu o álbum Coney Island Baby, de Lou Reed, saiu da cena da dance music e trabalhou com artistas como Billy Squier e Aerosmith, até abrir o seu próprio estúdio, o Perfect Mixes Studio, na ativa há mais de 20 anos.

Sem o irmão, Gregg prosseguiu o seu contrato com a Polydor, e em meados de 1979 lançou o álbum Tiger Tiger. A parte técnica de gravar e mixar ficou a cargo do engenheiro de som John Pace, conhecido por seus trabalhos com John McLaughlin, Kenny Loggins e Anne Murray, entre outros

A grande marca fica por conta da manutenção da parceria com Luther Vandross, que se incumbiu dos arranjos vocais, backing vocals e vocal principal em três faixas muito boas, das quais ele foi também o coautor.

São elas Lay It On The Line (ouça aqui), Crazy Lady Luck (ouça aqui) e Take The Boogie Home (ouça aqui). Embora excelentes, nenhuma delas emplacou nos charts de dance music, r&b e pop.

O único semihit do álbum foi exatamente a faixa-título, Tiger Tiger (Feel Good For a While) (ouça aqui), assinada apenas por Gregg e que chegou ao 33º lugar na parada dance dos EUA. Seria o último hit do Bionic Boogie. Jocelyn Brown, Lani Groves e Janet Wright também participaram dos vocais.

Já sem Luther Vandross, Gregg Diamond lançou um último álbum, desta vez creditado só a ele, por um outro selo do conglomerado Polygram, o Mercury. Trata-se de Hardware, que chegou às lojas no finalzinho de 1979, no exato momento em que a disco music sofria com o abjeto movimento Disco Sucks, que procurou tirar a disco de cena por razões preconceituosas e infelizmente atingiu os seus objetivos.

O time de músicos neste álbum se manteve, com participações especiais luxuosas como as de David Sanborn (sax alto) e Randy Brecker (trompete). Nos vocais, Zack Saunders, Jocelyn Brown, Diva Gray e Gordon Grody, entre outros. Embora com faixas bem interessantes como 1/8th Of Your Love (ouça aqui) e War Paint (Love Line) (ouça aqui), o disco passou batido.

Com o fim da era disco, Gregg Diamond simplesmente sumiu de cena. Uma rara aparição ocorreu em 1983, e ainda assim por tabela, quando a cantora Jackie Moore (que em 1979 estourou com o hit disco This Time Baby, escrito por Bell & James) regravou com categoria Holding Back (ouça aqui), que o Bionic Boogie lançou no álbum Gregg Diamond’s Star Cruiser (1978, ouça a versão original aqui).

Lembra do início dessa matéria? Pois chegou a hora de contar a história de Steal My Sunshine, a música que trouxe Gregg Diamond de volta às paradas de sucesso, mesmo que de maneira meio torta. Tudo começou quando o músico canadense Marc Costanzo ouviu More, More, More, de Andrea True Connection, em uma festa retrô, e ficou com ela na cabeça.

Costanzo era o cantor, músico e líder da banda de rock alternativo canadense Len, que havia até então lançado dois álbuns sem grande repercussão. Valendo-se de um pequeno (porém marcante) trecho de More, More, More, no melhor estilo do rap/hip hop, ele compôs uma nova música, que interpretou em dupla com a irmã, Sharon Costanzo.

Intitulada Steal My Sunshine (ouça e veja o clipe aqui), a canção foi lançada em março de 1999, incluída na trilha sonora do filme Go (exibido no Brasil como Vamos Nessa), dirigido por Doug Liman, no 3º álbum da banda, You Can’t Stop The Bum Rush e depois também saiu no formato single.

A divulgação adicional obtida graças ao filme impulsionou a música nas paradas de sucesso, e a levou a atingir a posição de nº 9 na parada americana de singles. O álbum chegou ao 46º posto na parada pop, e Steal My Sunshine entrou no Top 40 de oito países pelo mundo afora.

O sucesso do Len, no entanto, ficou por aí, com a banda de Marc Constanzo lançando outros dois álbuns que passaram batido. Eles se tornaram o que a literatura pop definiu como one hit wonder (maravilha de um sucesso só, em tradução livre), e até hoje são lembradas por essa canção, que se tornou uma espécie de hino do verão americano daquele mesmo 1999 em que seu coautor, Gregg Diamond, nos deixou. Fina ironia…

More More More (clipe)- Andrea True Connection:

John Hartman, 71 anos, batera dos The Doobie Brothers

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Por Fabian Chacur

Tipo da história esquisita, mas vamos a ela. No último dia 20, o Rock And Roll Hall Of Fame publicou em sua página na internet uma homenagem póstuma a John Hartman, baterista original dos Doobie Brothers. Como a morte dele não havia sido noticiada, ficou no ar o clima de que poderia ter sido um fora. No dia 22, no entanto, as redes sociais da banda o homenagearam também. O mais estranho vem agora: familiares informaram que, na verdade, seu ente querido se foi há bem mais tempo, mais precisamente em 29 de dezembro de 2021.

Nascido em 18 de março de 1950, John Hartman conheceu os músicos Patrick Simmons (vocal e guitarra) e Tom Johnston (vocal e guitarra) em 1969 em shows nos bares da Califórnia. Ao sentirem boas afinidades, resolveram criar sua própria banda, inicialmente com o nome Pud e, em 1970, como The Doobie Brothers, uma brincadeira em relação ao fato de todos serem bem chegados naquela célebre erva e nos cigarros (doobies) feitos a partir dela. Nascia uma das grandes bandas do rock.

The Doobie Brothers (1971), o álbum de estreia, não fez muito sucesso, mas mostrou uma banda com muito potencial, e, nela, John Hartmann se mostrou um músico dos mais úteis, pois, além de bateria, também tocava aproximadamente outros 18 instrumentos de percussão, como congas e timbales. O disco incluía Nobody, que fez bastante sucesso no Brasil na época, embora tenha passado batida nos EUA.

Para o álbum seguinte, eles resolveram entrar em uma onda que estava tendo início naquela mesma época no rock, a de usar dois bateristas, e Michael Hossack entrou no time. Deu super certo! Toulouse Street (1972) estourou mundialmente, graças a hits certeiros como Listen To The Music e Rockin’ Down The Highway.

O álbum seguinte, The Captain And Me (1973), foi ainda melhor, emplacando hits massivos como Long Train Runnin’ e China Grove e mostrando a categoria da banda nas áreas do rock básico, folk, country, blues e hard rock. O talento de Hartman como baterista e percussionista se mostrou bastante presente e útil nessa diversidade sonora.

Hartman se manteria no time até o álbum Minute By Minute (1978), saindo de cena no início de 1979. Ele voltou aos Doobies quando o grupo, após uma parada entre 1983 e 1987, voltou à cena, para lançar dois álbuns de sucesso, Cicles (1989) e Brotherhood (1991). Em 1992, no entanto, ele decidiu sair de vez da cena musical, dedicando-se à sua fazenda e também tentando se tornar um policial, o que acabou não dando certo.

Vale informar que os Doobie Brothers, mantendo Tom Johnston e Patrick Simmons de sua formação original, continuam na ativa, e atualmente fazem uma turnê que celebra seus 50 anos de carreira,contando com a participação especial de outro nome importante de sua história, o cantor, compositor e tecladista Michael McDonald.

Long Train Runnin’– The Doobie Brothers:

Olivia Newton-John, 73 anos, estrela talentosa e simpática

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Por Fabian Chacur

O mundo está muito mais triste nesta segunda-feira (8). Foi anunciada nesta manhã a morte de Olivia Newton-John, que após três décadas lutando contra um câncer de mama infelizmente não conseguiu mais resistir. Ela estava entre seus entes queridos, no rancho em que morava no sul da Califórnia (EUA). Aos 73 anos, a cantora nos deixa um lindo legado profissional e também como ser humano. Uma pessoa doce e que sempre lutou por causas humanitárias.

A estrela pop nos visitou em março de 2016, quando fez shows elogiados. Eu estive em um deles (leia a resenha aqui), e tive a oportunidade de tirar uma foto com ela (feita pelo amigo e jornalista Sérgio Martins) e ter uma rápida conversa, durante a qual ela se mostrou extremamente gentil e atenciosa.

Nascida na Inglaterra em 26 de setembro de 1948 (mesmo dia e mês de Gal Costa e Brian Ferry, curiosamente), Olivia mudou-se com a família para a Austrália aos 5 anos de idade, onde foi criada. Ela iniciou sua carreira musical em 1965. Seu primeiro sucesso foi em 1971 com If Not For You, de Bob Dylan e também conhecida por gravação de George Harrison.

A cantora se mostrou uma especialista em quebrar barreiras, pois se tornou uma das maiores estrelas da música country nos EUA, grande façanha para uma estrangeira. Um de seus primeiros hits nesse setor foi Let Me Be There, seguido depois pelo estouro de I Honestly Love You, que chegou ao número 1. Outros hits country da moça são Please Mr. Please e Have You Ever Been Mellow, só para citar mais dois.

Em 1978, surpreendeu a todos ao aceitar viver o papel de Sandy na versão cinematográfica do musical Grease, uma ousadia, se levarmos em conta que ela já tinha 30 anos e viveria uma jovem adolescente. Mas deu super certo a sua parceria com o então ainda iniciante John Travolta, e o filme virou um grande sucesso nas bilheterias.

Mais: rendeu vários hits em sua trilha sonora, entre os quais dois duetos de Olivia e Travolta, as trepidantes Summer Nights e You’re The One That I Want, e a balada solo Hopelessy Devoted To You. O sucesso a incentivou a dar uma guinada roqueira em 1979 com o hoje clássico álbum Totally Hot, que inclui os petardos A Little More Love e Deeper Than The Night, entre outros, um grande sucesso.

Em 1980, outra surpresa das boas: estrelou o filme Xanadu ao lado de ninguém menos do que Gene Kelly, o rei dos musicais. O filme não teve bom desempenho nas bilheterias mas virou cult depois. A trilha, no entanto, que a reuniu com a Electric Light Orchestra, estourou, com hits como Xanadu (com a ELO), Magic, Whenever You’re Away From Me (com Gene Kelly) e Suddenly (dueto com o amigo Cliff Richards).

Em 1981, veio seu maior hit solo, a contagiante Physical, que ficou dez semanas no topo da parada americana e virou uma febre como tema de vídeos de ginástica. Fez mais um filme com Travolta, Two Of a Kind (1983), e também investiu em causas sociais. Em 1992, lutou contra um câncer de mama, mas não só o venceu na época como também criou uma fundação para arrecadar fundos no intuito de ajudar as vítimas dessa doença terrível.

Sempre ativa, lançou bons discos nesses anos todos, entre eles Back With a Heart (1998). Outro é o duplo ao vivo Summer Nights- Live In Vegas, gravado ao vivo em incluindo hits como Have You Ever Been Mellow, Xanadu, A Little More Love, Sam, Physical, Summer Nights e inúmeras outras, em um total de 22 faixas. E foi esse show comemorativo de seus 50 anos de carreira que a trouxe ao Brasil em 2016. Já está fazendo muita falta…

A Little More Love (clipe)- Olivia Newton-John:

Maricenne Costa é o tema de uma bela e essencial biografia

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Por Fabian Chacur

Na música Wild Life (Ritchie-Tom Zé), que gravou no seu seminal álbum Correntes Alternadas (1992), Maricenne Costa canta os versos “Não pago ingresso novo pro filme que eu já vi”. Uma belíssima definição para a atitude dessa brilhante cantora, compositora e atriz em sua vida e carreira. Essa trajetória é o tema de Maricenne Costa- A Cantora de Voz Colorida, de Elisabeth Sene-Costa e Laís Vitale de Castro, livro que será lançado em São Paulo nesta sexta (22) das 19 às 21h na Livraria da Vila- Shopping Pátio Higienópolis (avenida Higienópolis, nº 618/2009- Piso Pacaembu- fone (11) 3660-0230).

A ideia de realizar esta obra surgiu do desejo que Elisabeth tinha de homenagear a sua irmã, a quem admira profundamente. Com a parceria da jornalista Laís Vitale de Castro, impecável projeto gráfico a cargo de Wildi Celia Melhem (Celinha) e assessoria musical de Moisés Santana e Beto Previero, ela soube mergulhar nos momentos essenciais de uma carreira repleta de fatos importantes e realizações, e nos oferecer um resumo simplesmente impressionante, pelo rico material que contém.

Um dos pontos altos do livro fica por conta do vasto material que o ilustra, em termos de fotos e reprodução de matérias e documentos. Pois os fatos em torno de Maricenne são tão incríveis que algumas pessoas poderiam acreditar que seriam inventados, ou mesmo dignos de dúvidas. No entanto, a realidade é frequentemente muito mais impressionante do que a ficção.

E a vida da garota nascida na cidade de Cruzeiro (SP) é repleta de acontecimentos realmente impressionantes. Em 1958, por exemplo, ela, aos 22 anos de idade, venceu a 1ª edição do concurso A Voz de Ouro ABC, superando em torno de 3 mil concorrentes de todo o país. Foi uma espécie de precursor das atuais competições televisivas do tipo American Idol/Ídolos, e levou o nome de Maricenne para os quatro cantos do Brasil.

Outras cantoras teriam seguido caminhos mais tradicionais ou centrados nos interesses comerciais. Não Maricenne. Ela, a partir deste sucesso inicial, mostrou que não ficaria pagando ingresso novo pro filme que já havia visto, sempre em busca de novidades consistentes. Como ter sido, por exemplo, integrante do grupo de artistas que ajudou a criar e consolidar a bossa nova em São Paulo, como Cesar Camargo Mariano, Alaíde Costa e Théo de Barros.

É importante que esse livro seja lido. Vou ser mais geral na apresentação dessas vitórias da trajetória dessa personagem incrível. Entre outras coisas, foi a 1ª (em 1964!) a gravar uma música do então estudante Chico Buarque (Marcha Para Um Dia de Sol). Participou com destaque de alguns dos mais importantes festivais de música. Fez shows em Portugal e nos EUA, cantando, neste último, no badaladíssimo clube PJ’s, de Frank Sinatra.

Teve idas e vindas pelo caminho. Buscou a ampliação de seus conhecimentos, fazendo faculdade de serviço social e estudando arte dramática. Como atriz, participou de diversos projetos vanguardistas nos anos 1970. Quando voltou à música, recusou rever as glórias do passado, abrindo-se a criar shows inovadores e a revelar novos autores, sendo ela mesma uma compositora das mais elogiáveis.

Gravou pouco, é verdade, mas quem conhece essa obra vai concordar comigo: tudo o que gravou é essencial para quem gosta de música brasileira de qualidade. Teria sido fácil cantar bossa nova pra sempre em shows saudosistas, mas não se prestou a esse papel, gravando álbuns impressionantes pela sua diversidade e personalidade como Correntes Alternadas (1992) e Movimento Circular (2005), representantes de um pop nacional vibrante, ousado e absurdamente consistente.

Sempre trabalhadora e estudiosa, desenvolveu diversos projetos de shows e discos extremamente relevantes, entre os quais Como Tem Passado!!! (1999), no qual resgatou os primórdios da música gravada no Brasil com o apoio do historiador e jornalista José Ramos Tinhorão, e Bossa.SP (2010), no qual resgatou o lado bossa nova da São Paulo da Garoa.

Não, Maricenne não lotou estádios, não cantou no Rock in Rio, não participou de programas no horário nobre global, nem mesmo vendeu milhões de discos. No entanto, a consistência, a ousadia e a importância de seu trabalho musical deveriam tornar obrigatórias as visitas a essa obra por quem realmente quer conhecer o que temos de melhor por aqui. Servir como parâmetro, mesmo, para as novas gerações.

Ou quantos artistas podem se gabar de ter como admiradores João Gilberto (que apelidou a sua voz de colorida), Inocentes (que gravaram com ela em mais de uma ocasião), Judy Garland, Tony Bennett e Milton Nascimento, só para citar alguns? Maricenne reuniu em um mesmo álbum punk rock, blues, vaudeville, jazz, bossa nova, ska e valsa sem soar confusa ou sem rumo. Ela sempre soube dar consistência a essas misturas.

Se extremamente consistente em termos profissionais, ela nunca deu a si própria o devido valor, e chegou a contestar o esforço da irmã, dizendo que a sua carreira não merecia este livro. Meu Deus, quanta humildade! A carreira de Maricenne Costa não só merece este livro maravilhoso (e que venham outros!), como também um documentário, shows celebrando sua obra, mostras sobre essa trajetória, o relançamento de seus álbuns e singles etc.

Ela está aqui, entre nós. Que todos os fãs da música brasileira de qualidade possam dar a ela, nesse estágio de sua vida, o carinho, o acolhimento e, acima de tudo, o reconhecimento que ela merece. Maricenne Costa- A Cantora de Voz Colorida é leitura obrigatória e por demais prazerosa, especialmente se feita tendo como trilha sonora os discos desta ilustre cria de Cruzeiro e paulistana honorária.

MARICENNE COSTA- A CANTORA DA VOZ COLORIDA
DE Elisabeth Sene-Costa e Laís Vitale de Castro
Editora: Álbum de Família- contato: [email protected]
Preço: R$ 40,00 (edição preto e branco) e R$ 60,00 (edição colorida)
O lançamento em Cruzeiro (SP) será realizado no dia 6 de agosto (sábado) das 19 às 22h no Teatro Municipal Capitólio (rua Engenheiro Antonio Penido, nº 636- Centro- fone (12)-3144-1362

Wild Life (Tom Zé e Ritchie)- Maricenne Costa:

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